O Sábado e o Domingo nos Primeiros Três Séculos: o Testemunho Completo dos Pais da Igreja
Capítulo 7
Testemunho de Tertuliano, 200 d.C.
Esse escritor se contradiz da forma mais extraordinária com relação ao sábado e à lei de Deus. Ele afirma que o sábado foi abolido por Cristo, e em outro lugar declara enfaticamente que Ele não o aboliu. Ele diz que Josué violou o sábado, e depois declara expressamente que ele não o violou. Ele diz que Cristo violou o sábado, e então mostra que Ele nunca fez isso. Ele apresenta o oitavo dia como mais honrado do que o sétimo, e em outro lugar declara exatamente o oposto. Ele afirma que a lei foi abolida, e em outros lugares assegura sua obrigação perpétua. Ele fala do dia do Senhor como o oitavo dia, e é o segundo dos escritores antigos que faz uma aplicação desse termo ao domingo, sendo Clemente de Alexandria, em 194 d.C., o primeiro. Mas apesar de ele utilizar o termo como Clemente, ele também, da mesma maneira, ensina acerca de um perpétuo dia do Senhor, ou, como Justino Mártir, um sábado perpétuo mediante a observância de todos os dias. E com a observância do domingo como o dia do Senhor, ele introduz as “ofertas pelos mortos” e o uso perpétuo do sinal da cruz. Mas ele afirma expressamente que essas coisas não repousam sobre a autoridade das Escrituras, mas completamente sobre a autoridade da tradição e do costume. E apesar de ele falar do sábado como tendo sido abolido por Cristo, ele expressamente contradiz essa declaração ao afirmar que Cristo “não revogou o sábado de maneira nenhuma”, e que Ele concedeu santidade adicional a esse dia, que desde o princípio tinha sido santificado pela bênção do Pai. Essa estranha mistura de luz e trevas indica claramente a era em que esse autor vivia. Ele não estava tão distante do tempo dos apóstolos, e muitos raios claros da verdade divina brilharam sobre ele; mas ele estava tão mergulhado na era da apostasia a ponto de que as densas trevas dela tenham materialmente lhe afetado. Ele permaneceu no limite entre o findar do dia e o cair da noite. Às vezes, a lei de Deus era indescritivelmente sagrada; outras vezes a tradição tinha autoridade maior do que a lei. Algumas vezes, as instituições divinas eram, por si só, preciosas em sua opinião; mas em outras ocasiões, ele ficava mais satisfeito com aquelas que eram sustentadas apenas pelo costume e pela tradição. SDS 68.1
A primeira referência de Tertuliano ao domingo é encontrada, em sua Apologia, naquela parte em que ele desculpa a seus irmãos da acusação de adoração ao sol. Ele diz: SDS 69.1
Outros, novamente, sem dúvida com mais informações e verossimilhança, creem que o sol é nosso Deus. Seremos considerados persas, talvez, embora não adoremos o astro do dia pintado em um tecido de linho, apresentando-se em todas as partes em sua forma circular. Essa ideia certamente se originou de saberem que nos voltamos para o leste ao orar. Mas vocês, muitos de vocês, fazendo parecer às vezes que estão adorando os astros celestes, movem os lábios para a direção do nascente. Do mesmo modo, se dedicamos o domingo ao regozijo por um motivo bem diferente da adoração ao sol, possuímos certa semelhança com aqueles dentre vocês que dedicam o dia de Saturno à tranquilidade e ao prazer, embora estes também estejam bastante afastados dos costumes judaicos, os quais desconhecem. — Thelwell’s Translation [Tradução de Thelwell], seç. 16. SDS 69.2
Vários fatos importantes são apresentados nessa citação. SDS 69.3
1. O domingo era uma antiga festa pagã em homenagem ao sol. SDS 69.4
2. Os cristãos que observavam a festa dominical eram chamados pelos pagãos de adoradores do sol. SDS 69.5
3. A entrada da festa dominical na igreja, numa era de apostasia em que os homens o honravam de forma bem generalizada, não era apenas fácil de ser efetivada, era na verdade difícil de ser evitada. SDS 69.6
Pode-se inferir a partir da frase final que alguns dos pagãos usavam o sétimo dia como um dia de ociosidade e luxúria. Mas a Mr. Reeve’s Translation [Tradução do Sr. Reeve] apresenta um significado bem diferente. Ela apresenta Tertuliano da seguinte forma: SDS 70.1
Nós solenizamos o dia após o sábado, em contraste com aqueles que chamam a esse dia de seu sábado e o devotam à ociosidade e à comilança, desviando-se dos antigos costumes judeus, dos quais eles são, atualmente, muito ignorantes. SDS 70.2
