Mensagens Escolhidas 1

7/230

Capítulo 2 — Ellen G. White e seus escritos

Uma carta ao Dr. Paulson

Santa Helena, Califórnia

14 de Junho de 1906

Prezado Irmão:

Recebi sua carta enquanto me achava no sul da Califórnia. A consideração dos negócios relacionados com o desenvolvimento da obra de nosso hospital aí, e o escrever as visões que me foram dadas relativamente ao terremoto e suas lições, tomaram-me o tempo e as energias. ME1 24.1

Agora, porém, preciso responder às cartas recebidas de vós e de outros. Falais em vossa carta de vossa primeira educação de molde a ter fé implícita nos testemunhos, e dizeis: “Fui levado a concluir e a crer mui firmemente que toda palavra que já proferistes em público ou em particular, que toda carta que escrevesses sob quaisquer e todas as circunstâncias, eram tão inspiradas como os Dez Mandamentos.” ME1 24.2

Meu irmão, tendes estudado diligentemente meus escritos, e nunca encontrastes quaisquer reivindicações dessas de minha parte, nem achareis que os pioneiros de nossa causa as fizessem. ME1 24.3

Em minha introdução ao Conflito dos Séculos, lestes sem dúvida minha declaração quanto aos Dez Mandamentos e a Bíblia, a qual vos deveria haver ajudado à correta compreensão do assunto em consideração. Eis a declaração: ME1 24.4

“A Bíblia aponta a Deus como seu autor; no entanto, foi escrita por mãos humanas, e no variado estilo de seus diferentes livros apresenta as características dos diversos escritores. As verdades reveladas são todas dadas por inspiração de Deus (2 Timóteo 3:16); acham-se, contudo, expressas em palavras de homens. O Ser infinito, por meio de Seu Santo Espírito derramou luz na mente e no coração de Seus servos. Deu sonhos e visões, símbolos e figuras; e aqueles a quem a verdade foi assim revelada, corporificaram, eles próprios, o pensamento em linguagem humana. ME1 25.1

“Os Dez Mandamentos foram proferidos pelo próprio Deus, e escritos por Sua própria mão. São de composição divina e não humana. Mas a Bíblia, com suas verdades dadas por Deus expressas na linguagem dos homens, apresenta uma união do divino com o humano. Tal união existia na natureza de Cristo, que era o Filho de Deus e o Filho do homem. Assim, é verdade quanto à Bíblia, como acerca de Cristo, que ‘o Verbo Se fez carne, e habitou entre nós’. João 1:14. ME1 25.2

“Escritos em diferentes séculos, por homens que diferiam largamente em posições e em ocupação, bem como nos dotes mentais e espirituais, os livros da Bíblia apresentam vasto contraste no estilo, assim como diversidade quanto à natureza dos assuntos desenvolvidos. Formas diferentes de expressão foram empregadas pelos vários escritores; muitas vezes a mesma verdade é apresentada de maneira mais impressionante por um que por outro. E ao apresentarem vários escritores um assunto sob diversos aspectos e relações, poderá talvez parecer ao leitor superficial, descuidoso ou possuído de preconceitos, ser discrepância ou contradição, aquilo em que o estudioso refletido, reverente, de mais clara visão, discerne o fundamento harmônico. ME1 25.3

“Ao ser apresentada por diferentes pessoas, a verdade é exposta em seus vários aspectos. Um escritor é mais fortemente impressionado com uma faceta do assunto; ele apanha os pontos que se harmonizam com sua experiência ou com sua capacidade de percepção e apreciação; outro apodera-se de um aspecto diverso; e cada um, sob a guia do Espírito Santo, apresenta o que é mais fortemente impresso em sua mente — um diverso ângulo da verdade em cada um, mas uma harmonia perfeita por meio de todos. E as verdades assim reveladas unem-se para formar o todo perfeito, adaptado à satisfação das necessidades dos homens em todas as circunstâncias e experiências da vida. ME1 25.4

