Daniel e Apocalipse

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Daniel 12 — Cenas finais

VERSÍCULO 1. Nesse tempo, se levantará Miguel, o grande príncipe, o defensor dos filhos do teu povo, e haverá tempo de angústia, qual nunca houve, desde que houve nação até àquele tempo; mas, naquele tempo, será salvo o teu povo, todo aquele que for achado inscrito no livro. DAP 241.1

Um período DEFINIDO é introduzido neste versículo, não um tempo revelado em nomes ou números que especifiquem qualquer ano, mês ou dia específico, mas um período que se torna definido pela ocorrência de determinado evento ao qual se encontra relacionado. “Nesse tempo”. Que tempo? O tempo ao qual somos levados pelo versículo final do capítulo anterior — o tempo em que o rei do norte estabeleceria suas tendas palacianas no monte santo glorioso; ou, em outras palavras, quando os turcos, expulsos da Europa, se apressarem para transformar Jerusalém em sua sede temporária de governo. Destacamos, nos comentários sobre a última parte do capítulo anterior, alguns dos agentes já em operação para o cumprimento desse objetivo e alguns indícios de que os turcos logo se verão obrigados a tomar esse passo. E quando esse evento ocorrer, ele chegará ao seu fim. Então, de acordo com este versículo, devemos procurar pelo levantamento de Miguel, o grande príncipe. Esse movimento da parte da Turquia é o sinal para o levantamento de Miguel, isto é, marca tal acontecimento como o próximo na ordem. E para impedir qualquer incompreensão, que fique bem claro para o leitor que não estamos dizendo que o próximo movimento contra os turcos os expulsará da Europa, ou que, quando eles estabelecerem a capital em Jerusalém, Cristo começará Seu reino sem demorar mais um dia ou hora sequer. Mas estes são os eventos que sobrevirão, conforme cremos, na seguinte ordem: 1) mais pressão sobre a Turquia, de alguma forma; 2) sua retirada da Europa; 3) seu posicionamento final em Jerusalém; 4) o levantamento de Miguel, ou o início do reinado de Cristo, e Sua vinda nas nuvens do céu; e não é razoável supor que se passará um intervalo muito grande entre os dois acontecimentos. DAP 241.2

Quem, então, é Miguel? E o que significa Ele se levantar? Em Judas 9, Miguel é chamado de o arcanjo. Isso significa anjo chefe, ou líder sobre os anjos. Só existe um. Quem é Ele? Aquele cuja voz se ouvirá do Céu quando os mortos forem ressuscitados (1 Tessalonicenses 4:16). E a voz de quem será ouvida nesse acontecimento? A voz de nosso Senhor Jesus Cristo (João 5:28). Comparando as evidências fornecidas por esses versos, chegamos às seguintes conclusões: a voz do Filho de Deus é a voz do arcanjo; logo, o arcanjo é o Filho de Deus. Mas o arcanjo é Miguel; portanto, Miguel também é o Filho de Deus. A expressão de Daniel, “o grande príncipe, o defensor dos filhos do teu povo”, já é suficiente por si só para identificar aquele aqui mencionado como o Salvador dos homens. Ele é o Príncipe da vida (Atos 3:15, ARC); e Deus O exaltou a “Príncipe e Salvador” (Atos 5:31). Ele é o grande Príncipe. Não há ninguém maior, a não ser o Pai soberano. DAP 241.3

E Ele é “o defensor dos filhos do Teu povo”. Ele Se digna a tomar os servos de Deus nesse pobre estado mortal e redimi-los para serem súditos de Seu reino futuro. Ele nos defende. Seu povo é essencial para Seus propósitos futuros, parte inseparável da herança que comprou por alto preço. Seus filhos serão os principais agentes da alegria eterna pela qual Cristo suportou todo o sacrifício e sofrimento que marcaram Sua intervenção em favor da raça caída. Que honra extraordinária! Que gratidão eterna Lhe seja prestada por Sua condescendência e misericórdia para conosco! Seus sejam o reino, o poder e glória, para todo o sempre! DAP 242.1

Chegamos agora à segunda pergunta: o que significa Miguel Se levantar? A chave para a interpretação dessa expressão nos é fornecida nos versículos 2 e 3 do capítulo 11: “Eis que ainda três reis se levantarão na Pérsia”; “Depois, se levantará um rei poderoso, que reinará com grande domínio”. Não há como restar dúvida quanto ao sentido das expressões nesses casos. Elas significam tomar o reino, reinar. A mesma expressão no versículo em análise deve significar o mesmo. Nesse tempo, Miguel Se levantará, tomará o reino e começará Seu domínio. DAP 242.2

Mas Cristo não está reinando agora? Sim, junto ao Pai, no trono do domínio universal (Efésios 1:20-22; Apocalipse 3:21). Mas desse trono, ou reinado, Ele abrirá mão ao fim desta dispensação (1 Coríntios 15:24); então Ele começará o reinado destacado no texto, quando Se levantar ou assumir o próprio reino, o trono de Seu pai Davi, prometido há tanto tempo, estabelecendo um domínio que nunca terá fim (Lucas 1:32-33). DAP 242.3

O exame de todos os acontecimentos que constituem essa alteração, ou estão inseparavelmente ligados a essa mudança na posição de nosso Senhor, não faz parte do escopo desta obra. Basta dizer que, nesse momento, os reinos deste mundo se tornarão o reino “de nosso Senhor e do Seu Cristo” (Apocalipse 11:15). Suas roupas sacerdotais serão trocadas por vestimentas reais. A obra de misericórdia estará concluída e o tempo da graça de nossa raça terá terminado. Então, aquele que é imundo não terá mais esperança de recuperação; e quem é santo não correrá mais o risco de cair (cf. Apocalipse 22:11). Todos os casos estarão decididos. E a partir de então, antes que as nações aterrorizadas contemplem, nas nuvens do céu, a forma majestosa do Rei que insultaram, elas serão quebradas como por um cetro de ferro e partidas em pedacinhos como o vaso do oleiro. Isso ocorrerá devido a um tempo de angústia como nunca houve, marcado por uma série de juízos sem precedentes na história do mundo, os quais culminarão com a revelação do Senhor Jesus Cristo no céu em fogo consumidor, a fim de Se vingar daqueles que não conhecem a Deus, nem obedecem ao evangelho (2 Tessalonicenses 1:7, 8; Apocalipse 11:15; 22:11, 12). Logo, são grandiosos os acontecimentos introduzidos pelo levantamento de Miguel. E assim Ele Se levanta, ou toma o reino, marcando o início desse período decisivo na história da humanidade, por algum tempo antes de Sua volta pessoal a esta Terra. Quão importante, então, é conhecermos Sua posição, a fim de podermos traçar o progresso de Sua obra e entendermos quando se aproximará esse momento convulsivo em que cessará Sua intercessão em favor da humanidade, fixando o destino de todos para sempre. DAP 242.4