As pessoas aqui mencionadas com tanto desprezo não poderiam ser os pagãos, pois eles não chamam nenhum dia de “seu sábado”. Eles também não poderiam ser judeus, como fica claro na forma de expressão usada. Se aceitarmos a tradução do Sr. Reeve, essas pessoas eram cristãos que observavam o sétimo dia. Tertuliano não afirma que a festa dominical era observada por autoridade divina, mas que deveriam distinguir-se daqueles que chamavam o sétimo dia de sábado. SDS 70.3
Tertuliano novamente declara que seus irmãos não observavam os dias considerados sagrados pelos judeus. SDS 70.4
Não concordamos com os judeus em suas peculiaridades em relação à comida, tampouco com seus dias sagrados. — Apologia, seç. 21. SDS 70.5
Todavia, os cristãos que não guardavam o sábado porque a festa do domingo, em sua opinião, era mais digna de honra, ou mais conveniente de observar, davam grande importância à observância de outros dias em comum com os pagãos, além do domingo. Assim, Tertuliano acusa-os desse pecado: SDS 70.6
O Santo Espírito repreende os judeus acerca de seus dias sagrados. “Os seus sábados, as luas novas, e cerimônias” Ele diz, “a Minha alma odeia”. Para nós, (a quem os sábados são desconhecidos, assim como as luas novas e as festas anteriormente amadas por Deus) o festival de Saturno, as festas de ano novo, de inverno e o festival de Juno são muito frequentados – trocam-se presentes – presentes de ano novo – os jogos se unem ao seu barulho – os banquetes se unem ao seu ruído! — Oh! Encontramos nas nações melhor fidelidade a seu próprio partido, que não reivindica para si nenhuma solenidade típica dos cristãos! Nem no dia do Senhor, nem no Pentecostes, mesmo se os tivessem conhecido, teriam eles tomado parte conosco; pois temeriam se parecer cristãos. Nós, porém, não nos preocupamos se pareceremos pagãos! Sempre que há oportunidade de condescender com a carne, vocês a agarram. Não direi os seus próprios dias, mas outros também; pois para os pagãos, cada dia de festa acontece apenas uma vez por ano; já vocês têm um dia de festa a cada oitavo dia. — Sobre Idolatria, cap. 14. SDS 70.7
Esses cristãos da festa dominical, “aos quais os sábados” eram “desconhecidos”, não poderiam ter guardado o domingo como um sábado. Eles nunca tinham ouvido que, por autoridade divina, o sábado foi mudado, do sétimo para o primeiro dia da semana, e que o domingo é o sábado cristão. Permita que qualquer pessoa sincera leia as palavras de Tertuliano acima, e então negue, se puder, que esses que não conheciam o sábado, e observavam festas pagãs, não eram um corpo de cristãos apostatados! SDS 71.1
Mais tarde, Tertuliano fará um excelente comentário acerca da sua citação de Isaías. Parece, que da parte de Tertuliano, o suposto dia do Senhor ocorria uma vez a cada oito dias. Se essas palavras fossem tomadas em seu sentido mais óbvio, chegaria um dia depois a cada semana do que na semana anterior, e assim, aconteceria sucessivamente em todos os dias da semana, em ordem, em intervalos de oito dias. Nesse caso, ele bem poderia dizer: SDS 71.2
No entanto, todos os dias são do Senhor; toda hora e todo o momento é oportuno para o batismo; se houver qualquer diferença na solenidade, na graça não existe qualquer distinção. — On Baptism [Sobre o Batismo], cap. 19. SDS 71.3
Mas parece que ao utilizar o termo “oitavo dia”, Tertuliano queria dizer domingo. E aqui apresentamos um comentário dele sobre a maneira de guardá-lo: SDS 72.1
Ainda sobre o assunto de se ajoelhar, a oração está sujeita a uma diversidade de observâncias, mediante o ato de alguns poucos que se abstêm de se ajoelhar aos sábados. E visto que essa divergência está sendo vivenciada nas igrejas, o Senhor dará a graça de que os dissidentes cedam ou então pratiquem sua opinião sem ofender os outros. Nós, porém, (assim como recebemos), somente no dia da ressurreição do Senhor, devemos nos guardar não só de nos ajoelhar, mas de toda a postura e ocupação de preocupação; deixando de lado até mesmo nossos negócios, para não darmos lugar ao Diabo. De maneira semelhante também no período do Pentecostes, o qual distinguimos pela mesma solenidade de exultação. Mas quem hesitaria em prostrar-se diante de Deus todos os dias, pelo menos para a primeira oração com a qual iniciamos o dia? — Tertullian on Prayer [Sobre a Oração], cap. 23. SDS 72.2
