Daniel e Apocalipse
Daniel 3 — A Prova de Fogo
VERSÍCULO 1. O rei Nabucodonosor fez uma imagem de ouro que tinha sessenta côvados de altura e seis de largura; levantou-a no campo de Dura, na província da Babilônia. DAP 65.1
Há uma conjectura de que esta imagem tinha alguma ligação com o sonho do rei relatado no capítulo anterior, uma vez que foi construída somente 23 anos depois, de acordo com a cronologia encontrada na margem [da KJV]. No sonho, a cabeça era de ouro e representava o reino de Nabucodonosor. Ela foi sucedida por metais de qualidade inferior, denotando uma sucessão de reinos. Sem dúvida, Nabucodonosor ficou bem satisfeito por seu reino ter sido representado pelo ouro. Mas não era tão agradável assim saber que um dia seria sucedido por outro reino. Por isso, em vez de fazer apenas a cabeça da estátua de ouro, ele mandou erigi-la toda com esse material, a fim de expressar que o ouro da cabeça deveria se estender pela imagem inteira; ou, em outras palavras, que seu reino não daria lugar a outro reino, mas seria perpétuo. DAP 65.2
É provável que a altura aqui mencionada, 27 metros segundo as estimativas mais conservadores, não fosse a altura apenas da imagem propriamente dita, mas incluísse o pedestal também. Tampouco é provável que qualquer coisa além da estátua fosse feita de ouro maciço, se é que a estátua era assim composta. É possível que fosse revestida de placas finas, bem moldadas, a um custo muito menor, sem prejudicar a aparência exterior. DAP 65.3
VERSÍCULO 2. Então, o rei Nabucodonosor mandou ajuntar os sátrapas, os prefeitos, os governadores, os juízes, os tesoureiros, os magistrados, os conselheiros e todos os oficiais das províncias, para que viessem à consagração da imagem que o rei Nabucodonosor tinha levantado. 3. Então, se ajuntaram os sátrapas, os prefeitos, os governadores, os juízes, os tesoureiros, os magistrados, os conselheiros e todos os oficiais das províncias, para a consagração da imagem que o rei Nabucodonosor tinha levantado; e estavam em pé diante da imagem que Nabucodonosor tinha levantado. 4. Nisto, o arauto apregoava em alta voz: Ordena-se a vós outros, ó povos, nações e homens de todas as línguas: 5. no momento em que ouvirdes o som da trombeta, do pífaro, da harpa, da cítara, do saltério, da gaita de foles e de toda sorte de música, vos prostrareis e adorareis a imagem de ouro que o rei Nabucodonosor levantou. 6. Qualquer que se não prostrar e não a adorar será, no mesmo instante, lançado na fornalha de fogo ardente. 7. Portanto, quando todos os povos ouviram o som da trombeta, do pífaro, da harpa, da cítara, do saltério e de toda sorte de música, se prostraram os povos, nações e homens de todas as línguas e adoraram a imagem de ouro que o rei Nabucodonosor tinha levantado. DAP 65.4
A dedicação da imagem foi uma ocasião grandiosa. Os líderes de todo o reino foram reunidos. Quanto transtorno e gasto as pessoas têm para sustentar sistemas pagãos e idólatras de adoração! Quem dera se os seguidores da religião verdadeira se mantivessem bem distantes da postura adotada pelos adeptos da falsidade e da contrafação! A adoração era acompanhada de música, e quem não participasse foi ameaçado por uma fornalha ardente. Estes sempre são os motivos mais fortes para impulsionar as pessoas em qualquer direção: de um lado o prazer, de outro, a dor. DAP 67.1
O versículo 6 contém a primeira menção encontrada na Bíblia referente à divisão do tempo em horas: “na mesma hora” [KJV]. Provavelmente essa foi uma invenção dos caldeus. DAP 67.2
VERSÍCULO 8. Ora, no mesmo instante, se chegaram alguns homens caldeus e acusaram os judeus; 9. disseram ao rei Nabucodonosor: Ó rei, vive eternamente! 10. Tu, ó rei, baixaste um decreto pelo qual todo homem que ouvisse o som da trombeta, do pífaro, da harpa, da cítara, do saltério, da gaita de foles e de toda sorte de música se prostraria e adoraria a imagem de ouro; 11. e qualquer que não se prostrasse e não adorasse seria lançado na fornalha de fogo ardente. 12. Há uns homens judeus, que tu constituíste sobre os negócios da província da Babilônia: Sadraque, Mesaque e Abede-Nego; estes homens, ó rei, não fizeram caso de ti, a teus deuses não servem, nem adoram a imagem de ouro que levantaste. DAP 67.3