“Deus foi servido de comunicar Sua verdade ao mundo mediante instrumentos humanos, e Ele próprio, por Seu Santo Espírito, habilitou e autorizou homens a fazerem Sua obra. Ele guiou a mente na escolha do que dizer e do que escrever. O tesouro foi confiado a vasos de barro, todavia não é por isso menos do Céu. O testemunho é transmitido mediante a imperfeita expressão da linguagem humana, e não obstante é o testemunho de Deus; e o obediente, crente filho de Deus nele contempla a glória do poder divino, cheio de graça e de verdade.” ME1 26.1

A integridade dos Testemunhos

Acham-se em perfeita harmonia com isto minhas declarações encontradas no artigo “Os Testemunhos Menosprezados”, escrito a 20 de Junho de 1882, publicado em Testemunhos para a Igreja 5:62-84. Cito daí vários parágrafos para vossa consideração: ME1 26.2

“Muitos estão atentando complacentemente para os longos anos durante os quais têm advogado a verdade. Sentem achar-se agora com direito a uma recompensa por suas passadas provações e obediência. Esta genuína experiência nas coisas de Deus, no passado, porém, torna-os mais culpados diante dEle por não conservarem sua integridade e não avançarem rumo à perfeição. A fidelidade dos anos passados jamais expiará a negligência do ano atual. A fidelidade de um homem ontem não lhe expiará a falsidade de hoje. ME1 26.3

“Muitos desculparam seu menosprezo dos testemunhos, dizendo: ‘A irmã White é influenciada por seu marido; os testemunhos são moldados pelo espírito e o juízo dele.’ Outros estavam à procura de obter de mim algo que eles pudessem interpretar de modo a justificar sua conduta ou conseguir influência. Foi então que decidi que não sairia mais coisa alguma de minha pena enquanto o poder convertedor de Deus não se manifestasse na Igreja. Mas o Senhor pôs em minha alma a responsabilidade. Trabalhei por vós fervorosamente. Quanto custou isso tanto a meu marido como a mim, di-lo-á a eternidade. Não tenho eu conhecimento do estado da Igreja, quando o Senhor me tem repetidamente apresentado seus casos durante anos? Repetidas advertências têm sido dadas, no entanto não tem havido nenhuma decidida mudança... ME1 26.4

“Não obstante, quando vos mando um testemunho de advertência e reprovação muitos de vós declarais ser simplesmente a opinião da irmã White. Tendes assim insultado o Espírito de Deus. Sabeis como o Senhor Se tem manifestado por meio do Espírito de Profecia. O passado, o presente e o futuro têm passado perante mim. Têm-se-me mostrado rostos que nunca vira, e anos depois os reconheci ao vê-los. Tenho-me despertado do sono com um vivo sentimento de assuntos anteriormente apresentados a meu espírito, e escrito, à meia-noite, cartas que atravessaram o continente e, chegando em uma crise, pouparam à causa de Deus grande revés. Essa tem sido minha obra por muitos anos. Um poder tem-me impelido a reprovar e censurar erros em que eu não pensara. É esta obra, dos últimos trinta e seis anos, de cima ou de baixo? ... ME1 27.1

“Quando fui ao Colorado me achava tão preocupada por vós que, em minha fraqueza, escrevi muitas páginas para serem lidas na reunião campal . Fraca e tremente, ergui-me às três horas da madrugada para vos escrever. Deus falava por intermédio da argila. Poderíeis dizer que esta comunicação era apenas uma carta. Sim, era uma carta, mas sugerida pelo Espírito de Deus, para trazer perante vosso espírito coisas que me haviam sido mostradas. Nessas cartas que escrevi, nos testemunhos de que sou portadora, apresento-vos aquilo que o Senhor me tem apresentado a mim. Não escrevo nem um artigo expressando meramente minhas próprias idéias. Eles são o que Deus me expôs em visão — os preciosos raios de luz que brilham do trono. ... ME1 27.2