Uma tradução mais literal dessa passagem expressamente conectaria o termo “dia do Senhor” ao dia da ressurreição de Cristo, sendo o original “die dominico resurrexionis”. A honra semanal especial que Tertuliano desejava que os homens conferissem somente ao domingo era o ato de ficar de pé durante a oração nesse dia. E, de certa forma, para o seu descontentamento, “alguns poucos” agiam assim com relação ao sábado. Existe, no entanto, alguma referência à interrupção de se fazer negócios no domingo. E isso é digno de nota, pois é a primeira frase que descobrimos, que parece falar de abstinência do trabalho no domingo, e não encontraremos nenhuma outra antes da época da famosa lei dominical de Constantino, de 321 d.C. SDS 72.3
Mas essa passagem está longe de afirmar que trabalhar no domingo era pecado. Ela fala de “deixar de lado até mesmo nossos negócios”; mas isso não implica, necessariamente, em nada além de seu adiamento durante as horas devotadas ao serviço religioso. E não encontraremos nada nos escritos de Tertuliano e nem nos escritos de seus contemporâneos, que vá além disso, enquanto encontraremos muito para nos restringir à interpretação de suas palavras aqui apresentadas. Tertuliano não podia dizer que os sábados eram estranhos a ele e a seus irmãos, se eles religiosamente se abstinham de trabalhar a cada domingo. Mas vamos ouvi-lo novamente acerca da observação do domingo e de práticas análogas: SDS 72.4
Também tomamos, em reuniões antes do amanhecer, das mãos de ninguém menos que o presidente, o sacramento da Eucaristia, o qual o Senhor ordenou que fosse tomada nos horários das refeições e determinou que fosse partilhado por todos [igualmente]. Com a mesma frequência com que o aniversário ocorre, fazemos ofertas pelos mortos como homenagens natalícias. Consideramos ilícito jejuar ou ajoelhar em adoração no dia do Senhor. Nós nos alegramos no mesmo privilégio também desde a Páscoa até o Pentecostes. Ficamos contristados quando algum pão ou vinho, mesmo que seja nosso é lançado ao chão. A cada passo e movimento, a cada entrada e saída, quando nos vestimos e nos calçamos, ao tomarmos banho, ao nos sentar à mesa, ao ascender a luz, ao repousar, ao sentar, em todas as atividades comuns da vida diária, fazemos na testa o sinal [da cruz]. SDS 73.1
Se vocês insistirem em encontrar ordens bíblicas claras para estas e outras regras, não as acharão. A tradição lhes será apresentada como sua originadora, o costume como aquilo que as fortalece, e a fé como o elemento que conduz à sua observância. Que a razão apoiará a tradição, o costume e a fé, vocês mesmos perceberão, ou aprenderão de quem já o percebeu. — De Corona, seç. 3 e 4. SDS 73.2
Ele expressamente nomeia as coisas que ele considerava ilícitas no domingo. São elas: jejuar e ajoelhar nesse dia. Mas o trabalho comum não entra na sua lista de coisas ilícitas nesse dia. E agora, observem o progresso que a apostasia e a superstição haviam feito também em outras coisas. “Ofertas pelos mortos” eram feitas regularmente, e o sinal da cruz era repetido tantas vezes quantas Deus gostaria que as pessoas repetissem Seus mandamentos. Veja Deuteronômio 6:6-9. E agora, se você deseja conhecer a autoridade de Tertuliano para a festa dominical, as ofertas pelos mortos e o sinal da cruz, ele lhe diz francamente qual é. Ele não tinha autoridade das Escrituras. O costume e a tradição eram tudo o que ele podia oferecer. Teólogos modernos podem encontrar muita autoridade, das Escrituras, como afirmam eles, para guardar o suposto dia do Senhor. Tertuliano não encontrou nenhuma. Ele adotou a festa dominical, as ofertas pelos mortos e o sinal da cruz baseadas na autoridade do costume e da tradição; se você adota o primeiro sob tal autoridade, porque não adotar também os outros dois? SDS 73.3
Mas Tertuliano acha necessário escrever uma segunda defesa em favor de seus irmãos, da acusação de serem adoradores do sol, uma acusação diretamente relacionada à sua observância da festa do domingo. Aqui estão suas palavras: SDS 74.1
