Filhas de Deus

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O contexto das cartas

Qualquer pessoa que tenha lidado com vítimas de derrame pode identificar-se com Ellen White quando ela escreveu: “Não perdi o amor por meu esposo, mas não consigo explicar as coisas”. — Carta 67, 1876. Uma semana antes, ela escrevera: “Não posso deixar de ter apreensão quanto ao perigo do humor instável de Tiago”. — Carta 64, 1876. Para a esposa e os associados, foi muito difícil entender a mudança de personalidade revelada por Tiago White nos anos após 1865, durante os quais sofreu vários derrames. FD 213.2

Antes da enfermidade, Tiago White era um líder dinâmico e vigoroso. Após seus derrames, porém, experimentou graves mudanças de personalidade. De tempos em tempos, parecia voltar à sua antiga maneira de ser, porém, com freqüência, se mostrava desconfiado e exigente. Era essa a situação que Ellen White enfrentava na época em que escreveu as quatro cartas para Lucinda. FD 213.3

Sem fazer rodeios, Tiago White se expressava com frequência de modo veemente. Em sua autobiografia, escreveu o seguinte acerca de um homem que o criticara: FD 213.4

“Ver um homem tosco, empedernido, possuindo em sua natureza uma ternura pouco maior que a de um crocodilo, e destituído de formação moral e religiosa quase tanto quanto uma hiena, derramando lágrimas hipócritas para impressionar, é suficiente para provocar diversão ao mais circunspecto santo”. — LI, 115, 116. FD 213.5

A força da personalidade de Tiago White foi um patrimônio de valor incalculável durante os anos de formação da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Com as visões de sua esposa a desafiá-lo constantemente, o pastor White deu início às publicações, erigiu instituições, promoveu a organização da igreja e alimentou espiritualmente o rebanho. Além disso, atuou por dez anos como presidente da Associação Geral. (A história de sua vida é contada por Virgil Robinson, numa biografia intitulada James White, publicada pela editora Review and Herald, em 1976.) FD 213.6

Mas, quando essa forte personalidade, alterada por uma série de derrames, voltou-se contra a família e associados — incluindo a esposa — Ellen viu sua força e paciência distendidas quase ao limite. Uma pessoa que leia apenas estas quatro cartas obterá, certamente, um quadro distorcido do relacionamento entre Tiago e Ellen White. Deve-se conservar em mente o tipo de declaração como a que segue, escrita por Tiago acerca de Ellen: FD 214.1

“O casamento marca uma importante etapa na vida dos homens. ‘O que acha uma esposa acha o bem e alcançou a benevolência do Senhor’. Provérbios 18:22. [...] Casamo-nos no dia 30 de Agosto de 1846 e, daquela hora até o presente, ela tem sido meu diadema de júbilo”. — Lar sem Sombras, 125, 126. FD 214.2

Mesmo na enfermidade, Tiago percebeu que, por vezes, seus atos não estavam em harmonia com suas boas intenções. Em 1879, escreveu aos filhos: FD 214.3

“Desejo agora chamar-lhes a atenção para um assunto de grave importância. Provavelmente, queridos filhos, posso ter errado em algumas coisas cortantes que escrevi, relativas aos erros de cabeças mais jovens. É da minha natureza revidar quando pressionado além da medida. Bem que gostaria de ser um homem melhor”. — Tiago White para Willie e Mary, 27 de Fevereiro de 1879. FD 214.4

Não sabemos tudo o que aconteceu após ter sido escrita a quarta carta, mas, em menos de dez dias, Ellen estava ao lado do esposo na reunião campal de Kansas. FD 214.5

No dia 16 de maio, o mesmo dia em que foi escrita a terceira das quatro cartas para Lucinda, Ellen escreveu para o esposo: FD 214.6

“Aflige-me o fato de eu ter dito ou escrito algo que o afligisse. Perdoe-me, e serei cautelosa para não abordar qualquer assunto que o incomode ou angustie”. — Carta 27, 1876. FD 214.7

Tiago, desafortunadamente, nunca se recuperou por completo de sua enfermidade. Tinha alguns dias bons, mas esses eram entremeados com períodos de depressão. Um comentário, feito pelo presidente da Associação Geral, dois anos após a morte de Tiago White, indica a interpretação compreensiva que seus colegas próximos davam aos seus atos induzidos pela doença: FD 214.8