“Que voz reconhecereis como sendo a voz de Deus? Que poder tem o Senhor em reserva para corrigir vossos erros e mostrar-vos a direção que seguis tal como é? Que poder para operar na Igreja? Se vos recusais a crer enquanto não for removida toda sombra de incerteza e toda possibilidade de dúvida, jamais crereis. A dúvida que requer perfeito conhecimento jamais cederá à fé. A fé repousa na evidência, não na demonstração. O Senhor requer que obedeçamos à voz do dever, quando há outras vozes em torno de nós estimulando-nos a seguir uma direção oposta. Demanda sincera atenção de nossa parte distinguir a voz que provém de Deus. Precisamos resistir à inclinação e vencê-la, e obedecer à voz da consciência sem discutir nem transigir, para que suas inspirações não cessem, e sejamos dominados pela inclinação e o impulso. ME1 27.3

“A palavra do Senhor vem a todos nós que não resistimos a Seu Espírito mediante determinação de não ouvir nem obedecer. Esta voz é ouvida em advertências, em conselhos, em reprovações. É a mensagem de luz do Senhor a Seu povo. Se esperarmos por mais altos chamados ou melhores oportunidades, a luz poderá ser retirada, e nós deixados em trevas. ... ME1 28.1

“Dói-me dizer, meus irmãos, que vossa pecaminosa negligência de andar na luz vos tem circundado de trevas. Talvez sejais agora sinceros em não reconhecer e obedecer à luz; as dúvidas que tendes entretido, vossa negligência em dar ouvidos às reivindicações de Deus, têm-vos cegado a percepção, de maneira que a treva é agora para nós luz, e a luz é treva. Deus vos tem ordenado que vades avante à perfeição. O cristianismo é uma religião de progresso. A luz de Deus é plena e ampla, aguardando nosso pedido. Sejam quais forem as bênçãos que o Senhor dê, Ele possui ainda infinita provisão, inesgotável reserva, da qual podemos sacar. O ceticismo poderá tratar as sagradas reivindicações do evangelho com gracejos, zombarias e negações. O espírito de mundanismo pode contaminar a muitos e dominar a poucos; a causa de Deus só pode manter o terreno mediante grande esforço e contínuo sacrifício; todavia ela triunfará afinal. ME1 28.2

“A palavra é: Avante; desempenhai-vos de vosso dever individual, e deixai todas as conseqüências nas mãos de Deus. Caso avancemos segundo a direção de Jesus, veremos Seu triunfo, partilharemos de Sua glória. Precisamos partilhar os conflitos se havemos de cingir a coroa da vitória. Como Jesus, precisamos ser aperfeiçoados mediante o sofrimento. Houvesse a vida de Cristo sido uma vida cômoda, poderíamos com segurança entregar-nos à indolência. Uma vez que Sua vida foi assinalada por contínua abnegação, sofrimento e sacrifício, não nos queixaremos se com Ele os partilharmos. Podemos andar com segurança na mais escura senda, caso tenhamos a Luz do mundo por nosso guia. ... ME1 28.3

“Quando o Senhor me apresentou pela última vez o vosso caso, e deu-me a conhecer que não havíeis atendido à luz que vos fora dada, foi-me mandado falar-vos claramente em Seu nome, pois Sua ira se acendera contra vós. Estas palavras me foram ditas: ‘Tua obra te é indicada por Deus. Muitos não te darão ouvidos, pois se recusaram a ouvir ao grande Mestre; muitos não são corrigidos, pois seus caminhos são retos a seus próprios olhos. Todavia leva-lhes as reprovações e advertências que te darei, quer as ouçam quer deixem de ouvir.’” ME1 29.1

Em ligação com essas citações, estudai outra vez o artigo “A Natureza e Influência dos Testemunhos”, em Testemunhos para a Igreja 5:654-691. ME1 29.2