Outros, com consideração maior pelas boas maneiras, deve-se confessar, supõem que o sol é o deus dos cristãos, pois é fato bem conhecido que oramos voltados para o leste, ou porque fazemos do domingo um dia de festividade. Qual o problema? Por acaso vocês fazem menos do que isso? Não há tantos dentre vocês que, fingindo às vezes adorar os astros celestes, movem os lábios da mesma maneira na direção do nascer do sol? Foram vocês, de todo modo, que chegaram até a admitir o sol no calendário semanal, e escolheram o dia dele (o domingo), em preferência ao dia anterior, ou como o dia mais adequado da semana para uma abstinência completa de banho, ou pelo menos adiando-o até o fim da tarde, ou como dia para descansar e se banquetear. Ao lançarem mão de tais costumes, vocês se desviam deliberadamente de seus próprios ritos religiosos, aderindo a práticas de estrangeiros. Pois as festas judaicas são o sábado e a purificação, sendo também judaicas as cerimônias das lâmpadas, e as festas dos pães asmos, e as “orações literais”, todas instituições e práticas que, naturalmente, são separadas de seus deuses. Dessa forma, para que eu volte dessa divagação, vocês que nos censuram com o sol e com domingo, deveriam considerar sua proximidade conosco. Nós não estamos muito distantes do seu saturno e dos seus dias de descanso. — Ad Nationes, livro 1, cap. 13. SDS 74.2
Tertuliano se refere, nesse discurso, às nações ainda idólatras. Em algumas delas, o domingo era uma festa antiga e que havia sido estabelecida entre os romanos numa data relativamente recente, embora anterior ao tempo de Justino Mártir, o primeiro escritor cristão em quem é encontrada uma menção autêntica desse dia. Os pagãos reprovavam os primeiros cristãos dominicais, dizendo que estes eram adoradores do sol, “porque”, nas palavras de Tertuliano, “nós oramos na direção do leste, ou porque fazemos do domingo um dia de festividade”. E como Tertuliano responde a essa grave acusação? Ele não poderia dizer que nós, por ordenação de Deus, honramos o primeiro dia da semana, pois ele expressamente declara, numa citação anterior, que tal preceito não existe. Então ele responde assim: “Qual é o problema? Por acaso vocês [pagãos] fazem menos do que isso? E ele acrescenta: “Vocês escolheram o seu dia [dia do sol] de preferência ao dia que o precede” (sábado), etc. Ou seja, Tertuliano deseja saber por que, se os pagãos podiam escolher o domingo de preferência ao sábado, os cristãos não poderiam ter o mesmo privilégio! Poderia existir uma evidência ocasional mais forte de que o domingo era valorizado pelos primeiros cristãos apóstatas, não por ter sido ordenado por Deus, mas porque era observado de forma generalizada por seus vizinhos pagãos e, portanto, mais conveniente para eles? SDS 75.1
Mas Tertuliano, em seguida, compartilha sua fé nos dez mandamentos como “as regras da nossa vida regenerada”, ou seja, as regras que governam os cristãos; e ele apresenta a preferência do sétimo dia sobre o oitavo: SDS 75.2
Também devo dizer algo sobre o período do nascimento da alma, para que não omita nenhum incidente em todo o processo. Um parto maduro e regular ocorre, geralmente, no começo do décimo mês. Aqueles que teorizam acerca de números, honram o algarismo dez como o pai de todos os outros, capaz de comunicar perfeição ao nascimento humano. De minha parte, prefiro ver essa medida de tempo em referência a Deus, como se ela significasse, mais propriamente, que os dez meses [de gestação] introduzem o ser humano aos dez mandamentos, de forma que a estimativa numérica do tempo necessário para consumar nosso nascimento natural corresponde à classificação numérica das regras de nossa vida regenerada. Mas visto que o nascimento se completa também no sétimo mês, eu reconheço mais prontamente nesse número do que no oitavo a honra de harmonia numérica com o período sabático. Assim, o mês em que a imagem de Deus é às vezes produzida em um nascimento humano, corresponde, numericamente, ao dia em que a criação divina foi concluída e santificada. — De Anima, cap. 37. SDS 75.3
Esse tipo de raciocínio, é obviamente, destituído de qualquer força. Mas ao apresentar tal argumento, Tertuliano confessa sua fé nos dez mandamentos como a regra da vida cristã, dá preferência ao sétimo dia como o sábado, e conclui que a origem do sábado foi o ato de Deus em santificar o sétimo dia na criação. SDS 76.1
Embora Tertuliano, em outros lugares, como veremos, fale levianamente da lei de Deus, e a apresente como tendo sido abolida, seu próximo testemunho honra essa lei com toda a santidade, e, ao reconhecer o sábado como um de seus preceitos, ele reconhece a autoridade de todo o código. Ele diz o seguinte: SDS 76.2
