Testemunhos para a Igreja 4

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Capítulo 15 — Os doze espias

O Senhor ordenou que Moisés enviasse homens a fim de espiarem a terra de Canaã, que Ele daria aos filhos de Israel. Um líder de cada tribo devia ser selecionado para esse propósito. Eles foram; e após quarenta dias retornaram de sua busca e se apresentaram perante Moisés, Arão e toda a congregação de Israel, mostrando-lhes os frutos da terra. Todos concordaram que era uma boa terra, e exibiram os ricos frutos que haviam trazido como evidência. Um cacho de uvas era tão grande que dois homens o carregavam sobre uma vara. Também trouxeram figos e romãs, que cresciam ali em abundância. Depois de haverem eles falado da fertilidade da terra, todos, com exceção de dois, mostraram-se desencorajados quanto a sua possibilidade de possuí-la. Disseram que os habitantes do lugar eram muito fortes; e que as cidades eram cercadas por grandes e elevados muros, e mais do que tudo, viram os filhos do gigante Anaque ali. Então descreveram como as pessoas se situavam ao redor de Canaã, e expressaram temor de que seria impossível um dia possuírem aquela terra. Quando o povo ouviu tal relatório, deu expansão ao seu desapontamento em amargas recriminações e queixas. Não se detiveram para refletir e raciocinar que Deus, que os havia conduzido até ali, certamente lhes daria a terra. Deixaram a Deus fora de questão. Agiram como se para tomar a cidade de Jericó, a porta para a terra de Canaã, devessem depender somente do poder das armas. Deus havia declarado que lhes daria a terra, e deviam ter plena confiança que Ele cumpriria Sua palavra. Mas seu coração insubmisso não estava em harmonia com Seus planos. Não refletiram sobre quão maravilhosamente Ele havia atuado em seu favor, trazendo-os para fora da escravidão egípcia, abrindo-lhes um caminho através das águas do mar e destruindo os exércitos perseguidores de Faraó. Em sua descrença estavam limitando a obra de Deus e desconfiando da mão que até ali os guiara com segurança. Neste caso, repetiram seu erro anterior de murmurar contra Moisés e Arão. “Este, pois, é o fim de todas as nossas elevadas esperanças”, diziam. “Esta é a terra para cuja posse viajamos todo o caminho desde o Egito.” Condenaram seus líderes por trazerem problemas sobre Israel e novamente os acusaram de enganar o povo e levá-lo a se perder. T4 148.2

Moisés e Arão lançaram-se prostrados perante Deus, com o rosto em terra. Calebe e Josué, os dois que, dentre todos os doze espias, confiaram na palavra de Deus, rasgaram as vestes em angústia quando perceberam que esses relatórios desfavoráveis haviam desencorajado todo o acampamento. Empenharam-se em argumentar com eles; mas a congregação estava cheia de loucura e desapontamento, e se recusaram a ouvir esses dois homens. Finalmente Calebe abriu caminho entre eles, e sua voz clara, sonora, foi ouvida acima do clamor de toda a multidão. Ele se opôs à opinião covarde de seus companheiros de espionagem, que haviam enfraquecido a fé e a coragem de todo o Israel. Pediu a atenção do povo, e eles contiveram suas queixas por um momento para ouvi-lo. Ele falou da terra que havia visitado. Disse ele: “Subamos animosamente e possuamo-la em herança; porque, certamente, prevaleceremos contra ela.” Números 13:30. Mas, enquanto ele falava, os espias infiéis interromperam-no, clamando: “Não poderemos subir contra aquele povo, porque é mais forte do que nós.” Números 13:31. T4 149.1

Esses homens, havendo começado em um caminho errado, endureceram o coração contra Deus, contra Moisés e Arão, e contra Calebe e Josué. Cada passo que avançavam nesta direção errada fazia-os mais firmes em seu desígnio de desanimar toda tentativa de possuir a terra de Canaã. Distorceram a verdade a fim de levar avante o seu malévolo propósito. Descreveram o clima como sendo insalubre, e todo o povo como sendo de gigantesca estatura. T4 149.2

Disseram eles: “Também vimos ali gigantes, filhos de Anaque, descendentes dos gigantes; e éramos aos nossos olhos como gafanhotos e assim também éramos aos seus olhos.” Números 13:33. T4 150.1

Isto não foi apenas um mau relatório, mas também uma mentira. Era uma contradição; pois se a terra era insalubre e tinha prejudicado os seus habitantes, como tinham podido alcançar tal estatura como a que descreviam? Quando homens em posição de responsabilidade entregam o coração à incredulidade, não há limites ao progresso que farão no mal. Poucos reconhecem, quando começam nessa perigosa atitude, a extensão em que Satanás os conduzirá. T4 150.2