Os caldeus que acusaram os judeus provavelmente pertenciam ao grupo de filósofos chamados por esse nome, os quais ainda estavam amargando a vergonha de sua falha vexatória a respeito da interpretação do sonho do rei no capítulo 2. Estavam ansiosos para encontrar qualquer pretexto que pudesse ser usado para acusar os judeus perante o rei, fazê-los cair em desgraça ou destruí-los. Eles despertaram o preconceito do rei fazendo fortes sugestões da ingratidão da parte dos três: Tu os constituíste sobre os negócios de Babilônia, mas eles desconsideraram tua palavra. Não se sabe onde Daniel estava nessa ocasião. É bem provável que se encontrasse ausente cuidando de alguma questão do império cuja importância exigia sua presença. Mas por que Sadraque, Mesaque e Abede-Nego estavam lá, se sabiam que não adorariam a imagem? Não seria por estarem dispostos a atender às exigências do rei tanto quanto pudessem, sem comprometer seus princípios religiosos? O rei mandou que eles estivessem presentes. A esse requerimento eles podiam atender e o fizeram. O monarca ordenou que adorassem a imagem. Já isso sua religião proibia, então se recusaram a fazê-lo. DAP 67.4
VERSÍCULO 13. Então, Nabucodonosor, irado e furioso, mandou chamar Sadraque, Mesaque e Abede-Nego. E trouxeram a estes homens perante o rei. 14. Falou Nabucodonosor e lhes disse: É verdade, ó Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, que vós não servis a meus deuses, nem adorais a imagem de ouro que levantei? 15. Agora, pois, estai dispostos e, quando ouvirdes o som da trombeta, do pífaro, da cítara, da harpa, do saltério, da gaita de foles, prostrai-vos e adorai a imagem que fiz; porém, se não a adorardes, sereis, no mesmo instante, lançados na fornalha de fogo ardente. E quem é o deus que vos poderá livrar das minhas mãos? 16. Responderam Sadraque, Mesaque e Abede-Nego ao rei: Ó Nabucodonosor, quanto a isto não necessitamos de te responder. 17. Se o nosso Deus, a quem servimos, quer livrar-nos, Ele nos livrará da fornalha de fogo ardente e das tuas mãos, ó rei. 18. Se não, fica sabendo, ó rei, que não serviremos a teus deuses, nem adoraremos a imagem de ouro que levantaste. DAP 67.5
A tolerância do rei é demonstrada ao conceder outra chance a Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, depois de terem falhado pela primeira vez em cumprir as ordens. Sem dúvida, a questão fora totalmente compreendida. Eles não podiam alegar ignorância. Sabiam exatamente o que o rei queria e a falha em atender consistira em uma recusa intencional e deliberada em lhe obedecer. Para a maioria dos reis, isso já seria o suficiente para selar o destino dos três. Mas não, disse Nabucodonosor, deixarei passar essa ofensa se, na segunda tentativa, eles cumprirem a lei. Mas os hebreus informaram que ele não precisava se dar ao trabalho de repetir o feito. Disseram: “Quanto a isto não necessitamos de te responder”. Ou seja, não é necessário nos conceder o favor de outra chance; nossa mente está decidida. Só poderemos responder agora da mesma maneira que em qualquer momento futuro, e nossa resposta é: “Não serviremos a teus deuses, nem adoraremos a imagem de ouro que levantaste”. Nosso Deus é capaz de nos livrar, se quiser; caso contrário, nossa resolução é a mesma. Conhecemos a vontade Dele e a ela prestamos obediência incondicional. A resposta dos jovens foi tanto honesta quanto decisiva. DAP 68.1