Mas como saber disso? Como determinar o que se passa tão longe no Céu, no santuário do alto? Deus é tão bom que colocou os meios necessários para o conhecimento em nossas mãos. Quando certos grandes eventos ocorrem na Terra, Ele nos informa quais acontecimentos se desenrolam em sincronia no Céu. Pelas coisas que se veem, aprendemos de coisas que não se veem. Assim como podemos olhar da natureza para o Deus da natureza, por meio de fenômenos e eventos terrestres temos condições de delinear os grandes movimentos do mundo celestial. Quando o rei do norte estabelecer suas tendas palacianas entre os mares no glorioso monte santo, um acontecimento cujos passos iniciais já podemos contemplar, então Miguel, nosso Senhor, Se levantará, ou seja, receberá de Seu Pai o reino — evento preparatório para Seu retorno a esta Terra. Ou a situação poderia ser expressa por meio das seguintes palavras: então nosso Senhor cessará Sua obra como nosso grande Sumo Sacerdote e o tempo da graça deste mundo terminará. A grande profecia das 2.300 tardes e manhãs nos apresenta de maneira definitiva o início da parte final da obra no santuário celestial. O versículo em análise nos dá informações por meio das quais podemos descobrir, de maneira aproximada, o tempo em que tal obra chega a seu fim. DAP 242.5

Em conexão com o levantamento de Miguel, ocorre um tempo de angústia qual nunca houve. Em Mateus 24:21, lemos sobre um período de tribulação como nunca existiu antes dele, nem haverá depois. Essa tribulação, cumprida por meio da opressão e massacre da igreja pelo poder papal, já faz parte do passado, ao passo que o tempo de angústia de Daniel 12:1, de acordo com o ponto de vista que defendemos, ainda é futuro. Como pode haver dois tempos de angústia, separados por muitos anos, cada um deles maior do que qualquer outro antes e depois de si? A fim de evitar qualquer dificuldade nesse ponto, é importante observar com cuidado a distinção a seguir: a tribulação mencionada em Mateus é sobre a igreja. Cristo está falando a Seus discípulos e aos discípulos do futuro. Eles eram os envolvidos e, por sua causa, os dias da tribulação seriam abreviados (v. 22). Já o tempo de angústia mencionado em Daniel não é um período de perseguição religiosa, mas, sim, de calamidade nacional. Não houve nada como ele desde que existe, não uma igreja, mas, sim, nação. Ele sobrevirá ao mundo inteiro. Será a última angústia que acometerá o planeta em sua condição presente. Em Mateus, faz-se referência a uma época posterior a essa tribulação; pois depois que ela terminasse, não haveria nenhuma semelhante sobre o povo de Deus. Mas aqui em Daniel não existe alusão a um período futuro, após o tempo de angústia mencionado. Pois ele encerra a história deste mundo. Inclui as sete últimas pragas de Apocalipse 16 e culmina com a revelação de nosso Senhor Jesus, vindo em Seu caminho de nuvens no fogo consumidor, para visitar com destruição os inimigos que não aceitaram Seu reinado sobre eles. Mas todo aquele cujo nome estiver inscrito no livro — o livro da vida — será livrado dessa tribulação, “porque, no monte Sião […] estarão os que forem salvos, como o Senhor prometeu; e, entre os sobreviventes, aqueles que o Senhor chamar” (Joel 2:32). DAP 243.1

VERSÍCULO 2. Muitos dos que dormem no pó da Terra ressuscitarão, uns para a vida eterna, e outros para vergonha e horror eterno. DAP 243.2

Esse versículo também revela como será grandioso o período introduzido pelo levantamento de Miguel, ou o início do reinado de Cristo, conforme mencionado no primeiro versículo deste capítulo, pois o evento aqui narrado em termos explícitos é a ressurreição dos mortos. Essa é a ressurreição geral que ocorrerá na segunda vinda de Cristo? Ou haverá, entre o momento em que Cristo receber o reino e Sua revelação à Terra em toda a glória de Seu advento (Lucas 19:12), uma ressurreição especial em resposta à descrição que aqui é feita? Uma dessas precisa ocorrer, pois todas as declarações das Escrituras se cumprirão. DAP 243.3

Por que não pode se tratar da primeira opção, ou seja, a ressurreição que ocorrerá ao soar a última trombeta? Resposta: porque somente os justos, excluindo-se todos os ímpios, participarão dessa ressurreição. Aqueles que dormiram em Cristo sairão da sepultura, mas somente eles, pois o restante dos mortos só voltará a viver depois de mil anos (Apocalipse 20:5). Logo, a ressurreição geral de toda a raça humana será dividida em duas grandes etapas: a primeira, somente dos justos, por ocasião do retorno de Cristo; a segunda, exclusivamente dos ímpios, após mil anos. A ressurreição geral não será mista. Os justos e os ímpios não sairão do túmulo misturados, na mesma ocasião. Em vez disso, cada uma das duas classes ressurgirá em separado e se passará um período entre as respectivas ressurreições, claramente definido como um intervalo de mil anos. DAP 244.1

Mas na ressurreição destacada pelo versículo em análise, muitos tantos dos justos quanto dos ímpios ressuscitarão juntos. Logo, não pode se tratar da primeira ressurreição, que inclui apenas os justos, nem da segunda, distintamente restrita aos ímpios. Se o texto dissesse: “Muitos dos que dormem no pó da Terra ressuscitarão para a vida eterna”, os “muitos” poderiam ser interpretados como uma referência a todos os justos, e a ressurreição ser a que ocorrerá junto com a segunda vinda de Cristo. Mas o fato de muitos serem maus e ressuscitarem para vergonha e horror eterno impede que se faça tal aplicação. DAP 244.2

Pode-se fazer a objeção de que este texto só fala do despertamento dos justos, de acordo com a tradução de Bush e Whiting, a saber: “E muitos dos que dormem no pó da Terra despertarão, estes para a vida eterna, e aqueles para a vergonha e o desprezo eternos”. Deve-se notar, antes de mais nada, que essa tradução (que não é, de modo algum, imune a críticas), nada prova a menos que os termos suprimidos pela elipse evidente sejam trazidos à tona. Alguns interpretam que o texto, sem a elipse, significa o seguinte: “E muitos dos que dormem no pó da Terra despertarão, estes [os que despertaram] para a vida eterna, e aqueles [os que não despertaram] para a vergonha e o desprezo eternos”. É importante observar ainda que essa alternativa não resolve a elipse; em vez disso, acrescenta um comentário, algo muito diferente. Suprir termos omitidos pela elipse significa simplesmente inserir as palavras necessárias para completar a frase. “Muitos dos que dormem no pó da Terra despertarão” é uma frase completa. Tanto sujeito quanto predicado se encontram expressos. A frase que se segue, “uns [ou estes] para a vida eterna”, não é completa. O que é necessário para completá-la? Não um comentário que apresente a opinião de alguém sobre qual seria o significado de “estes”, mas, sim, um verbo do qual o termo possa ser o sujeito. Que verbo seria? Isso deve ser determinado pela parte anterior do trecho, na qual o verbo despertarão é usado. Esse, então, é o predicado a ser acrescentado: “Uns [ou estes] despertarão para a vida eterna”. Aplicando a mesma regra à frase seguinte, “Outros [ou aqueles] para a vergonha e o desprezo eternos”, que não é completa em si mesma, somos obrigados a suprir as mesmas palavras e ler: “Outros [ou aqueles] despertarão para a vergonha e o desprezo eternos”. Qualquer coisa menos que isso não completaria o sentido e qualquer coisa diferente perverteria o texto; pois um predicado acrescentado não pode ir além de algum que já foi expresso. A afirmação feita no texto se refere apenas aos muitos que despertam. Nada se diz quanto ao restante que não acorda. E dizer que a expressão “para a vergonha e o desprezo eternos” se aplica a eles, quando nada se declara sobre eles, é um ultraje não só ao sentido do texto, mas também às leis gramaticais. Dentre os muitos que ressuscitam, uns saem para a vida eterna e outros “para vergonha e desprezo eterno” (ARC), mais uma prova da ressurreição consciente desses também; pois embora o desprezo seja sentido e manifesto por outros em relação aos culpados, somente as partes culpadas podem sentir e manifestar vergonha. Portanto, essa ressurreição, conforme já comprovado, engloba tanto os justos quanto os ímpios e não pode se tratar da ressurreição geral do último dia. DAP 244.3