De quão profunda culpa, então, o adultério — que é de igual maneira uma forma de fornicação, que deve ser considerado de acordo com a sua função penal, a lei de Deus primeiro vem à mão para nos mostrar, se é verdade [de fato é ], que, depois de proibir o serviço supersticioso dos deuses estrangeiros, e a própria fabricação de ídolos, depois de ordenar [à observância religiosa] a veneração do sábado, depois de ordenar um respeito religioso aos pais, os segundos [somente nesse caso] depois de Deus, [essa lei] estabeleceu, como o próximo substrato para reforçar e fortalecer essas contagens, nenhum outro preceito além de “Não adulterarás”. — On Modesty [Sobre Modéstia], cap. 5. SDS 76.3
E acerca esse preceito, Tertuliano nos diz que ele se encontra “em primeiro plano em relação à santíssima lei, destacando-se entre os principais preceitos do edito celestial”. SDS 77.1
Nesse tratado “On Fasting” [Sobre o Jejum], capítulo 14, ele classifica “o sábado – como um dia que nunca deve ser guardado como jejum, exceto por ocasião da Páscoa, de acordo com uma razão apresentada em outro lugar”. E no capítulo 15, ele não inclui “os sábados” e “os dias do Senhor” nas duas semanas nas quais não se ingeria alimento. SDS 77.2
Mas em sua “Answer to the Jews” [Resposta aos Judeus], no capítulo 2, ele apresenta a lei como tendo sido bastante modificada desde Adão até Cristo; ele nega “que o sábado ainda deve ser observado”; classifica-o junto com a circuncisão; declara que Adão não era “observador do sábado”; afirma o mesmo de Abel, Noé, Enoque e Melquisedeque, e afirma que Ló “foi libertado da conflagração dos sodomitas” “por méritos da justiça, sem a observância da lei”. E no começo do capítulo três, ele novamente classifica o sábado junto com a circuncisão, e afirma que Abraão não “observava o sábado”. SDS 77.3
No capítulo 4, ele declara que “a observância do sábado” era “temporária”. E ele continua da seguinte forma: SDS 77.4
Pois os judeus dizem que no princípio Deus santificou o sétimo dia, nele descansando de todas a obra que tinha feito; e que foi dali então, semelhantemente, que Moisés também disse ao povo: “Lembrem-se dos dias de sábado”, etc. SDS 77.5
Veja agora como Tertuliano e seus irmãos descartam esse mandamento acerca do sétimo dia: SDS 77.6
Por isso, nós [cristãos] entendemos que nós, com maior intensidade, devemos observar um sábado de toda ‘obra servil’ continuamente, e não só a cada sétimo dia, mas o tempo inteiro. SDS 77.7
Isso quer dizer, em linguagem clara, que eles, sob o pretexto de guardar todos os dias como um sábado, não somente trabalhariam no sétimo dia da semana, mas também em todos os outros dias. Mas isso prova claramente que Tertuliano não pensava que o sétimo dia tinha sido substituído pelo primeiro. E assim ele prossegue: SDS 78.1
E mediante isso levanta-se a questão, para nós, de qual sábado Deus desejava que guardássemos. SDS 78.2
Nossos amigos defensores do primeiro dia citam Tertuliano em favor do que eles chamam de sábado cristão. Se acreditasse em tal instituição, ele certamente teria evidenciado isso na resposta a essa questão. Mas observe a sua resposta: SDS 78.3
Pois a Escritura aponta para um sábado eterno e um sábado temporal. Pois Isaías, o profeta, diz: “Os seus sábados, a Minha alma odeia”. E em outro lugar, ele diz: “Os Meus sábados tens profanado”. Por isso, nós discernimos que o sábado temporal é humano, e o sábado eterno é divino. SDS 78.4
Esse sábado temporal é o sétimo dia; e o sábado eterno é a guarda de todos os dias igualmente, como Tertuliano afirma que ele e os que com ele estavam guardavam. SDS 78.5
Em seguida, ele declara que a profecia de Isaías a respeito do sábado na nova Terra (Isaías 66:22, 23), foi “cumprida no tempo de Cristo, quando toda a carne — isto é, todas as nações vieram adorar a Deus, o Pai, em Jerusalém”. E acrescenta: “Assim, portanto, antes desse sábado temporal [o sétimo dia], havia também um sábado eterno previsto e predito”, isto é, a guarda de todos os dias igualmente. E ele reforça isso pela afirmação de que as pessoas santas, antes de Moisés, não observavam o sétimo dia. E como prova de que o sábado era um dia que cessaria, ele cita a marcha ao redor de Jericó por sete dias, dos quais um desses certamente era sábado. E a isso ele acrescenta o caso de Macabeu, que lutou algumas batalhas no sábado. No devido tempo veremos quão maravilhosamente ele responde a objeções como essas, levantadas por ele mesmo. SDS 78.6