“Nosso querido Irmão White achava que éramos seus inimigos porque não víamos as coisas como ele. Nunca lancei qualquer acusação contra esse homem de Deus, esse nobre pioneiro que tão arduamente trabalhou por esta causa. Atribuo tudo à sua doença e enfermidade” G. I. Butler para J. N. Andrews, 25 de Maio de 1883. FD 214.9

Essa visão geral das circunstâncias nas quais Ellen White escreveu as quatro cartas para Lucinda Hall (10 a 17 de Maio de 1876) é breve, mas cremos que apresenta uma perspectiva necessária para os leitores que examinam as únicas cartas que Ellen White solicitou que fossem queimadas. FD 215.1

Patrimônio Literário de Ellen G. White, 6 de Agosto de 1987

Querida Irmã Lucinda:

Recebemos sua carta ontem à noite. Também recebemos uma de Tiago. Lucinda, não tenho planos, agora, de trocar uma certeza por uma incerteza. Posso escrever mais, e estou livre. Se eu tiver de ir para o Leste, a felicidade de Tiago pode repentinamente transformar-se em queixas e irritação. Estou completamente desgostosa com esse estado de coisas, e não pretendo me colocar onde houver o menor risco de que ocorra. Quanto mais penso no assunto, mais resolvida e determinada me sinto, a menos que Deus me dê luz, de permanecer onde estou. Posso nunca ter uma oportunidade como esta com que Deus me favoreceu no momento. Devo trabalhar conforme Deus dirige. Rogo e suplico por luz. Se for meu dever assistir às reuniões campais, saberei. FD 215.2

Mary agora está segura. Posso perdê-la se eu for para o Leste. Satanás tem-me impedido por longos anos de escrever, e agora não me posso desviar disso. Não posso deixar de ter apreensão quanto ao perigo do humor instável de Tiago, seus fortes sentimentos, suas censuras, sua maneira de me ver à luz de suas idéias, falando-me francamente de estar eu sendo conduzida por um espírito errado, dizendo que lhe restrinjo a liberdade, etc. Não é fácil passar por cima de tudo isso e colocar-me voluntariamente na posição em que ele seja um estorvo no meu caminho e eu no dele. FD 215.3

Não, Lucinda, não participarei de reuniões campais nesta temporada. Deus, em Sua providência, tem-nos dado a cada um nosso trabalho, e o faremos separadamente, independentemente. Ele está feliz, eu estou feliz; mas a felicidade pode transformar-se totalmente caso nos encontremos, receio eu. Valorizo seu discernimento, mas devo ser deixada livre para fazer o meu trabalho. Não suporto o pensamento de prejudicar a obra e a causa de Deus com tal depressão como a que tenho experimentado, de maneira totalmente desnecessária. Meu trabalho está em Oakland. Não me moverei um passo na direção leste a menos que o Senhor diga: “Vai”. Então, sem murmurar, irei alegremente; não antes. FD 215.4

Grande parte da utilidade da minha vida se perdeu. Se Tiago se houvesse retratado, seria diferente. Ele disse que não devemos procurar controlar um ao outro. Não reconheço tê-lo feito, mas ele sim, e muito mais. Nunca me senti como agora, acerca desse assunto. Não posso ter confiança no discernimento de Tiago com referência ao meu dever. Ele parece querer mandar em mim como se eu fosse criança — diz que não devo vir para cá, que devo ir para o Leste, por receio quanto à influência da irmã Willis ou por medo de que eu vá para Petaluma, etc. Espero que Deus não me haja deixado a receber minhas incumbências através do meu marido. Ele me ensinará, se eu nEle confiar. FD 215.5

Estou alegre e feliz. Meus nervos estão se acalmando. Meu sono é tranqüilo. Minha saúde é boa. Espero não ter escrito nada errado, mas são estes os meus sentimentos, e ninguém sabe, a não ser você, alguma coisa sobre isso. Que o Senhor me ajude a agir e sentir corretamente. Se as coisas fossem diferentes, eu sentiria ser meu dever ir às reuniões campais. Assim como estão, não tenho o dever. Deus me abençoa no meu trabalho. Se eu receber luz num sonho ou de outra maneira, seguirei alegremente a luz. Deus vive e reina. Responderei ao Seu chamado e buscarei fazer Sua vontade. Afetuosamente. — Carta 64, 1876, 10 de Maio de 1876. FD 216.1

Querida Irmã Lucinda:

Gostaria que você me mandasse algumas notícias. Escreva com freqüência. FD 216.2

Decidi permanecer aqui e não assistir a nenhuma das reuniões campais. Não me atrevo a ir para o Leste sem a garantia de que Deus gostaria que eu fosse. Sinto-me perfeitamente disposta a ir, se a luz brilhar nessa direção. Mas o Senhor sabe o que é melhor para mim, para Tiago e para a causa de Deus. Meu esposo está feliz agora — bendita notícia. Se ele tão-somente continuar feliz, eu estaria disposta a permanecer longe dele. Se a minha presença é prejudicial à sua felicidade, Deus me impeça de estar ligada a ele. Farei meu trabalho conforme Deus me conduzir. Ele pode fazer o seu trabalho conforme Deus o conduzir. Não nos colocaremos no caminho um do outro. Meu coração está firme, confiante em Deus. Esperarei que Deus abra o caminho diante de mim. FD 216.3

Creio que meu esposo não deseja realmente a minha companhia. Ele se alegraria se eu estivesse presente às reuniões campais, mas tem algumas idéias a meu respeito, como já as expressou livremente, de que não me sinto feliz na sua companhia, e nunca poderei, enquanto ele não encarar a questão de modo inteiramente diferente. Ele põe a culpa de boa parte de sua infelicidade sobre mim, quando ele mesmo a produziu por sua falta de autocontrole. Essas coisas existem, e não posso viver em harmonia com ele até que ele veja as coisas de maneira diferente. Não posso ser e não serei uma entrevada como tenho sido. — Carta 65, 1876, 12 de Maio de 1876. FD 216.4

Querida Lucinda:

Uma carta que recebi do meu esposo ontem à noite mostra que ele está preparado para mandar em mim e assumir posições mais exasperantes do que nunca. Decidi não assistir a nenhuma reunião campal nesta temporada. Ficarei aqui e escreverei. Meu esposo pode trabalhar melhor sozinho. Tenho certeza de que eu posso. FD 216.5

Ele escreve [que] Walling quer que eu leve as crianças para a planície, a fim de assistirem ao Centenário. Mas elas atravessaram a planície pela última vez, pagando cinqüenta dólares. Se ele as quer, pode vir buscá-las. Eu poderia enviá-las com o irmão Jones, mas seria para não tê-las mais sob meus cuidados. Tenho muita preocupação em preparar essas crianças para uma viagem que seja. Tiago não expressou sua idéia quanto à questão. Ele desaprova os esboços em Signs. Deveria parar exatamente aqui. Ele só menciona uma coisa, a inclusão do nome de [Israel] Dammon. Acho que ele ficaria satisfeito se me pudesse controlar por completo, alma e corpo, mas isso ele não pode. Às vezes, acho que ele não é realmente um homem equilibrado, mas não sei. Que Deus me mostre, conduza e guie. A última carta dele me fez decidir categoricamente permanecer deste lado das montanhas. FD 217.1

Nas cartas para mim, ele tem escrito asperamente a respeito de Edson, e depois diz que não escreveu para me desafiar. Não queria que eu fizesse qualquer referência a Edson. Eu escrevi assim — dou-lhe as palavras, pois ele devolveu a carta: “Se estiver feliz, por favor mostre-se agradecido e não agite questões desagradáveis sobre as quais se sente impelido a me escrever, e nem faça referência a elas. Por favor, tome os mesmos cuidados a seu respeito. Quando desejar fazer essas declarações com referência ao seu próprio filho, por favor deponha a pena e pare exatamente aí. Creio que Deus ficaria mais satisfeito, e isso não causaria dano à sua alma. Deixe-me ser guiada pelo Senhor com referência a Edson, pois ainda creio na Sua mão guiadora e tenho confiança em que Ele me conduzirá. A mesma mão guiadora é a minha confiança.” FD 217.2

Ele se sente impelido a me alertar quanto ao perigo de eu ser iludida por Edson e enganada por ele. Ele acha que deve me escrever acerca do meu risco de ser enganada pela irmã Willis, com respeito a ser chamada para Petaluma, etc. Espero [que] por ocasião da partida do meu esposo, ele não tenha levado a Deus consigo e nos deixado a andar à luz de nossos próprios olhos e com a sabedoria de nosso coração. FD 217.3