Há lugar, então, para uma ressurreição especial ou limitada, ou qualquer indicativo de tal evento, antes da vinda do Senhor? A ressurreição aqui predita ocorrerá quando o povo de Deus for liberto do grande período de angústia com o qual a história deste mundo terminará. Com base em Apocalipse 22:11, percebe-se que tal livramento ocorrerá antes da vinda do Senhor. Chegará o momento terrível no qual os impuros e injustos continuarão a sê-lo, e os justos e santos manterão sua condição. Então o caso de todos estará decidido para sempre. E quando essa sentença for pronunciada sobre os justos, isso lhes será um livramento, pois serão colocados além de todo alcance de perigo ou temor do mal. Mas o Senhor ainda não terá voltado, pois se acrescenta imediatamente: “Eis que venho sem demora”. Supõe-se que a declaração desse decreto solene que sela os justos para a vida eterna e os ímpios para a morte eterna ocorrerá em sincronia com a grande voz ouvida do trono no templo do Céu, dizendo: “Feito está!” (Apocalipse 16:17). Sem dúvida, essa é a voz de Deus, mencionada com tanta frequência nas descrições das cenas relacionadas ao último dia. Joel fala sobre isso (3:16): “O Senhor brama de Sião e Se fará ouvir de Jerusalém, e os céus e a terra tremerão; mas o Senhor será o refúgio [esperança, na KJV] do Seu povo e a fortaleza dos filhos de Israel”. A margem [da KJV] diz que Deus será o “lugar de reparo, refúgio, ou porto seguro”, em vez de “esperança”, [à semelhança da versão ARA]. Então, nessa ocasião, quando a voz de Deus for ouvida do Céu, logo antes da vinda do Filho do homem, Ele será um porto seguro, um refúgio, para Seu povo. Em outras palavras, Deus há de lhes prover libertação. Quando a voz de Deus soar e as decisões eternas forem pronunciadas sobre a raça humana, no momento em que a última cena extraordinária estiver prestes a se abrir sobre o mundo condenado, Deus dará às nações perplexas outra evidência e prova de Seu poder, ressuscitando dos mortos uma multidão que já por muito tempo dormia no pó da Terra. DAP 245.1

Assim percebemos que há tempo e lugar para a ressurreição de Daniel 12:2. Acrescentamos agora que há uma passagem no livro de Apocalipse que torna necessário supor que uma ressurreição dessa natureza ocorrerá. Apocalipse 1:7 diz: “Eis que vem com as nuvens [inquestionavelmente uma referência ao segundo advento], e todo olho o verá [das pessoas que estiverem vivas na Terra], até quantos o traspassaram [aqueles que desempenharam um papel ativo na terrível obra de Sua crucifixão]. E todas as tribos da Terra se lamentarão sobre Ele”. A menos que se fizesse uma exceção, aqueles que crucificaram o Senhor permaneceriam na sepultura até o fim dos mil anos, ressurgindo na reunião geral dos ímpios nessa ocasião. Mas aqui se afirma que eles contemplarão o Senhor no segundo advento. Logo, é preciso haver uma ressurreição especial para esse fim. DAP 245.2

Com certeza, é mais do que apropriado alguns que se destacaram em santidade, labutaram e sofreram pela esperança na vinda do Salvador, mas morreram sem contemplá-Lo, ressuscitarem pouco antes para testemunhar as cenas que acompanharão essa gloriosa epifania; assim como, de maneira semelhante, um grupo de justos saiu do túmulo após a ressurreição de Cristo a fim de contemplar Sua glória ressurreta (Mateus 27:52-53), e acompanhá-Lo em triunfo à destra do trono da majestade celeste (Efésios 4:8, margem da KJV). Também é adequado que alguns, proeminentes na maldade, que fizeram o máximo para envergonhar o nome de Cristo e prejudicar Sua causa, sobretudo aqueles que asseguraram Sua morte cruel sobre a cruz, zombando Dele e O injuriando enquanto perecia, ressuscitem, como parte de sua punição judicial, para contemplar Seu retorno nas nuvens do céu como vencedor celestial, em majestade e esplendor insuportáveis para eles. DAP 246.1

Mais um comentário sobre esta passagem antes de prosseguirmos. Alguns supõem que aquilo que acabamos de dizer fornece boas evidências do sofrimento consciente eterno dos ímpios, pois se afirma que eles ressuscitam para vergonha e horror eterno. Como eles poderiam sofrer tais coisas eternamente, a menos que permanecessem conscientes para sempre? Já se alegou que vergonha implica consciência; mas deve-se notar que não se diz que isso será eterno. O qualificativo é inserido no que diz respeito ao horror, emoção que os outros sentem em relação às partes culpadas, não tornando necessária a consciência daqueles contra quem é dirigido. Alguns leem a passagem desta forma: “Alguns para a vergonha e o horror eterno de seus companheiros”. E assim será. A vergonha por sua maldade e corrupção queimarão dentro da alma, enquanto tiverem existência consciente. E quando eles passarem, consumidos por suas iniquidades, seu caráter abominável e seus atos de culpa despertarão tão somente horror da parte de todos os justos, na mesma natureza e intensidade, enquanto os preservarem na lembrança. Portanto, o texto não fornece nenhuma prova do sofrimento eterno dos ímpios. DAP 246.2

VERSÍCULO 3. Os que forem sábios, pois, resplandecerão como o fulgor do firmamento; e os que a muitos conduzirem à justiça, como as estrelas, sempre e eternamente. DAP 246.3