No capítulo 6, ele repete sua teoria do “sábado temporal” [o sétimo dia] e o “sábado eterno”, ou o “sábado espiritual”, que significa “observar um sábado de toda ‘obra servil’, continuamente, e não só a cada sétimo dia, mas o tempo inteiro”. SDS 79.1
No vigésimo capítulo de seu primeiro livro contra Marcião, Tertuliano cita Oseias 2:11, e Isaías 1:13, 14, para provar que o sábado foi anulado. Em seu quinto livro contra Marcião, no capítulo 4, ele cita Gálatas 4:10; João 19:31; Isaías 1:13, 14; Amós 5:21, e Oseias 2:11, para provar que “o Criador aboliu Suas próprias leis”, e que Ele “destruiu as instituições que Ele mesmo havia estabelecido”. Essas citações são aparentemente designadas para provar que o sábado foi abolido, mas ele não entra em discussão sobre elas; mas no décimo nono capítulo do livro ele cita Gálatas 2:16, 17, e simplesmente diz o seguinte sobre a lei: “Aqui o apóstolo ensina claramente como ele foi abolido, passando da sombra para a substância — isto é, dos tipos simbólicos para a realidade, que é Cristo”. Essa observação é verdadeira e excluiria justamente a lei moral dessa abolição. SDS 79.2
Mas no capítulo vinte e um de seu segundo livro contra Marcião, ele responde às próprias objeções que ele mesmo alardeou contra o sábado em outros lugares, como percebemos, extraídas do caso de Jericó. Ele diz o seguinte a Marcião: SDS 79.3
Vocês, porém, não devem considerar a lei do sábado, pois são as obras humanas e não as divinas, que a ela mesma proíbe. Pois está escrito: “Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do SENHOR, teu Deus; não farás nenhum trabalho”. Que trabalho? O seu próprio, obviamente. A conclusão é que Ele [Deus] remove do dia de sábado aquelas obras que antes havia ordenado para os seis dias, isto é, as suas próprias obras; em outras palavras, as obras humanas da vida diária. Agora, o transporte da arca, evidentemente, não é um dever diário comum, menos ainda humano; mas uma obra rara e sagrada e, por ter sido ordenada por preceito direto de Deus, uma obra divina.... Assim, neste caso, há uma distinção clara acerca da proibição sabática de obras humanas, não das divinas. Portanto, o homem que saiu e ajuntou lenha no dia de sábado, foi punido com a morte. Pois foi a sua própria obra que ele realizou e isto a lei proibia. Aqueles, porém, que carregaram a arca ao redor de Jericó no sábado, assim fizeram e ficaram impunes. Pois não executaram a sua própria obra, mas a obra de Deus, e isto, segundo Sua ordem expressa. SDS 79.4
No capítulo seguinte ele cita novamente Isaías 1:11-14, como prova de que o sábado foi abolido. No entanto, agora ele explicará esse texto, que tantas vezes usou contra o sábado, e para mostrar que, na realidade, ele não tem tal significado. Nesse meio tempo, ele vai declarar novamente que Josué não violou o sábado e, tendo feito isso, pensará ser oportuno afirmar novamente que “o sábado, na realidade, foi transgredido por Josué”. Em seu quarto livro contra Marcião, no capítulo 12, ele discute a questão se Cristo, como Senhor do sábado, tinha o direito de anular o sábado, e se durante Sua vida, Ele realmente o violou. Para fazer isso, ele cita novamente o caso de Jericó, e na realidade afirma que o sábado foi transgredido naquela ocasião, e ao mesmo tempo nega que isso tenha acontecido. Ele diz o seguinte: SDS 80.1
Se Cristo interferiu no sábado, ele simplesmente agiu seguindo o exemplo do Criador; visto que, durante o cerco da cidade de Jericó, o ato de transportar a arca da aliança ao redor do muro por oito dias consecutivos, e, portanto, num dia de sábado, na verdade anulou o sábado por ordem do Criador – de acordo com a opinião daqueles que pensam isso sobre Cristo [Lucas 6:1-5], em sua ignorância de que nem Cristo nem o Criador violaram o sábado, como mostraremos pouco a pouco. Todavia, o sábado foi, de fato, transgredido por Josué, para que a presente acusação também possa ser usada contra Cristo. SDS 80.2