A declaração que citais do Testemunho 3 [Testemunhos para a Igreja 5:67] é correta: “Nestas cartas que escrevo, nos testemunhos que dou, estou vos apresentando aquilo que o Senhor me tem apresentado. Não escrevo nenhum artigo, expressando meramente minhas próprias idéias. Eles são o que Deus me tem exposto em visão — os preciosos raios de luz brilhando do trono.” Isto é verdade quanto aos artigos de nossas revistas e aos muitos volumes de meus livros. Tenho sido instruída em harmonia com a Palavra nos preceitos da lei de Deus. Tenho sido instruída em escolher das lições de Cristo. Não são as atitudes tomadas em meus escritos em harmonia com os ensinos de Jesus Cristo? ME1 29.3

Perigo de conceitos enganadores

A algumas das perguntas que me fizestes, não devo responder Sim ou Não. Não devo fazer declarações que possam ser mal interpretadas. Vejo e sinto o perigo dos que, fui instruída, estão pondo em risco sua alma por vezes ouvindo enganadores conceitos relativamente às mensagens que Deus me tem dado. Mediante muito torcer, muitas interpretações e falsos raciocínios quanto ao que escrevi, procuram reivindicar sua incredulidade pessoal. Sinto por meus irmãos que têm estado a andar na cerração da suspeita e do ceticismo e falso raciocínio. Sei que alguns deles seriam abençoados por mensagens de conselhos se as nuvens que lhes obscurecem a visão espiritual pudessem ser repelidas, e eles vissem direito. Eles, porém, não vêem claramente. Portanto, não ouso comunicar-me com eles. Quando o Espírito de Deus dissipar o misticismo, achar-se-á justamente tão completo conforto e fé e esperança nas mensagens que fui instruída a dar, como nelas foram encontrados em anos passados. ME1 29.4

A verdade há de seguramente ganhar a vitória. Aquele que deu a vida para resgatar o homem dos enganos de Satanás, não dorme; vela. Quando Suas ovelhas voltarem de seguir a voz do estranho, de quem não são ovelhas, regozijar-se-ão na voz que eles gostavam de seguir. ME1 30.1

Podemos aprender lições preciosas do estudo da vida de Cristo. Os invejosos fariseus interpretavam mal os atos e as palavras de Cristo, que, caso fossem devidamente recebidos, haveriam sido benéficos a sua compreensão espiritual. Em vez de Lhe admirarem a bondade, acusavam-no, em presença de Seus discípulos, impiamente — “por que come o vosso Mestre com os publicamos e pecadores?” Mateus 9:11. Em vez de se dirigirem a nosso bendito Salvador mesmo, cuja resposta os haveria convencido imediatamente de sua malícia, falavam com os discípulos, e faziam suas acusações onde, qual fermento do mal, ocasionariam grande dano. Houvesse Cristo sido um ímpio, perderia o domínio no coração de Seus confiantes seguidores. Devido, porém, à confiança que tinham nEle, os discípulos não davam ouvidos às insinuações dos maliciosos acusadores. ME1 30.2

Desejando levar censura aos discípulos, esses acusadores maldosos iam repetidamente a Cristo com a pergunta: Por que fazem Teus discípulos aquilo que não é lícito fazer? E quando julgavam que nosso Senhor havia transgredido, falavam, não com Ele mesmo, mas com os discípulos, de modo a plantarem as sementes da incredulidade no coração de Seus seguidores. ME1 30.3

Assim trabalhavam eles para introduzir dúvidas e dissensão. Era tentado todo método para levar a dúvida ao coração do pequeno rebanho, no intuito de fazer com que eles estivessem atentos a qualquer coisa que neutralizasse a boa e benigna obra do evangelho de Jesus Cristo. ME1 31.1

Trabalho dessa mesma espécie será trazido a exercer influência sobre os verdadeiros crentes hoje. O Senhor Jesus lê o coração; discerne os interesses e os desígnios dos pensamentos de todos os homens quanto a Ele e a Seus crentes discípulos. Responde-lhes aos pensamentos referentes aos críticos: “Não necessitam de médico os sãos, mas sim os doentes.” Mateus 9:12. Os insolentes fariseus tinham exaltada idéia da própria piedade e santidade, ao passo que eram prontos a censurar a vida dos outros. — Carta 206, 1906. ME1 31.2