A margem [da KJV] diz “professores” em vez de “sábios”. Aqueles que forem professores resplandecerão como o fulgor do firmamento, ou seja, aqueles que ensinarem a verdade e levarem outras pessoas a conhecer antes do tempo em que os acontecimentos registrados nos versículos anteriores se cumprirem. Como o mundo estima ganhos e perdas, há um preço para ser professor dessas coisas nos dias atuais. Custa reputação, tranquilidade, conforto e, muitas vezes, bens; envolve esforço, cruz, sacrifício, perda de amizades, ridículo e, não raro, perseguição. A pergunta que muitas vezes se faz é: como você se permite passar por isso? Como é possível você dar-se ao luxo de guardar o sábado e talvez perder a condição de vida, reduzir a renda ou até mesmo arriscar a sobrevivência? Ó pergunta cega, iludida e sórdida! Quanta falta de visão transformar a obediência àquilo que Deus requer em uma questão de análise financeira! Quão diferente da atitude dos nobres mártires, que não amaram a própria vida, antes se dispuseram a morrer! Não, o que não pode acontecer é nos darmos ao luxo de fazer o contrário. Quando Deus ordena, não podemos nos permitir desobedecer. E se nos perguntarem: como você pode dar-se ao luxo de guardar o sábado e cumprir outros deveres envolvidos na obediência à verdade? Só precisamos indagar de volta: como você pode dar-se ao luxo de não fazer isso? No dia vindouro, quando aqueles que buscaram salvar a própria vida a perderem, e aqueles que se mostraram dispostos a arriscar tudo em prol da verdade e de seu divino Senhor receberem a recompensa gloriosa prometida no texto e ressuscitarem para resplandecer como o firmamento e como as estrelas perenes para todo o sempre, nesse dia ficará bem claro quem foi sábio e quem, em contrapartida, escolheu a cegueira e a insensatez. Os ímpios e os mundanos desdenham os cristãos hoje como se fossem tolos e loucos. Congratulam-se por sua astúcia superior em ficar longe do que chamam de loucura, que só lhes traria perdas. Não precisamos nos preocupar em lhes dar satisfação, pois logo chegará o momento em que esses, em vão, ansiarão ardentemente reverter sua decisão. DAP 246.4

Enquanto isso, o cristão tem o privilégio de se alegrar no consolo dessa promessa maravilhosa. O conceito de sua magnitude pode ser apreendido somente ao se olhar para os mundos estelares. O que são essas estrelas, à semelhança das quais os instrutores da justiça brilharão para todo o sempre? Quanto brilho, majestade e número de dias estão envolvidos nessa comparação? DAP 247.1

O sol do nosso sistema solar é uma dessas estrelas. Se o compararmos ao globo onde vivemos (nosso padrão de medida mais próximo), descobrimos se tratar de uma esfera de grande magnitude e magnificência. Nossa Terra tem cerca de 13 mil quilômetros de diâmetro; já o diâmetro do sol é de quase 1 milhão e meio de quilômetros! Em tamanho, é 1 milhão e meio de vezes maior que nosso globo. Em termos de volume, seria equivalente a 352 mil mundos como o nosso. Que imensidão! DAP 247.2

Todavia, o Sol está longe de ser o maior ou o mais brilhante dos mundos que conduzem suas resplendentes carruagens em miríades através dos céus. Sua proximidade (a apenas cerca de 150 milhões de quilômetros distante de nós) faz com que nos agracie com sua presença e influência controladora. Mas bem distante, nas profundezas do espaço, onde parecem meros pontos de luz, reluzem outros astros de tamanho mais vasto e glória ainda maior. A estrela fixa mais próxima, Alpha Centauri, no hemisfério sul, está, segundo a precisão e a eficiência de instrumentos modernos, a 30 bilhões de quilômetros de distância; mas o sistema da estrela polar é quinze vezes mais remoto, ou seja, está a 458 bilhões de quilômetros e brilha com um resplendor equivalente ao de 86 sóis. Outras são ainda maiores, como por exemplo, a estrela Vega, que emite a luz de 344 sóis; Capella, de 430; Arturus, de 516; e assim por diante, até chegarmos, por fim, à grande estrela Alcyone, na constelação de Plêiades, que inunda o espaço celestial com um brilho 12 mil vezes maior que o do astro grandioso que ilumina e controla nosso sistema solar! Por que, então, ela não se apresenta mais brilhante para nós? Ah, sua distância equivale a 25 milhões de diâmetros da órbita terrestre, ao passo que a do Sol corresponde a 305 milhões de quilômetros. Os números são frágeis para expressar distâncias tão grandes. Basta dizer que seu clarão resplandecente deve atravessar o espaço na velocidade da luz, a 308 mil quilômetros por segundo, por um período de mais de 700 anos para poder alcançar este nosso mundo distante! DAP 247.3

Alguns desses monarcas dos céus reinam solitários, como nosso sol. Alguns são duplos; o que nos parece uma única estrela é formado por duas — dois sóis com seu séquito de planetas, girando em torno deles; outros são triplos; outros ainda, quádruplos; e pelo menos um é sêxtuplo. DAP 248.1

Além disso, mostram todas as cores do arco-íris. Alguns sistemas são brancos, outros azuis, alguns vermelhos, outros amarelos, outros ainda verdes. E isso significa dias de cores diferentes para os planetas desses sistemas. Castor dá dias verdes a seus planetas. A estrela polar dupla dá dias amarelos. Em alguns, os diferentes sóis pertencentes ao mesmo sistema têm cores diferentes. O Dr. Burr, na obra de sua autoria Ecce Coelum, p. 136, afirma: DAP 248.2

“E, para transformar o Cruzeiro do Sul no mais belo objeto de todo o céu, encontramos nessa constelação um grupo de mais de 100 sóis de cores variadas, vermelhos, verdes, azuis e verde-azulados, agrupados tão próximos uns dos outros que, em um telescópio poderoso, parecem um esplêndido buquê ou uma joia sofisticada.” DAP 248.3

E a idade desses gloriosos corpos celeste? Alguns anos se passam e todas as coisas terrenas revelam os traços da velhice e o odor da decadência. Quanto deste mundo já pereceu por completo! Mas as estrelas continuam a brilhar tanto quanto no início. Séculos e ciclos se passam, reinos surgem e vagarosamente acabam; remontamos ao horizonte mais turvo e sombrio da história e até mesmo ao primeiro momento introduzido pela revelação, quando a ordem foi invocada a partir do caos e as estrelas da manhã cantavam juntas, e os filhos de Deus aclamam em alegria — mesmo então as estrelas se encontravam em sua marcha ordenada e, por quanto tempo antes disso, não sabemos. Pois os astrônomos nos contam sobre nebulosas que ficam nas extremidades mais remotas da visão telescópica, cuja luz, em sua viagem incessante, demoraria 5 milhões de anos para alcançar este planeta. Como são antigos esses astros! Todavia, seu brilho não empalidece, nem sua força se reduz. O frescor da juventude ainda parece vivo nelas. Nenhum contorno desfigurado revela o domínio da decadência; nenhuma falha de movimento mostra a decrepitude da velhice. Dentre todas as coisas visíveis, são essas que mais se aproximam da natureza eterna do Ancião de dias. E sua glória ininterrupta consiste em uma profecia da eternidade. DAP 248.4

Assim resplenderão aqueles que conduzem muitos à justiça, em uma glória que leva alegria até mesmo ao coração do Redentor. E assim seus anos se passarão para todo o sempre. DAP 248.5

VERSÍCULO 4. Tu, porém, Daniel, encerra as palavras e sela o livro, até ao tempo do fim; muitos o esquadrinharão [correrão de uma parte para outra, ARC] e o saber se multiplicará. DAP 248.6