VERSÍCULO 19. Então, Nabucodonosor se encheu de fúria e, transtornado o aspecto do seu rosto contra Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, ordenou que se acendesse a fornalha sete vezes mais do que se costumava. 20. Ordenou aos homens mais poderosos que estavam no seu exército que atassem a Sadraque, Mesaque e Abede-Nego e os lançassem na fornalha de fogo ardente. 21. Então, estes homens foram atados com os seus mantos, suas túnicas e chapéus e suas outras roupas e foram lançados na fornalha sobremaneira acesa. 22. Porque a palavra do rei era urgente e a fornalha estava sobremaneira acesa, as chamas do fogo mataram os homens que lançaram de cima para dentro a Sadraque, Mesaque e Abede-Nego. 23. Estes três homens, Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, caíram atados dentro da fornalha sobremaneira acesa. 24. Então, o rei Nabucodonosor se espantou, e se levantou depressa, e disse aos seus conselheiros: Não lançamos nós três homens atados dentro do fogo? Responderam ao rei: É verdade, ó rei. 25. Tornou ele e disse: Eu, porém, vejo quatro homens soltos, que andam passeando dentro do fogo, sem nenhum dano; e o aspecto do quarto é semelhante a um filho dos deuses. DAP 68.2
Nabucodonosor não estava totalmente livre dos defeitos e das loucuras que tão facilmente acometem os monarcas absolutistas. Inebriado pelo poder ilimitado, não conseguia suportar desobediência ou contradição. Caso percebesse resistência expressa a sua autoridade, por mais que houvesse bons motivos para isso, demonstrava a fraqueza comum à humanidade em condições semelhantes e se deixava dominar pelas paixões. Sendo governante do mundo inteiro, ainda não era páreo para a tarefa muito mais difícil de dominar o próprio espírito. Até mesmo sua feição se modificou. Em lugar do monarca calmo, digno e contido que devia aparentar, ele traiu a si próprio em aparência e ações, agindo como escravo de emoções desgovernadas. DAP 68.3
A fornalha foi aquecida sete vezes mais do que de costume, ou seja, até sua capacidade máxima. O rei se excedeu nisso, pois mesmo que o fogo houvesse provocado seu efeito costumeiro sobre os homens lançados na fornalha, ele só os teria destruído mais rápido. O rei nada ganharia com isso. Mas, levando em conta que eles foram libertos, a causa de Deus e Sua verdade muito ganharam com isso. Pois, quanto mais intenso o calor, maior e mais impressionante o milagre de ser livrado do fogo. Todas as circunstâncias foram calculadas para mostrar o poder direto de Deus. Eles foram jogados com todas as roupas, mas saíram sem nem mesmo cheiro de fumaça. Os homens mais poderosos do exército foram escolhidos para lançá-los na fornalha. A esses o fogo executou quando entraram em contato com suas chamas; ao passo que não provocou efeito nenhum sobre os hebreus, muito embora tenham sido lançados em seu meio. Ficou claro que o fogo estava sob o controle de alguma inteligência sobrenatural, pois, embora tenha agido sobre as cordas nas quais foram atados, a fim de lhes dar liberdade para andar no meio do fogo, nem sequer chamuscou suas vestes. Eles não saíram correndo do fogo assim que se viram livres, pois fora o rei que os colocara ali dentro e era papel dele chamá-los para fora. Além disso, havia mais alguém entre eles, cuja presença era fonte de contentamento e alegria tanto dentro da fornalha ardente quanto em meio às delícias e aos luxos do palácio. Que todos nós, em meio a provações, aflições, perseguições e dificuldades, tenhamos o aspecto de um “quarto” conosco, e isso basta! DAP 70.1
O rei disse: “E o aspecto do quarto é semelhante ao Filho de Deus” (Daniel 3:25, ACF). Alguns supõem que estas palavras se referem a Cristo, mas não é provável que o rei tivesse qualquer ideia de quem era o Salvador. De acordo com autoridades confiáveis, uma tradução melhor seria “semelhante a um filho dos deuses” (ARA), ou seja, tinha a aparência de um ser divino ou sobrenatural. Depois Nabucodonosor o chama de anjo. DAP 70.2
Que repreensão severa ao rei por sua insensatez e loucura foi o livramento desses três ilustres da fornalha ardente! Um poder mais elevado que qualquer autoridade terrena defendera aqueles que se posicionaram firmemente contra a idolatria, demonstrando seu desprezo pela adoração e pelas exigências do rei. Nenhum deus pagão jamais operou tamanho livramento, nem seria capaz de fazê-lo. DAP 70.3