O mau relatório teve um terrível efeito sobre o povo. Eles acusavam cruelmente a Moisés e Arão. Alguns gemiam e choravam dizendo: “Ah! Se morrêramos na terra do Egito! Ou, ah! Se morrêramos neste deserto!” Números 14:2. Depois seus sentimentos se levantaram contra o Senhor; e choravam e lamentavam dizendo: “E por que nos traz o Senhor a esta terra, para cairmos à espada e para que nossas mulheres e nossas crianças sejam por presa? Não nos seria melhor voltarmos ao Egito? E diziam uns aos outros: Levantemos um capitão e voltemos ao Egito.” Números 14:3, 4. T4 150.3

Assim manifestaram seu desrespeito por Deus e pelos líderes que Ele havia designado para conduzi-los. Não perguntaram ao Senhor o que deviam fazer, mas disseram: “Levantemos um capitão.” Tomaram o assunto nas próprias mãos, julgando-se competentes para conduzir os negócios sem o auxílio divino. Não apenas acusaram Moisés de engano, mas também a Deus, ao prometer-lhes uma terra que não eram capazes de possuir. Na verdade, foram tão longe a ponto de designar alguém de seu grupo como capitão, para conduzi-los de volta à terra de seu sofrimento e escravidão, da qual Deus os havia livrado com Seu forte braço de onipotência. T4 150.4

Moisés e Arão ainda permaneceram prostrados perante Deus na presença de toda a assembléia, silenciosamente implorando a divina misericórdia para o rebelde Israel. Sua angústia era muito profunda para palavras. Novamente, Calebe e Josué adiantaram-se à frente, e a voz de Calebe novamente se ergueu em zelosa tristeza acima das queixas da congregação: “A terra pelo meio da qual passamos a espiar é terra muito boa. Se o Senhor Se agradar de nós, então, nos porá nesta terra e no-la dará, terra que mana leite e mel. Tão-somente não sejais rebeldes contra o Senhor e não temais o povo desta terra, porquanto são eles nosso pão; retirou-se deles o seu amparo, e o Senhor é conosco; não os temais.” Números 14:7-9. T4 151.1

Os cananeus tinha enchido a medida de sua iniqüidade, e o Senhor não mais os toleraria. Sendo removida deles a Sua defesa, cairiam como fácil presa dos hebreus. Não estavam preparados para a batalha, pois sentiam-se tão fortes que se enganavam com a idéia de que nenhum exército era tão extraordinário para prevalecer contra eles. T4 151.2

Calebe lembrou ao povo de que pelo concerto de Deus a terra estava assegurada a Israel; mas o coração deles estava cheio de loucura, e não queriam mais ouvir. Se tão-somente dois tivessem apresentado um mau relatório, e todos os dez os tivessem encorajado a possuir a terra em nome do Senhor, ainda teriam tomado em conta o conselho dos dois de preferência aos dos dez, por causa de sua ímpia incredulidade. Mas havia apenas dois defendendo o direito, enquanto dez estavam em aberta rebelião contra seus líderes e contra Deus. T4 151.3

A maior agitação então assola o povo; suas piores paixões são despertadas, recusando dar ouvidos à razão. Os dez espias infiéis se unem a eles contra Calebe e Josué, e ergue-se o clamor para apedrejá-los. A multidão insana apanha pedras com as quais matariam aqueles homens fiéis. Avançam depressa com gritos loucos, quando eis que as pedras lhes caem das mãos, um silêncio lhes sobrevém e ficam trêmulos de terror. Deus Se havia interposto para impedir seu ímpio desígnio. A glória de Sua presença, como chama de luz, ilumina o tabernáculo, e toda a congregação contempla o sinal do Senhor. Alguém mais poderoso do que eles havia Se revelado, e ninguém ousa continuar em sua resistência. Todos os murmuradores silenciam e os espias que trouxeram o mau relatório se curvam dominados pelo terror, com respiração suspensa. T4 151.4

Moisés ergue-se de sua posição de humilhação e entra no tabernáculo para comungar com Deus. Então o Senhor propõe destruir imediatamente esse povo rebelde. Deseja fazer de Moisés uma nação maior do que Israel; mas o manso líder de Seu povo não consente com essa proposta. “E disse Moisés ao Senhor: Assim, os egípcios o ouvirão; porquanto com a Tua força fizeste subir este povo do meio deles. E o dirão aos moradores desta terra, que ouviram que Tu, ó Senhor, estás no meio deste povo, que face a face, ó Senhor, lhes apareces, que Tua nuvem está sobre eles e que vais adiante deles numa coluna de nuvem de dia e numa coluna de fogo de noite. E, se matares este povo como a um só homem, as nações, pois, que ouviram a Tua fama, falarão, dizendo: Porquanto o Senhor não podia pôr este povo na terra que lhes tinha jurado; por isso, os matou no deserto.” Números 14:13-16. T4 152.1