As “palavras” e o “livro” aqui mencionados são, sem dúvida, uma referência às coisas que Daniel recebeu como revelação nesta profecia. Elas deveriam ser encerradas e seladas até o tempo do fim; isto é, não receberiam estudo especial, nem seriam compreendidas em grande medida até esse período chegar. Conforme já demonstrado, o tempo do fim começou em 1798. Uma vez que o livro foi encerrado e selado até aquele tempo, a clara inferência é que, a partir de então, as pessoas teriam melhores condições de compreendê-lo e dariam atenção especial a essa parte da palavra inspirada. É desnecessário lembrar o leitor de tudo que foi feito no tema da profecia desde então. As profecias, sobretudo a de Daniel, têm sido examinadas por estudiosos da Palavra onde quer que a civilização espalhou sua luz na face da Terra. Assim, o restante do versículo, uma predição do que ocorreria após o tempo do fim começar, diz: “Muitos correrão de uma parte para outra, e a ciência se multiplicará” (ARC). Quer esse correr de uma parte para outra se refira à passagem das pessoas de um lugar para o outro e aos grandes avanços nos meios de transporte e viagem realizados no presente século, quer se refira, conforme alguns entendem, ao correr de uma parte para outra da profecia, isto é, à busca diligente e fervorosa da verdade profética, o cumprimento é claro e certo bem diante de nossos olhos. A aplicação deve ocorrer de uma dessas duas maneiras, e a era atual é fortemente marcada pelas duas direções. DAP 248.7

O mesmo se dá com a multiplicação do saber. Pode se referir ao aumento do conhecimento de modo geral, o desenvolvimento das artes e da ciência, ou ao aumento de conhecimento com referência às coisas reveladas a Daniel, as quais foram encerradas e seladas até o tempo do fim. Mais uma vez, não importa de que modo se faça a aplicação, o cumprimento é extremamente acentuado e completo. Olhe para as conquistas maravilhosas da mente humana e as obras argutas das mãos humanas, que se comparam aos sonhos mais audaciosos do mágico, as quais se realizaram ao longo dos últimos 100 anos. Afirmou-se recentemente na revista Scientific American que, dentro desse período, ocorreu maior avanço em todos os campos científicos e se fez mais progresso em tudo que diz respeito ao conforto doméstico, à agilidade dos negócios entre as pessoas, à transmissão de informação de uns para os outros e ao deslocamento rápido de um lugar para o outro, e até mesmo de um continente para o outro, do que tudo que se efetuou em conjunto ao longo dos 300 anos anteriores. DAP 250.1

Por meio de uma série de desenhos, o artista nos deu, nas gravuras a seguir, uma visão aérea de algumas das descobertas mais maravilhosas e das conquistas científicas e mecânicas mais surpreendentes da atualidade. Na parte esquerda superior da Ilustração I, temos: DAP 250.2

1. A colheitadeira que ata automaticamente fardos, representando um grande grupo de invenções que revolucionaram os processos agrícolas na memória de multidões hoje vivas. DAP 250.3

2. No escudo circular, a máquina que tira os caroços do algodão em sua primeira forma rudimentar, criada por Whitney, em 1793, elevando a cultura do algodão a uma das maiores indústrias do mundo. DAP 250.4

3. A máquina de costura, cuja importância no mundo industrial desde sua invenção por Elias Howe Jr., em 1846, dispensa recomendações. DAP 250.5

4. Um bonde elétrico, movimentado pelo sistema de trole, que representa as conquistas das descobertas elétricas, como a luz elétrica, energia elétrica, ilustrada pela grande usina de Niágara, etc. DAP 250.6

5. O fonógrafo, por meio do qual a fala humana pode ser preservada e transmitida por tempo indeterminado. DAP 250.7

6. A invenção da fotografia, com a qual todos estão familiarizados por meio de sua aplicação na arte das gravuras. DAP 252.1

7. Típicos das maravilhosas invenções nos equipamentos de impressão, alguns prelos aperfeiçoados produzem, com base em um rolo de papel, de 30 a 60 mil jornais por hora, impressos em ambos os lados, cortados, colados e dobrados prontos para ser entregues. DAP 252.2

8. Máquina de guerra para cerco e armas de batalha da atualidade. DAP 252.3

9. Amostras de monstruosos telescópios dos últimos 25 anos, que possibilitaram descobertas tão maravilhosas sobre os céus. DAP 252.4

10. O telefone, por meio do qual uma pessoa em Chicago pode conversar ouvindo a voz de outra em Nova York. DAP 252.5

11. A descoberta do petróleo, que revolucionou a iluminação doméstica e está tornando possível a existência de veículos sem cavalos para as estradas comuns. DAP 252.6

12. Uma cena de mineração sugerindo a britadeira e outras ferramentas modernas para escavar montanhas e explorar as profundezas ocultas da Terra. DAP 252.7

13. O veículo a vapor contra incêndios, uma das grandes proteções dos tempos modernos. DAP 252.8

14. A ponte do Brooklyn, mostrando os largos passos que foram dados nas habilidades da engenharia da atualidade. É provável que ela logo seja ultrapassada por uma estrutura semelhante e muito maior sobre o rio Hudson, ligando Nova York a Jersey City. DAP 252.9

15. O monumento de Washington, o maior monumento sólido do mundo (quase 170 metros de altura). DAP 252.10

16. A bicicleta, que operou uma revolução no deslocamento pessoal suburbano. Os fabricantes estimam que a produção em 1896, somente nos Estados Unidos, será de 750 mil unidades. Isso e os bondes elétricos estão diminuindo drasticamente a demanda por cavalos no mercado. DAP 252.11

17. Um telégrafo. Colocado em funcionamento pela primeira vez em 1844. Hoje existem milhares incontáveis de quilômetros de linhas telegráficas em funcionamento. DAP 252.12

18. Os magníficos navios de ferro transoceânicos do presente. Para transporte de passageiros e uso bélico, nunca se produziu nada comparável aos grandes navios a vapor da presente década. DAP 252.13

19. Transporte ferroviário. O expresso imperial na estação central de Nova York, o trem mais rápido do mundo, com uma velocidade média de mais de 95 quilômetros por hora. De acordo com a revista Scientific American de 30 de agosto de 1890, no dia 1º de janeiro do mesmo ano, havia, somente nos Estados Unidos, 258.235 quilômetros de trilhos. Foram investidos, nas estradas de ferro norte-americanas, US$ 9.680.942.240,00. Em 1889, 500 milhões de passageiros foram transportados, gerando uma receita bruta superior a 1 bilhão de dólares. DAP 252.14

Muitas outras coisas poderiam ser mencionadas, como as roupas submarinas para explorar as profundezas do mar, balões para explorar o espaço acima de nós, máquinas elétricas de fiar, anestesia para impedir a dor durante os procedimentos cirúrgicos, etc., etc. DAP 252.15

Que galáxias de maravilhas para se originarem em uma mesma era! Quão estupendas as conquistas científicas do presente, no qual todas essas descobertas e realizações concentram sua luz! De fato, olhando sob esse ponto de vista, chegamos à era da multiplicação do conhecimento. DAP 253.1