O sábado não foi violado no caso de Jericó, contudo ele certamente foi violado lá! Tertuliano acrescenta que, se Cristo odiava o sábado, Ele seria, nesse aspecto, como o próprio Criador, que declara [Isaías 1:14] que o odeia. Ele se esquece de que o Criador expressamente declarou Sua grande consideração pelo sábado por meio desse mesmo profeta [cap. 58:13, 14], e passa por alto o fato de que o que Deus odeia é a conduta hipócrita do povo, como demonstrada em Isaías 1. Em seu quarto livro contra Marcião, no capítulo 16, Cristo é mencionado como o Senhor do sábado, mas nada é dito acerca das obrigações sabáticas. No capítulo 30 desse mesmo livro, ele faz alusão à cura realizada por Cristo no dia de sábado, mencionada em Lucas 13:11-16, e diz: “Quando, portanto, Ele fez uma obra de acordo com as condições prescritas pela lei, Ele confirmou, ao invés de transgredir, a lei”, etc. SDS 80.3
No décimo segundo capítulo desse livro, porém, ele afirma muitas coisas relativas a Cristo. Ele diz que os discípulos, ao debulhar as espigas de milho no sábado “tinham transgredido o santo dia. Cristo os desculpa e torna-Se seu cúmplice na transgressão do sábado”. Ele argumenta que, como o sábado, desde o princípio — que aqui ele indica como a queda do maná, embora em outros lugares ele o tenha datado desde a criação — nunca foi designado como um dia de jejum, o Salvador agiu corretamente ao justificar o ato dos discípulos na plantação de milho. E ele cita o exemplo de Davi, um “precedente disfarçado” para justificar o ato de comer o milho. Mas embora ele apresente o Salvador como se estivesse “anulando o sábado”, nessa ocasião, ele também afirma que, nesse mesmo caso, “Ele mantém a honra do sábado como um dia que deve ser livre de tristeza, não de trabalho”. Ele justifica o Salvador em Seu ato de curar no sábado, declarando que nisso Ele estava fazendo aquilo que a lei do sábado não proibia. A seguir, Tertuliano afirma exatamente o inverso de muitas coisas que ele havia antecipado contra o sábado, e até responde suas próprias objeções contra esse dia. Ele diz o seguinte: SDS 81.1
Para que pudesse, enquanto permitia a quantidade de trabalho que estava prestes a realizar por uma alma, lembrá-los de quais tipos de obras a lei do sábado proibia — as obras humanas; e quais ela ordenava — as obras divinas, que podem ser feitas para o benefício de qualquer alma. Ele foi chamado de ‘Senhor do sábado’ porque afirmava que o sábado era Sua própria instituição. Agora, mesmo se Ele tivesse anulado o sábado, Ele teria o direito de fazê-lo, sendo seu Senhor, [e] ainda mais como Aquele que o instituiu. Mas Ele não o destruiu completamente, muito embora fosse seu Senhor, para que possa, daqui em diante, ficar claro que o sábado não foi transgredido pelo Criador, nem mesmo quando a arca foi carregada ao redor de Jericó. Pois isso foi obra de Deus, a qual Ele mesmo ordenou, e a qual Ele ordenou por causa das vidas dos Seus servos, quando expostos aos perigos da guerra. — Livro 4, cap. 12. SDS 81.2
Nesse parágrafo, Tertuliano explica a lei de Deus de uma maneira muito clara. Ele mostra, acima de qualquer dúvida, que nem Josué nem Cristo jamais a violaram. Ele também declara que Cristo não aboliu o sábado. Na passagem seguinte ele responde mais admiravelmente à sua própria repetida perversão de Isaías 1:13, 14, contradizendo alguns de seus sérios erros. Ouça-o: SDS 82.1
Embora, em determinado lugar Ele tenha expressado uma aversão aos sábados, chamando-os “seus sábados”, imputando-os como sábados dos seres humanos, e não Seus próprios — porque eram celebrados sem o temor de Deus, por um povo cheio de iniquidades que amavam a Deus “com os lábios, mas não com o coração” — ainda assim Ele colocou os Seus sábados (isto é, aqueles que foram guardados de acordo com essa prescrição) em uma posição diferente; pois, em uma passagem posterior do mesmo profeta, ele declara que eles são “verdadeiros, deleitosos e invioláveis”. [Isaías 58:13; 56:2.] Assim, Cristo não revogou o sábado de maneira nenhuma: Ele guardou a lei referente a esse dia. No caso anterior, realizou uma obra benéfica para a vida de Seus discípulos (pois permitiu que se alimentassem quando estavam famintos), e, neste caso, curou a mão ressequida. Em ambas as situações, deixou que os fatos anunciassem: ‘Não vim para destruir a lei, mas, sim, para cumpri-la”, portanto Marcião teve sua boca amordaçada com essas palavras. SDS 82.2