VERSÍCULO 26. Então, se chegou Nabucodonosor à porta da fornalha sobremaneira acesa, falou e disse: Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, servos do Deus Altíssimo, saí e vinde! Então, Sadraque, Mesaque e Abede-Nego saíram do meio do fogo. 27. Ajuntaram-se os sátrapas, os prefeitos, os governadores e conselheiros do rei e viram que o fogo não teve poder algum sobre os corpos destes homens; nem foram chamuscados os cabelos da sua cabeça, nem os seus mantos se mudaram, nem cheiro de fogo passara sobre eles. 28. Falou Nabucodonosor e disse: Bendito seja o Deus de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, que enviou o Seu anjo e livrou os Seus servos, que confiaram Nele, pois não quiseram cumprir a palavra do rei, preferindo entregar o seu corpo, a servirem e adorarem a qualquer outro deus, senão ao seu Deus. 29. Portanto, faço um decreto pelo qual todo povo, nação e língua que disser blasfêmia contra o Deus de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego seja despedaçado, e as suas casas sejam feitas em monturo; porque não há outro deus que possa livrar como este. 30. Então, o rei fez prosperar a Sadraque, Mesaque e Abede-Nego na província da Babilônia. DAP 70.4
Quando chamados, os três saíram da fornalha. Então os príncipes, governadores e conselheiros do rei que aconselharam, ou pelo menos concordaram que os hebreus fossem jogados na fornalha (pois o rei lhes disse, no versículo 24: “Não lançamos nós três homens atados dentro do fogo?”) foram reunidos para ver aqueles homens e terem provas visuais e tangíveis de sua preservação maravilhosa. Perdeu-se de vista a adoração da grande imagem. Todo o interesse daquela vasta assembleia se concentrou agora naqueles três homens ilustres. Todos os pensamentos e todas as mentes ficaram repletos desse acontecimento miraculoso. E como o conhecimento do fato se espalharia por todo o império, quando cada um voltasse para a respectiva província! Que exemplo notável de uma ocasião em que Deus transformou a ira dos homens em motivo de louvor a Seu nome! DAP 71.1
Então o rei bendisse o Deus de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, e promulgou o decreto de que ninguém poderia falar contra Ele. Sem dúvida, os caldeus vinham fazendo isso. Naquela época, cada nação tinha o próprio deus ou deuses, pois havia “muitos deuses e muitos senhores” (1 Crônicas 8:5). E a vitória de uma nação sobre a outra supostamente ocorria porque os deuses do povo conquistado não haviam sido capazes de livrá-lo dos dominadores. Os judeus haviam sido totalmente subjugados pelos babilônios. Por esse motivo, com certeza os últimos haviam proferido afrontas ou palavras de desprezo ao Deus dos judeus. É isso que o rei agora proíbe, pois chegou à clara compreensão de que seu sucesso sobre os judeus havia ocorrido por causa dos pecados destes, não por qualquer falta de poder da parte do Deus a quem adoravam. Com isso, ele colocou o Deus dos hebreus em posição exaltada e de destaque em comparação com os deuses das outras nações! Foi um reconhecimento de que Ele considerava os seres humanos responsáveis diante de um padrão elevado de caráter moral e não era indiferente às ações das pessoas a esse respeito, uma vez que visitava com castigo aqueles que o transgrediam e, consequentemente, derramava bênçãos sobre quem o cumpria. Caso esses judeus servissem às circunstâncias, o nome do Deus verdadeiro não teria sido tão exaltado em Babilônia. Que honra o Senhor concede àqueles que permanecem firmes ao Seu lado! DAP 71.2
O rei os fez prosperar, ou seja, os encaminhou de volta aos cargos que ocupavam antes de serem acusados de desobediência e traição. Ao fim do versículo 30, a Septuaginta acrescenta: “E os promoveu para serem governadores sobre todos os judeus que havia em seu reino”. Não é provável que ele tenha voltado a insistir na adoração de sua imagem. DAP 71.3