E para a honra do cristianismo, que recebam destaque as terras e aqueles que fizeram todas essas descobertas, as quais tanto acrescentam para a facilidade e o conforto da vida. É em terras cristãs, em meio a cristãos, desde a grande Reforma. O crédito desse progresso não se deve à Era das Trevas, que exibia apenas uma caricatura do cristianismo; nem aos pagãos, que, em sua ignorância, não conhecem a Deus; nem àqueles em terras cristãs que O negam. Aliás, é exatamente o espírito de igualdade e liberdade individual inculcado no evangelho de Cristo, quando pregado em sua pureza, que desalgema os membros humanos, tira as cadeias da mente e os convida ao uso mais elevado de seus poderes, tornando possível tal era de livre pensamento e ação, na qual tais maravilhas podem ser alcançadas. DAP 253.2

Victor Hugo comentou o seguinte acerca do caráter extraordinário da presente era: DAP 253.3

“Na ciência, operam-se todos os milagres; ela transforma algodão em salitre, vapor em cavalo, pilha voltaica em operário, corrente elétrica em carteiro e o sol em pintor. Ela se banha em águas subterrâneas, enquanto se aquece com seu fogo central; abre sobre os dois infinitos aquelas duas janelas — o telescópio sobre o que é infinitamente grande e o microscópio sobre o infinitamente pequeno; e encontra no primeiro abismo as estrelas do céu e, no segundo abismo, os insetos, que provam a existência de Deus. Aniquila o tempo, a distância e o sofrimento. Escreve uma carta de Paris para Londres e recebe a resposta de volta em dez minutos. Corta a perna de um homem — ele canta e sorri (Le Petit Napoleon [O Pequeno Napoleão]). DAP 253.4

Mas se adotarmos outro ponto de vista e entendermos que a multiplicação do conhecimento se refere ao aumento do conhecimento da Bíblia, só precisamos olhar para a luz maravilhosa que tem brilhado sobre as Escrituras ao longo dos últimos 60 anos. O cumprimento da profecia tem sido revelado à luz da história. O uso de um princípio melhor de interpretação tem levado a conclusões que mostram, de maneira indiscutível, que o fim de todas as coisas está próximo. De fato, o selo foi tirado do livro e o saber acerca do que Deus revelou em Sua Palavra tem aumentado de modo maravilhoso. Cremos que é nesse aspecto que a profecia se cumpre de forma mais especial; mas é somente em uma era como a presente, mesmo nesse sentido, que ela poderia se cumprir. DAP 253.5

Apocalipse 10:1-2 mostra que estamos no tempo do fim, no qual o livro desta profecia não mais permaneceria selado, mas seria aberto e compreendido. Nessa passagem, mostra-se um anjo poderoso descendo do Céu com um livrinho aberto na mão. Confira nos comentários sobre Apocalipse 10:2 as provas de que este livrinho, então aberto, entregue pelo anjo com sua mensagem a esta geração, é o mesmo livro aqui encerrado e selado. DAP 253.6

VERSÍCULO 5. Então, eu, Daniel, olhei, e eis que estavam em pé outros dois, um, de um lado do rio, o outro, do outro lado. 6. Um deles disse ao homem vestido de linho, que estava sobre as águas do rio: Quando se cumprirão estas maravilhas? 7. Ouvi o homem vestido de linho, que estava sobre as águas do rio, quando levantou a mão direita e a esquerda ao céu e jurou, por aquele que vive eternamente, que isso seria depois de um tempo, dois tempos e metade de um tempo. E, quando se acabar a destruição do poder do povo santo, estas coisas todas se cumprirão. DAP 253.7

Sem dúvida, a pergunta “Quando se cumprirão estas maravilhas?” se refere a tudo que foi mencionado anteriormente, incluindo o levantamento de Miguel, o tempo de angústia, o livramento do povo de Deus e a ressurreição especial e antecedente do versículo 2. E a resposta parece ser dada em duas partes: primeiro, um período profético específico é delimitado; segundo, segue-se um período indefinido antes que se chegue à conclusão de todas as coisas, assim como encontramos em Daniel 8:13-14. Quando se perguntou “Até quando durará a visão […] na qual é entregue o santuário e o exército, a fim de serem pisados?”, a resposta mencionou um período definido de 2.300 dias e depois um período indefinido de purificação do santuário. De igual modo, no texto agora em análise, é-nos dado um período de um tempo, dois tempos e metade de um tempo, ou 1.260 anos, e então um período indefinido para a continuação da destruição do poder do povo santo, antes da consumação. DAP 254.1

Oséias 1.260 anos marcam o período da supremacia papal. Por que ele é introduzido aqui? Provavelmente porque esse é o poder que fez mais do que qualquer outro na história do mundo para a destruição do poder do povo santo, ou seja, a opressão da igreja de Deus. Mas como entender a expressão “quando se acabar a destruição do poder do povo santo”, ou, conforme a KJV, “quando ele acabar de dispersar o poder do povo santo”? Uma tradução literal da Septuaginta parece apresentar a situação com maior clareza: “Quando ele tiver terminado de dispersar o poder do povo santo”. A quem o pronome ele se refere? De acordo com as palavras desta passagem, o antecedente seria, à primeira vista, “aquele que vive eternamente”, ou Jeová, mas, conforme observa judiciosamente um proeminente comentarista das profecias, a análise dos pronomes da Bíblia deve ser feita de acordo com os fatos em questão. Assim, com frequência, devemos relacioná-los a um antecedente subentendido, em vez de a algum substantivo que se encontre expresso. Nesta passagem, o chifre pequeno, ou o homem da iniquidade, foi introduzido por meio da menção específica do tempo de sua supremacia, a saber, 1.260 anos, podendo ser o poder ao qual o pronome ele se refere. Ao longo de 1.260 anos, ele oprimiu atrozmente a igreja, ou destruiu, ou dispersou, seu poder. Depois que a supremacia lhe foi tirada, sua atitude em relação à verdade e seus defensores permanece a mesma, e seu poder ainda se pode sentir até certo ponto. Assim, ele continua a obra de opressão na medida em que é capaz — até quando? Até o último dos acontecimentos destacados no versículo 1, o livramento do povo de Deus, de todos aqueles cujo nome se encontra escrito no livro. Após o livramento, as forças perseguidoras não conseguem mais oprimi-lo. Seu poder não é mais destruído. Chega-se ao fim das maravilhas que esta grande profecia revela. E todas as suas predições se cumprem. DAP 254.2

Ou podemos, sem alterar o sentido de maneira significativa, afirmar que o pronome ele se refere ao Ser mencionado no juramento do versículo 7, “Aquele que vive eternamente”, isto é, Deus, uma vez que Ele lança mão de poderes terrenos para corrigir e disciplinar Seu povo, e, nesse sentido, pode-se afirmar que Ele próprio destruiu o poder do Seu povo. Por meio de Seu profeta, Deus disse a respeito do reino de Israel, “Ruína! Ruína! A ruínas a reduzirei, e ela [a coroa] já não será, até que venha aquele a quem ela pertence de direito” (Ezequiel 21:27). E mais uma vez: “Até que os tempos dos gentios se completem, Jerusalém será pisada por eles” (Lucas 21:24). Igualmente relevante é a profecia de Daniel 8:13: “Até quando durará a visão […] na qual é entregue o santuário e o exército, a fim de serem pisados?” Quem lhes dá essa condição? Deus. Por quê? Para disciplinar; para “purificar e embranquecer” Seu povo (cf. Daniel 12:10). Por quanto tempo? Até o santuário ser purificado. DAP 254.3