Em sua última [carta] ele repete [que] não deseja que eu faça qualquer referência ao que ele escreve, até “ver as coisas de modo diferente. E tenha certeza disto, de que nenhuma dessas coisas me faz perder um fio de cabelo. Ficarei feliz por encontrar você e Mary na reunião campal de Kansas, desde que, exceto por uma revelação direta de Deus, me coloque no mesmo nível que você ocupa. Alegremente trabalharei com você, mas, embora encarregado da supervisão do trabalho todo, acho errado ser o segundo nas opiniões particulares de qualquer um. Neste momento, posso ser dobrado pela vontade da infalibilidade alheia. Não mais entrarei em controvérsias com minha querida esposa. Ela pode chamar isto de uma ironia e agir a seu modo. Se ela não gosta da minha posição com referência a Edson ou a outras questões, faria o favor de [manter] sua opinião para si mesma e deixar que eu tenha a minha? Suas observações me provocaram. E agora, que não suporta que eu fale com igual franqueza, basta. FD 217.4

“Quanto à sua vinda para Kansas, não me sinto nem um pouco ansioso. A julgar pelo que concluo dessa última página, acho que podemos trabalhar melhor separados do que juntos, até que você abandone seus contínuos esforços em me condenar. Quando tiver uma mensagem do Senhor para mim, espero estar onde eu estremeça diante de Sua palavra. Mas, fora isso, deve permitir que eu seja igual a você, ou então é melhor trabalharmos sozinhos. FD 218.1

“Não continue ansiosa quanto ao fato de eu me deter em questões desagradáveis. Tenho-as no coração. Enquanto eu permanecer no palco da ação, usarei a velha e boa cabeça que Deus me deu, até que Ele revele que estou errado. Sua cabeça não se encaixa nos meus ombros. Conserve-a no devido lugar, e eu procurarei honrar a Deus usando a minha. Ficarei contente com suas notícias, mas não perca seu precioso tempo e forças repreendendo-me em questão de meras opiniões.” FD 218.2

E há mais coisas do mesmo tipo. FD 218.3

Bem, Lucinda, minha direção está clara. Não cruzarei a planície neste verão. Ficaria feliz por dar meu testemunho nas reuniões, mas isso não aconteceria sem resultados piores. FD 218.4

Por que você não me escreve algo com referência a essas coisas? Por que permanece tão calada? Como está a saúde de Tiago? Tive um sonho que me perturbou, em relação com Tiago. FD 218.5

O que pensa a respeito das crianças? Apressadamente. — Carta 66, 1876, 16 de Maio de 1876. FD 218.6

[As seguintes frases estão escritas na margem da primeira página da carta.] “May não gosta desse arranjo de Walling, de mandar a família para o Centenário. Ela não quer ver Walling, e se opõe a ir para o Leste. Eu não irei para o Leste. Estou decidida. Não recebi luz quanto a ir para algum lugar. EGW.” FD 218.7

Querida irmã Lucinda:

Lamento ter escrito essas cartas. Fossem quais fossem os meus sentimentos, eu não precisaria haver incomodado você com elas. Queime todas as minhas cartas, e não mais lhe relatarei questões que me deixam perplexa. O Portador [de pecados] é o meu refúgio. Ele me convida a ir a Ele para repousar quando estou cansada e sobrecarregada. Não serei culpada de proferir uma palavra novamente, sejam quais forem as circunstâncias. O silêncio, em todas as coisas de natureza desagradável ou desconcertante, tem sido sempre uma bênção para mim. Quando me afasto desse procedimento, tenho que lamentar muito. FD 218.8

Quando você partiu, sabia que não havia ninguém com quem eu pudesse conversar, por mais aflita que me sentisse; mas isso não é desculpa. Escrevi para Tiago uma carta de confissão. Você pode ler todas as cartas que vêm de Oakland para ele, e depois enviá-las [para ele] onde estiver. Não sei aos cuidados de quem mandar cartas para Kansas. FD 219.1

Ontem à noite, recebi uma carta de Tiago expressando um tom muito [diferente] de sentimentos. Mas não me atrevo a atravessar a planície. É melhor para nós dois estarmos separados. Não perdi o amor por meu esposo, mas não consigo explicar as coisas. Não assistirei a nenhuma das reuniões campais do Leste. Permanecerei na Califórnia, para escrever. FD 219.2

As últimas cartas fizeram com que me decidisse plenamente. Considero-as a luz que pedi. Eu teria ido à reunião de Kansas, mas me senti impedida de partir. Está certo. O Senhor sabe o que é melhor para todos nós. FD 219.3