Moisés novamente recusa que Israel seja destruído e ele próprio tornado uma nação mais poderosa do que eles. Este favorecido servo de Deus manifesta seu amor por Israel e demonstra seu zelo pela glória de seu Mestre e honra de Seu povo. Tu tens perdoado este povo desde o Egito até agora; Tu tens sido paciente e misericordioso até aqui para com essa nação ingrata. Embora seja indigna, Tua misericórdia é a mesma. Ele apela: Não os pouparás, portanto, ainda esta vez, acrescentando mais este pedido por divina paciência aos muitos que já concedeste? T4 152.2

Moisés prevaleceu com Deus para poupar o povo; mas por causa de sua arrogância e incredulidade, o Senhor não podia ir com eles para atuar de maneira miraculosa em seu benefício. Portanto, em Sua divina misericórdia ordenou-lhes que adotassem o roteiro mais seguro, e voltassem para o deserto na direção do Mar Vermelho. Decretou também que, como punição por sua rebelião, todos os adultos que deixaram o Egito, com exceção de Calebe e Josué, seriam para sempre excluídos de Canaã. Haviam falhado inteiramente em cumprir sua promessa de obediência a Deus, e isso O liberou da aliança que haviam tão repetidamente violado. Ele prometeu que seus filhos possuiriam a boa terra, mas declarou que seus corpos seriam sepultados no deserto. E os dez espias infiéis, cujo mau relatório havia induzido Israel a murmurar e se rebelar, foram destruídos pelo poder de Deus diante dos olhos do povo. T4 152.3

Quando Moisés tornou conhecida a Israel a vontade de Deus com respeito a eles, pareceram sinceramente arrependidos de sua conduta pecaminosa. O Senhor, porém, sabia que estavam sofrendo em resultado de sua má conduta, e não por estarem dominados pelo profundo senso de sua ingratidão e desobediência. O arrependimento deles, contudo, veio demasiado tarde; a justa ira de Deus foi despertada e sua sentença pronunciada, a qual não seria suspensa. Quando descobriram que o Senhor não voltaria atrás em Seu decreto, novamente manifestou-se a sua vontade própria, e declararam que não retornariam ao deserto. T4 153.1

Ao ordenar que se retirassem da terra de seus inimigos, Deus provou a aparente submissão deles e percebeu que ela não era real. Eles sabiam que tinham pecado profundamente ao permitir que seus sentimentos impetuosos os controlassem, e ao tentar matar os espias que haviam insistido com eles que obedecessem a Deus; mas estavam aterrorizados unicamente por descobrir que cometeram um erro terrível, cujas conseqüências lhes seriam desastrosas. O coração deles permaneceu inalterado, e precisavam apenas de uma desculpa para ocasionar uma rebeldia semelhante. Isto se apresentou quando Moisés, pela autoridade de Deus, ordenou-lhes que voltassem para o deserto. T4 153.2

Haviam-se rebelado contra as ordens de Deus quando Ele lhes ordenara que seguissem e tomassem a terra que lhes havia prometido, e agora, quando os instruiu a se afastarem dela, rebelaram-se igualmente insubordinados, e declararam que iriam à batalha contra seus inimigos. Cingiram-se com vestes e armaduras de guerreiros, e apresentaram-se perante Moisés, em sua própria opinião preparados para o conflito, mas lamentavelmente deficientes à vista de Deus e de Seu pesaroso servo. Recusaram ouvir as solenes advertências de seus líderes de que calamidade e morte seriam a conseqüência de sua arrogância. T4 153.3

Quando Deus lhes ordenou avançarem e tomarem Jericó, Ele prometeu que iria com eles. A arca contendo Sua lei devia ser um símbolo dEle. Moisés e Arão, os líderes designados de Deus, deviam conduzir a expedição sob Sua atenta direção. Com tal supervisão, nenhum mal lhes sobreviria. Mas agora, contrariamente à ordem de Deus e a solene proibição de seus líderes, sem a arca de Deus e sem Moisés, marchavam ao encontro dos exércitos inimigos. T4 154.1