VERSÍCULO 8. Eu ouvi, porém não entendi; então, eu disse: meu senhor, qual será o fim destas coisas? 9. Ele respondeu: Vai, Daniel, porque estas palavras estão encerradas e seladas até ao tempo do fim. 10. Muitos serão purificados, embranquecidos e provados; mas os perversos procederão perversamente, e nenhum deles entenderá, mas os sábios entenderão. DAP 255.1

A solicitude de Daniel em compreender plenamente aquilo que lhe fora mostrado inevitavelmente nos faz lembrar das palavras de Pedro ao falar sobre os profetas estudando e buscando com diligência entender as predições acerca dos sofrimentos de Cristo e da glória que se seguiria; e também do fato de que não ministravam para si mesmos, mas, sim, para nós. Quão pouco alguns dos profetas puderam entender aquilo que escreveram! Nem por isso eles se recusaram a escrever. Se Deus mandou, eles sabiam que, no tempo apropriado, Ele providenciaria para que as pessoas extraíssem daqueles escritos todo o benefício que havia planejado. Por isso, as palavras aqui dirigidas a Daniel tinham o propósito de lhe dizer que, quando chegasse o tempo certo, os sábios compreenderiam o significado daquilo que ele havia escrito e tirariam proveito de sua mensagem. O tempo do fim é a época em que o Espírito de Deus tiraria o selo deste livro. Logo, é nesse tempo que os sábios devem entender, ao passo que os perversos, alheios a qualquer noção de valor das verdades eternas, com o coração calejado e endurecido pelo pecado, ficariam cada vez mais ímpios e cegos. Nenhum dos perversos entende. O esforço que os sábios dedicam à compreensão é chamado por eles de loucura e presunção, enquanto fazem a pergunta mordaz: “Onde está a promessa da Sua vinda?”. E caso se pergunte: “Sobre qual tempo e geração falou este profeta?”, a resposta solene será: “Do tempo presente e da geração atual”. As palavras do profeta têm encontrado agora seu mais notório cumprimento. DAP 255.2

À primeira vista, a fraseologia do versículo 10 parece um tanto quanto peculiar: “Muitos serão purificados, embranquecidos e provados”. É possível se perguntar: como eles podem ser embranquecidos e então provados (como a ordem das palavras parece sugerir), quando é pela provação que eles são purificados e embranquecidos? Resposta: sem dúvida, a linguagem descreve um processo que é repetido muitas vezes na experiência daqueles que, durante esse período, estão se preparando para a vinda e o reino do Senhor. Eles são purificados e embranquecidos até certo ponto, em comparação com a condição anterior. Então eles serão provados de novo. Provas maiores lhes sobrevirão. Caso as suportem, a obra de purificação será levada adiante em proporção ainda maior — o processo de embranquecimento alcança um estado ainda maior. E quando essa condição é alcançada, eles são provados novamente, resultando em um ser ainda mais purificado e embranquecido. Dessa maneira, o processo prossegue até desenvolverem um caráter capaz de suportar o dia da grande prova e alcançarem uma condição espiritual que não requeira mais provas. DAP 255.3

VERSÍCULO 11. Depois do tempo em que o sacrifício diário for tirado, e posta a abominação desoladora, haverá ainda mil duzentos e noventa dias. DAP 256.1

Este versículo introduz um novo período profético, a saber, 1.290 dias proféticos, que denotam o mesmo número de anos literais. Com base na leitura do texto, alguns inferem (embora a inferência não seja necessariamente a correta) que esse período começa com o estabelecimento da abominação desoladora, ou seja, o poder papal, em 538, estendendo-se, consequentemente, até 1828. Mas embora nada encontremos nesse ano para marcar o término, encontramos evidências na margem [da KJV] de que o período começa antes do estabelecimento da abominação papal. A margem diz: “Para pôr a abominação”, etc. Com essa leitura, o texto ficaria da seguinte maneira: “Depois do tempo em que o sacrifício diário for tirado, para pôr [ou a fim de pôr] a abominação desoladora, haverá ainda mil duzentos e noventa dias”. Já foi demonstrado que o diário não se refere ao sacrifício diário dos judeus, mas, sim, à abominação diária ou contínua, isto é, o paganismo (ver os comentários sobre Daniel 8:13). Este precisava ser retirado a fim de abrir caminho para o papado. Leia os comentários sobre Daniel 11:31, que apresentam os acontecimentos históricos que mostram como isso se cumpriu em 508. Não nos é informado a que eventos esses 1.290 dias levam diretamente. Todavia, uma vez que seu início é marcado por uma obra que ocorre a fim de preparar o caminho para o estabelecimento do papado, é natural concluir que seu fim seria marcado pelo término da supremacia papal. Assim, subtraindo 1.290 de 1798, retrocedemos até o ano 508, no qual se mostrou que o paganismo foi retirado, 30 anos antes do estabelecimento do papado. Sem dúvida, esse período é mencionado para mostrar a data em que o diário foi retirado, e é o único que faz isso. Logo, os dois períodos, os 1.290 e os 1.260 dias, terminam juntos em 1798, um começando em 538 e o outro, em 508, 30 anos antes. DAP 256.2

VERSÍCULO 12. Bem-aventurado o que espera e chega até mil trezentos e trinta e cinco dias. 13. Tu, porém, segue o teu caminho até ao fim; pois descansarás e, ao fim dos dias, te levantarás para receber a tua herança. DAP 256.3

Mais um período profético é apresentado aqui, dessa vez denotando 1.335 anos. O testemunho acerca desse período, assim como o referente aos 1.290 anos, é muito escasso. É possível dizer quando esse período começa e termina? A única pista que temos para resolver essa questão é o fato de ser mencionado em conexão imediata com os 1.290 anos, o qual começou, conforme demonstrado acima, em 508. A partir desse momento haveria, conta o profeta, 1.290 dias. E a frase seguinte diz: “Bem-aventurado o que espera e chega até mil trezentos e trinta e cinco dias”. A partir de que ponto? Sem dúvida do mesmo, isto é, a partir do início dos 1.290 dias, a saber, o ano 508. A menos que esse último período seja contado a partir desse ponto, é impossível defini-lo, e deveríamos retirá-lo da profecia de Daniel quando aplicamos a ela as palavras de Cristo: “quem lê entenda” (Mateus 24:15). A partir desse ponto, o período se estenderia até 1843; pois se adicionarmos 1.335 a 508, chegamos a 1843. Começando na primavera da primeira data, chegamos à primavera da segunda. DAP 256.4