Não tenho certeza de que era seu dever ir para o Leste, quando foi. Se você tivesse permanecido, eu poderia ter realizado muito mais. Compreendo, porém, todas as circunstâncias, e não tenho uma palavra de censura para lançar sobre você ou meu esposo ou qualquer outra pessoa. FD 219.4

Tenho escrito, freqüentemente, vinte páginas por dia. Deixei de lado Sketches of Life. Mandamos mais duas provas [do testemunho]. Uma prova mais o completará. Mary Clough continua a mesma; ela trabalha com interesse e disposição. Shew se mostra cada vez mais um precioso auxiliar; não sei como manteríamos a casa sem ele. Ele faz pão, excelentes tortas, pãezinhos doces, e cozinha legumes. Tudo o que lhe estão pagando até agora são dois dólares por semana, e nas duas últimas semanas, dois e meio. Pagarão três dentro de mais duas semanas. Mary [o está ensinando] a cozinhar. Ele é caprichoso; toma conta da casa toda. FD 219.5

Onde está Frankie Patten? Ela virá ou não? Por que você não diz algo sobre essas coisas? FD 219.6

Carinho para todos. — Carta 67, 1876, 17 de Maio de 1876. FD 219.7

De Oakland, Califórnia, Ellen escreveu o seguinte para “Querido Esposo”, no dia 16 de Maio de 1876, mesmo dia em que foi escrita a terceira carta para Lucinda Hall. FD 219.8

Aflige-me o fato de eu ter dito ou escrito algo que o afligisse. Perdoe-me, e serei cautelosa para não abordar qualquer assunto que o incomode ou angustie. Estamos vivendo num tempo muitíssimo solene e não podemos ter diferenças que separem nossos sentimentos, em nossa idade avançada [Ellen tinha 48, e seu marido 54 anos de idade, quando esta carta foi escrita]. Posso não ver todas as coisas como você as vê, mas não creio que seria minha função ou dever tentar fazer com que você veja como vejo e sinta como sinto. Se eu tiver feito isso, desculpe-me. FD 219.9

Desejo um coração humilde, um espírito manso e quieto. Se em alguma ocasião permiti que meus sentimentos se exaltassem, foi um erro. Jesus disse: “Aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma”. Mateus 11:29. FD 220.1

Desejo que o eu se oculte em Jesus. Desejo que o eu seja crucificado. Não reivindico infalibilidade ou mesmo perfeição do caráter cristão. Não estou isenta de erros e equívocos na minha vida. Tivesse eu seguido meu Salvador mais de perto, não teria que lamentar tanto a minha dessemelhança com Sua preciosa imagem. FD 220.2

O tempo é breve, muito breve. A vida é incerta. Não sabemos quando se encerrará nosso tempo de graça. Se andarmos humildemente diante de Deus, Ele nos permitirá encerrar nossos labores com júbilo. Não mais traçarei uma linha ou expressão numa carta para afligir você. Mais uma vez repito, perdoe-me por toda palavra ou ato que lhe magoou. FD 220.3

Tenho fervorosamente orado por luz com referência a ir para o Leste, e agora decidi que meu trabalho é aqui, para escrever e fazer as coisas que o Espírito de Deus ditar. Busco sinceramente a vida superior. Mary e eu estamos trabalhando tanto quanto podemos. Deus, em Sua providência, deu-me o meu trabalho. Não ouso deixá-lo. Oraremos para que Deus o sustenha, mas não vejo luz para mim no Leste. — Manuscript Releases 20:23. FD 220.4

Alguns dias mais tarde, Ellen aparentemente mudou de idéia e se uniu ao seu esposo para a série de reuniões campais do verão de 1876. Cumpriram compromissos em 14 reuniões campais, trabalhando em perfeita harmonia. Retornando a Battle Creek, cumpriram os prazos de publicação do Spirit of Prophecy, v. 2. E voltaram juntos para a Califórnia, onde reassumiram o trabalho. FD 220.5

Tiago White recupera-se de outro derrame — Nossa reunião campal terminou. Estamos todos em casa novamente. Papai enfrentou a reunião campal tão bem quanto se poderia esperar. Ele se recupera muito lentamente — não come o suficiente para manter as forças. Realizamos preciosas reuniões de oração em seu favor e nossa fé está sendo testada, mas não desanimamos. FD 220.6

Estou satisfeita porque ele teve um ataque de paralisia. Está muito quieto, nada exigente, mas paciente, terno e bondoso. O atendimento recai principalmente sobre mim. Ele parece sentir que, se estou ao seu lado, ele se tranqüiliza. Mas nossa fé reclama as promessas de Deus por seu completo restabelecimento. Cremos que assim será. Deus tem uma grande obra para ele e para mim. Teremos forças para executá-la. FD 220.7