Aqui Tertuliano mostra que Deus não odiava os Seus próprios sábados, apenas a hipocrisia daqueles que professavam guardá-lo. Ele também declara expressamente que o Salvador “não revogou o sábado de maneira nenhuma”. E agora que ele está com a mão na massa, ele não vai parar até que tenha testificado a favor de uma nobre confissão sabatista de fé, atribuindo a origem do sábado à criação, e perpetuando a instituição com salvaguardas divinas e santidade adicional. Além disso, ele afirma que o adversário de Cristo [Satanás] gostaria que Ele tivesse adotado isso com relação a outros dias, — um duro golpe sobre aqueles que, nos tempos modernos, tão resolutamente sustentam que Ele consagrou o primeiro dia da semana para tomar o lugar do dia de descanso do Criador. Ouça Tertuliano novamente, que continua da seguinte forma: SDS 83.1
Pois, até mesmo no caso diante de nós, Ele [Cristo] cumpriu a lei, enquanto interpretava a natureza dela. [Além disso], Ele mostrava em clara luz os diferentes tipos de obras, enquanto fazia aquelas que estavam dentro dos limites da santidade do sábado, [e] enquanto conferia ao próprio dia de sábado, que desde o princípio fora consagrado pela bênção do Pai, uma santidade adicional por meio de Suas próprias ações beneficentes. Pois Ele forneceu salvaguardas divinas a esse dia — um procedimento que Seu adversário teria adotado com relação a outros dias, a fim de evitar a honra ao sábado do Criador e a restituição, devida ao sábado, das obras apropriadas a esse dia. Uma vez que, de maneira semelhante, o profeta Eliseu restaurou à vida, nesse dia, o filho morto da mulher sunamita, veja você, Oh! fariseu, e você também, Oh! Marcião, como era [o uso adequado] dos antigos sábados do Criador para o fazer o bem, para salvar a vida e não destruí-la; como Cristo não introduziu nada novo, que não fosse segundo o exemplo, a gentileza, a misericórdia e também a presciência do Criador. Pois nesse mesmo exemplo Ele faz o anúncio profético de uma cura específica: “As mãos enfraquecidas são fortalecidas”, da mesma maneira que “os joelhos débeis” do enfermo paralítico foram fortalecidos. — Tertuliano contra Marcião, livro 4, cap. 12. SDS 83.2
Tertuliano erra em sua referência à mulher sunamita. Não era dia de sábado que ela foi ao profeta (2 Reis 4:23). Mas nos últimos três parágrafos citados dele, que em sua obra formam uma declaração contínua, ele afirma muitas verdades importantes que são dignas de cuidadosa enumeração. São as seguintes: SDS 84.1
1. Cristo, ao determinar o que deveria e o que não deveria ser feito no sábado, “foi chamado ‘Senhor do sábado’, pois Ele guardou esse dia como Sua própria instituição”. SDS 84.2
2. “O sábado não foi quebrado pelo Criador, nem mesmo quando a arca foi carregada ao redor de Jericó”. SDS 84.3
3. A razão pela qual Deus expressa sua aversão aos “seus sábados”, como se eles fossem “sábados dos seres humanos, não Seus próprios”, foi “porque eles eram celebrados sem o temor de Deus, por um povo cheio de iniquidades”. Veja Isaías 1:13, 14. SDS 84.4
4. “Pelo mesmo profeta [Isaías 58:13, 56:2], declara que eles [os sábados] são ‘verdadeiros, deleitosos e invioláveis”. SDS 84.5
5. “Assim Cristo, não revogou o sábado de maneira nenhuma”. SDS 84.6
6. “Ele guardou a lei referente a esse dia”. SDS 84.7
7. “O próprio dia de sábado, que desde o princípio foi consagrado pela bênção do Pai”. Essa linguagem atribui expressamente a origem do sábado ao ato do Criador no encerramento da primeira semana do tempo. SDS 84.8
8. Cristo conferiu ao sábado “uma santidade adicional por meio de Suas próprias ações beneficentes”. SDS 84.9
9. “Ele forneceu salvaguardas divinas a esse dia — um procedimento que Seu adversário teria adotado com relação a outros dias, a fim de evitar a honra ao sábado do Criador e a restituição, devida ao sábado, das obras apropriadas a esse dia”. SDS 84.10
Essa última declaração é, de fato, muito interessante. Cristo forneceu ao “sábado do Criador”, o sétimo dia, “salvaguardas divinas”. Seu adversário [o adversário de Cristo é o Diabo] teria “adotado” esse procedimento “com relação a outros dias”. Isto quer dizer que o Diabo teria se agradado se Cristo tivesse consagrado outros dias, ao invés de acrescentar mais santidade ao sábado de Seu Pai. O que Tertuliano diz que o Diabo teria se agradado se Cristo tivesse feito, é o que os nossos amigos defensores do primeiro dia agora afirmam que Ele fez, no estabelecimento do que eles chamam de sábado cristão! No entanto, nunca se ouviu falar de uma instituição como essa nos dias dos supostos pais cristãos. Apesar das muitas declarações errôneas de Tertuliano acerca do sábado e da lei, aqui ele apresentou um nobre testemunho em favor da verdade, e isso encerra suas palavras. SDS 85.1