Mas como eles poderiam ter terminado, é possível perguntar, se, ao fim desses dias, Daniel se levantaria para receber sua herança, que alguns supõem ser a ressurreição do profeta dentre os mortos? Essa pergunta se baseia na incompreensão de dois aspectos: primeiro, que os dias ao fim dos quais Daniel receberia sua herança são os 1.335 dias; segundo, que Daniel se levantar para receber a herança é sua ressurreição, ideia que também não pode se sustentar. A única coisa prometida ao fim dos 1.335 dias é uma bênção para aqueles que esperam e chegam a esse tempo, isto é, os que estiverem vivos nessa época. Qual é a bênção? Olhando para 1843, ano no qual o período expirou, o que enxergamos? Vemos o cumprimento notável da profecia na grande proclamação da segunda vinda de Cristo. Quarenta e cinco anos antes disso, o tempo do fim começara, o livro perdera o selo e a luz começou a aumentar. Por volta de 1843, houve o grande auge de toda a luz que fora lançada sobre as questões proféticas até então. A proclamação avançou com poder. A nova e contagiante doutrina abalou o mundo. Nova vida foi comunicada aos verdadeiros seguidores de Cristo. Os descrentes foram condenados, as igrejas foram provadas e se despertou um espírito de reavivamento que, pelo menos nos tempos modernos, não encontra paralelos. DAP 257.1

Que bênção é essa? Ouça as palavras do Salvador: “Bem-aventurados, porém, os vossos olhos”, disse Ele aos discípulos, “porque veem; e os vossos ouvidos, porque ouvem” (Mateus 13:16). Em outra ocasião, Ele disse a Seus seguidores que profetas e reis haviam desejado ver as coisas que eles contemplavam, mas não puderam. Disse-lhes, porém: “Bem-aventurados os olhos que veem as coisas que vós vedes” (Lucas 10:23-24). Se uma verdade nova e gloriosa era uma bênção nos dias de Cristo, uma bênção para aqueles que a recebiam, por que não seria, de igual modo, em 1843? DAP 257.2

É possível objetar que os participantes desse movimento foram desapontados em suas expectativas. Os discípulos de Cristo, em Seu primeiro advento, também foram, na mesma intensidade. Eles O aclamaram enquanto Jesus entrava em Jerusalém, na expectativa de que Ele logo tomaria o reino; mas o único trono para o qual Se dirigiu foi a cruz; e, em vez de ser enaltecido como rei em um palácio, Seu corpo sem vida foi colocado no sepulcro novo de José. No entanto, eles foram “bem-aventurados” por receberem as verdades que ouviram. DAP 257.3

É possível alegar ainda que essa não foi uma bênção suficiente para ser marcada por um período profético. Por que não, já que a época em que ocorreria, a saber, o tempo do fim, é introduzida por um período profético? Já que nosso Senhor, no versículo 14 de Sua grande profecia de Mateus 24, faz um anúncio especial desse movimento? E já que é destacado mais uma vez em Apocalipse 14:6-7, por meio do símbolo de um anjo voando pelo meio do céu com a mensagem especial do evangelho eterno para todos os habitantes da Terra? Sem dúvida, a Bíblia confere grande proeminência a esse movimento. DAP 257.4

Mais duas perguntas precisam ser abordadas brevemente: 1) a que dias o versículo 13 faz referência? 2) O que significa Daniel se levantar para receber sua herança? Aqueles que afirmam que os dias se referem aos 1.335 dias são conduzidos a essa aplicação por olharem somente para o versículo anterior, no qual eles são apresentados, ao passo que, para encontrar a aplicação desses dias introduzidos de maneira tão indefinida, seria importante levar em consideração todo o escopo da profecia desde o capítulo 8. Os capítulos 9, 10, 11 e 12 consistem em uma clara continuação e explicação da visão do capítulo 8; logo, podemos dizer que, na visão do capítulo 8, em seu desenrolar e em sua explicação, existem quatro períodos proféticos, a saber, os 2.300, 1.260, 1.290 e 1335 dias. O primeiro é o período principal e também o mais longo. Os outros não passam de partes intermediárias e subdivisões do período maior. Quando o anjo diz a Daniel, ao concluir suas instruções, que ele se levantaria para receber sua herança ao fim dos dias, sem especificar a qual período estava se referindo, a mente de Daniel não se voltaria naturalmente para o período principal e mais longo, as 2.300 tardes e manhãs, em vez de pensar em qualquer uma de suas subdivisões? Se assim for, as 2.300 tardes e manhãs são os dias pretendidos. A leitura da Septuaginta parece muito clara nessa direção: “Mas segue teu caminho e descansa, pois há ainda muitos dias e muitas estações até o pleno cumprimento [destas coisas]; e tu receberás tua porção ao fim dos dias”. Sem dúvida, tais palavras transportam a mente de volta para o longo período contido na primeira visão, em relação ao qual as instruções posteriores foram dadas. DAP 258.1

As 2.300 tardes e manhãs, conforme já demonstrado, terminaram em 1844 e nos trouxeram até a purificação do santuário. Como Daniel, naquela ocasião, recebeu sua herança? Resposta: na pessoa de seu Advogado, nosso grande sumo sacerdote, que apresenta o caso dos justos diante de Seu Pai para que sejam aceitos. A palavra aqui traduzida por herança não se refere a um bem físico, uma propriedade,10 mas à “decisão do destino” ou às “determinações da Providência”. Ao fim dos dias, a sorte, por assim dizer, seria lançada. Em outras palavras, chegar-se-ia a uma resolução em relação àqueles que deveriam ser considerados dignos da posse da herança celeste. E quando o caso de Daniel viesse à tona para ser examinado, ele seria considerado justo, ou seja, “estaria na sua sorte” (cf. Daniel 12:13, ARC), ou “subsistiria na sua sorte” [KJV] e teria um lugar designado na Canaã celestial. Não se refere o salmista a esse mesmo tempo e evento quando diz: “Pelo que os ímpios não subsistirão no juízo” (Salmos 1:5, ARC)? DAP 258.2

Quando Israel estava prestes a entrar na terra prometida, lançaram-se sortes e a herança de cada tribo foi determinada. Assim cada uma das tribos recebeu sua “herança” muito antes de entrar, de fato, na posse da terra. O período da purificação do santuário corresponde a essa época da história de Israel. Encontramo-nos agora na fronteira com a Canaã celestial, e estão sendo tomadas as decisões que designam a alguns um lugar no reino eterno e excluem outros dele para sempre. Na decisão do caso de Daniel, sua porção na herança celeste está garantida. Junto com ele, todos os fiéis também permanecerão. E quando esse dedicado servo de Deus, que preencheu sua longa vida com os mais nobres atos de serviço por seu Criador, muito embora sobrecarregado pelas mais pesadas preocupações desta vida, desfrutar sua herança em recompensa por ter feito o bem, nós também poderemos entrar com ele no descanso. DAP 258.3

Chegamos ao fim da análise desta profecia, com o comentário de que nos trouxe grande satisfação ter passado tempo estudando sua mensagem maravilhosa e meditando no caráter deste homem tão amado e ilustríssimo profeta. Deus não faz acepção de pessoas; e a reprodução do caráter de Daniel garantirá ainda hoje, da parte do Senhor e de forma igualmente marcante, o mesmo favor dispensado naquela época. Que imitemos suas virtudes para que, assim como ele, recebamos a aprovação de Deus, enquanto nos encontramos aqui, e habitemos em meio às criações de Sua glória infinita no longo porvir. DAP 259.1