Durante o tempo gasto pelos israelitas em sua ímpia insubordinação, os amalequitas e cananeus haviam-se preparado para a batalha. Os israelitas presunçosamente desafiaram o adversário que não ousara atacá-los; mas tão logo entraram no território inimigo, os amalequitas e cananeus os defrontaram com vigor, e os expulsaram decididamente, repelindo-os com grande perda. O campo da carnificina estava vermelho de sangue e os cadáveres espalhados pelo terreno. Foram inteiramente cercados e derrotados. Destruição e morte foram o resultado de sua experiência rebelde. Mas a fé de Calebe e Josué foi ricamente recompensada. De acordo com Sua palavra, Deus trouxe esses fiéis à terra que lhes havia prometido. Os covardes e rebeldes pereceram no deserto, mas os espias justos comeram das uvas de Escol. T4 154.2

A história do relatório dos doze espias tem aplicação para nós como povo. As cenas de covarde queixa e recuo do combate quando há riscos a serem defrontados são reproduzidos entre nós hoje. A mesma indisposição é manifestada em atender a relatórios fiéis e a verdadeiro conselho como nos dias de Calebe e Josué. Os servos de Deus que assumem a responsabilidade de Sua causa, praticando estrita abnegação, e sofrendo privação para ajudar Seu povo, são raramente mais apreciados agora do que o foram então. T4 154.3

O antigo Israel foi repetidamente provado e achado em falta. Poucos recebem as fiéis advertências que lhes são dadas por Deus. Trevas e incredulidade não diminuem ao nos aproximarmos do tempo do segundo advento de Cristo. A verdade se torna cada vez menos agradável à mente carnal; o coração deles é vagaroso para crer e tardio para arrepender-se. Os servos de Deus bem poderiam tornar-se desanimados, não fosse pelas contínuas evidências que seu Mestre lhes dá de Sua sabedoria e ajuda. Por muito tempo tem o Senhor suportado o Seu povo. Ele tem perdoado seus desvios e esperado que Lhe dêem lugar no coração; mas falsas idéias, ciúmes e desconfiança Lhe têm impedido a entrada. T4 155.1

Poucos que professam ser de Israel, e cuja mente tem sido iluminada pelas revelações da sabedoria divina, ousam avançar corajosamente, como fez Calebe, e permanecem firmemente ao lado de Deus e do que é correto. Como aqueles que o Senhor tem escolhido para conduzir Sua obra não se desviam da conduta da integridade para satisfazer os egoístas e não consagrados, tornam-se alvo do ódio e da falsidade maliciosa. Satanás está bem desperto e trabalha agressivamente nestes últimos dias, e Deus apela aos homens de vigor espiritual e perseverança a resistirem aos seus artifícios. T4 155.2

A conversão plena é necessária entre aqueles que professam crer na verdade, a fim de que sigam a Jesus e obedeçam à vontade de Deus — não uma submissão nascida de circunstâncias, como foi a dos aterrorizados israelitas quando o poder do Infinito lhes foi revelado, mas um profundo arrependimento e renúncia do pecado. Aqueles que são apenas meio convertidos, assemelham-se a uma árvore cujos galhos se estendem do lado da verdade, mas cujas raízes, firmemente fixadas na terra, avançam sobre o terreno estéril do mundo. Jesus procura em vão por frutos em seus galhos; Ele nada encontra senão folhas. T4 155.3

Milhares aceitariam a verdade, se pudessem fazê-lo sem negar o eu; mas essa classe nunca edificaria a causa de Deus. Nunca marcharia avante valentemente contra o inimigo — o mundo, o amor a si mesmo, e as concupiscências da carne — confiando em seu divino Líder para lhes dar a vitória. A igreja necessita de fiéis Calebes e Josués, que estejam prontos para aceitar a vida eterna sob a simples condição divina de obediência. Nossas igrejas estão sofrendo falta de obreiros. O mundo é o nosso campo. Missionários são necessários em cidades e vilas que certamente estão mais presas à idolatria do que os pagãos do Oriente que nunca viram a luz da verdade. O verdadeiro espírito missionário desertou das igrejas que fazem tão alta profissão de fé; os corações já não se acham abrasados com o amor pelas almas e o desejo de levá-las ao redil de Cristo. Faltam-nos obreiros fervorosos. Não haverá ninguém que responda ao clamor que vem de todas as partes: “Passa... e ajuda-nos”? Atos dos Apóstolos 16:9. T4 155.4

Podem aqueles que professam ser depositários da lei de Deus, e que aguardam a breve vinda de Jesus nas nuvens do céu, permanecer inocentados do sangue das almas, se fizerem ouvidos moucos às gritantes necessidades das pessoas que caminham na escuridão? Há livros para serem preparados e distribuídos, há lições a serem dadas, há deveres altruístas a serem cumpridos! Quem virá em socorro! Quem pela causa de Cristo negará o eu e estenderá a luz àqueles que se assentam nas trevas? T4 156.1