Deus tem-me ajudado a carregar meu duplo fardo, nas cinco reuniões campais a que assisti. Sinto-me com a maior coragem. Tenho trabalhado excessivamente e Deus me ajuda. Pretendo agora terminar meu livro e depois deixar de escrever por um pouco. — Manuscript Releases 10:36, 37. FD 220.8

Tiago White volta a ser ele mesmo — Falei com grande espontaneidade por uma hora. Todos estavam profundamente atentos. Mas a melhor parte da questão foi que Papai foi à plataforma, cantou e orou como ele mesmo. Isso é obra de Deus, e Seu nome receberá toda a glória. — Manuscript Releases 10:36. FD 221.1

Algumas semanas após a morte de Tiago White — Sinto cada vez mais a falta de Papai. Sinto especialmente a sua perda aqui, nas montanhas. Acho uma coisa muito diferente estar nas montanhas com meu esposo e nas montanhas sem ele. Tenho plena convicção de que minha vida estava tão entrelaçada e entretecida com a de meu esposo, que é praticamente impossível que ela signifique alguma grande coisa sem ele. — Carta 17, 1881. FD 221.2

Anos após a morte de Tiago White — Então meu marido, o fiel servo de Jesus Cristo, que por trinta e seis anos estivera ao meu lado, foi-me arrebatado, e fui deixada a labutar sozinha. Ele dorme em Jesus. Não tenho lágrimas para derramar sobre o seu túmulo. Quanto, porém, lhe sinto a falta! Como almejo suas palavras de conselho e sabedoria! Como desejaria ouvir suas orações unidas às minhas, pedindo luz e guia, sabedoria para saber como planejar e dirigir a obra! — Mensagens Escolhidas 2:259. FD 221.3

Meu esposo faleceu em 1881. Desde então, tenho realizado mais trabalho do que em toda a minha vida anterior, assumindo responsabilidades, escrevendo e publicando livros. Quando meu esposo estava à morte, prometi-lhe que, com o auxílio dos meus dois filhos, levaria avante a obra que ele e eu realizávamos unidos, se o Senhor Se agradasse em me dar forças. Não tenho considerado a minha comodidade. Tenho-me recusado a falhar ou ficar desanimada. Não me foi contado com palavras que verei meu esposo na Cidade de Deus. Espero não necessitar da evidência de palavras para ter essa certeza. Tenho a evidência da Palavra de Deus de que meu esposo amou a verdade e guardou a fé. E tenho a certeza de que, se eu prosseguir confiante e fielmente, fazendo a vontade de Deus como fiel mensageira, meu esposo e eu nos reuniremos no reino de Deus. Não tenho uma partícula de dúvida quanto ao preparo do meu esposo ao depor a armadura. FD 221.4

O ano [seguinte] ao do falecimento do meu esposo foi o mais penoso que já vivi. Todavia, desde que o poder doador de vida veio sobre mim na grande tenda na reunião campal de Healdsurg, tenho sentido, de modo especial, que o Senhor me poupou a vida a fim de que levasse uma mensagem definida, e que os anjos de Deus estão ao meu lado. Não fosse a evidência de que o Senhor é o meu auxiliador, não poderia trabalhar como trabalho. Enquanto Ele me poupar a vida, desempenharei fielmente o meu dever. Não estou fazendo a minha obra, mas a obra do Senhor. FD 221.5

Agora, minha irmã, temos o direito de tomar o Senhor por Sua palavra. Jamais pedi que Deus me revelasse se serei salva, ou se meu esposo se salvará. Creio que, se viver em obediência aos mandamentos de Deus, e não desanimar, porém andar na luz como Cristo está na luz, encontrarei por fim meu Salvador e Lhe verei a face. Para isso me esforço. Não confiarei no homem ou farei da carne a minha arma. Tenho a promessa de que, se for fiel em levar as mensagens que Deus me dá, receberei a coroa da vida. Receber essa coroa depende de eu crer na mensagem da verdade e receber pela fé a promessa de Deus, de que terei Sua graça para sustentar-me ao desempenhar os deveres que requer de mim. Se me desincumbir fielmente do meu dever, aquilo que os outros escolherem fazer não será lançado na minha conta por não tê-los advertido. — Carta 82, 1906.* FD 222.1