Fundamentos da Educação Cristã

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Cristo como mestre

Por Seu próprio e sábio desígnio, o Senhor encobre verdades espirituais em figuras e símbolos. Mediante o uso de figuras de linguagem era muitas vezes dada a Seus acusadores e inimigos a mais franca e eficaz repreensão, sem que pudessem achar em Suas palavras algo para condená-Lo. Em parábolas e comparações Ele encontrou o melhor método para comunicar verdades divinas. Em linguagem simples, usando figuras e ilustrações tiradas do mundo natural, Ele descerrava a verdade espiritual a Seus ouvintes e expunha preciosos princípios que se teriam apagado da memória deles, sem quase deixar vestígio, se Ele não houvesse relacionado Suas palavras com emocionantes cenas da vida, experiência ou Natureza. Despertava assim o interesse deles, suscitava perguntas e, quando havia captado completamente a sua atenção, neles inculcava decididamente o testemunho da verdade. Conseguia deste modo causar tal impressão sobre o coração que, mais tarde, ao olharem Seus ouvintes para aquilo com que Ele relacionara Seu ensino, podiam recordar as palavras do divino Mestre. FEC 236.1

O ensino de Jesus era de natureza completamente diferente do ensino ministrado pelos doutos escribas. Eles pretendiam ser expositores da lei, tanto escrita como tradicional. Mas o tom formal de suas instruções indicava que não discerniam nada nas doutrinas dos sagrados oráculos que tivesse poder vital. Não apresentavam nada que fosse novo; não proferiam palavras que satisfizessem os anseios do coração. Não proporcionavam alimento para os famintos cordeiros e ovelhas. Tinham o costume de alongar-se sobre as partes obscuras da lei, e o resultado de seu arrazoado era uma algaravia de absurdidades, que os doutos não conseguiam devassar, nem eram compreendidas pelo povo comum. FEC 236.2

Cristo veio para revelar ao mundo a verdade divina. Ensinava como quem tem autoridade. Falou como jamais alguém havia falado. Não havia hesitação em Sua conduta, nem a menor sombra de dúvida em Suas declarações. Ele falava como quem entende todas as partes do assunto. Poderia haver desvendado mistérios que patriarcas e profetas almejavam perscrutar, que a curiosidade humana desejara ansiosamente compreender. Porém, se os homens não conseguiam discernir as verdades mais simples e expostas de maneira bem clara, como poderiam compreender os mistérios que se achavam ocultos aos olhos mortais? Jesus não recusava repetir antigas verdades familiares, pois era o Autor dessas verdades. Ele era a glória do templo. Separou do erro verdades que haviam sido perdidas de vista, que tinham sido desvirtuadas e mal-empregadas e que foram desligadas de sua posição correta; apresentando-as como preciosas jóias em seu próprio fulgor, tornou a colocá-las em seu devido engaste, e ordenou que permanecessem firmes para todo o sempre. Que obra foi essa! Era de tal natureza que o homem finito não podia compreendê-la ou realizá-la. Somente a Mão divina podia pegar a verdade que, em sua ligação com o erro, estivera favorecendo a causa do inimigo de Deus e do homem, e colocá-la onde pudesse glorificar a Deus e ser a salvação da humanidade. A obra de Cristo consistiu em restituir ao mundo a verdade em seu viço e beleza originais. Ele representava o espiritual e celeste pelas coisas da Natureza e da experiência. Dava o tenro maná à alma faminta e apresentava um novo reino a ser estabelecido entre os homens. FEC 236.3

Os rabinos expunham os requisitos da lei como uma enfadonha rotina de exigências. Eles faziam exatamente o que Satanás está fazendo em nossos dias: apresentavam a lei ao povo como frio e rígido código de preceitos e tradições. As superstições encobriam a luz, a glória, a dignidade e os reclamos de grande alcance da lei de Deus. Professavam falar ao povo em lugar de Deus. Depois da transgressão de Adão, o Senhor não falou mais diretamente com o homem; a raça humana foi entregue nas mãos de Cristo, e toda comunicação ao mundo foi efetuada por Seu intermédio. Foi Cristo que proferiu a lei no Monte Sinai, e Ele conhecia o significado de todos os seus preceitos, a glória e majestade da lei do Céu. No Sermão da Montanha, Cristo define a lei e procura inculcar na mente de Seus ouvintes os reclamos de longo alcance dos preceitos de Jeová. Suas instruções foram uma nova revelação ao povo; e os intérpretes da lei, os escribas e os fariseus, bem como o povo em geral, ficaram maravilhados de Sua doutrina. As palavras de Cristo não eram novas, e, no entanto, tiveram o impacto de uma revelação; pois apresentavam a verdade em seu devido aspecto, e não do modo como os mestres a haviam colocado perante o povo. Ele não manifestava consideração pelas tradições e os mandamentos de homens, mas abria os olhos do seu entendimento para contemplarem as maravilhas da lei de Deus, que é o fundamento de Seu trono desde o princípio do mundo; e, enquanto durarem os céus e a Terra, através dos infindáveis séculos da eternidade, ela será a grande norma de justiça, santa e justa e boa. FEC 237.1

O sistema de economia judaica era o evangelho em figura, uma apresentação do cristianismo que deveria expandir-se à medida que a mente das pessoas fosse compreendendo a luz espiritual. Satanás sempre procura obscurecer as verdades que são claras, e Cristo sempre procura abrir a mente à compreensão de toda verdade essencial a respeito da salvação do homem caído. Até hoje ainda há aspectos da verdade que são discernidos indistintamente, conexões que não são compreendidas, e amplas profundezas da lei de Deus que não são percebidas. Há incomensurável amplitude, dignidade e glória na lei de Deus; e, no entanto, o mundo religioso pôs de lado esta lei, como os judeus, a fim de exaltar as tradições e os mandamentos de homens. Antes dos dias de Cristo, os homens perguntavam inutilmente: “Que é a verdade?” As trevas cobriam a Terra, e a escuridão os povos. Até mesmo a Judéia estava envolta em obscuridade, embora a voz de Deus lhes falasse em Seus oráculos. A verdade de Deus fora reduzida ao silêncio pelas superstições e tradições de seus pretensos intérpretes, e contendas, ciúmes e preconceitos dividiam os professos filhos de Deus. Então houve um Mestre enviado por Deus — Aquele mesmo que era o Caminho, a Verdade e a Vida. Jesus expôs a pura e preciosa verdade do Céu a fim de que brilhasse entre as trevas e escuridão moral da Terra. Deus dissera: “Haja luz espiritual”, e a luz da glória de Deus foi revelada na face de Jesus Cristo. FEC 238.1

Cristo foi manifestado como Salvador dos homens. As pessoas não deviam confiar de modo algum em suas próprias obras, em sua própria justiça ou em si mesmas, e, sim, no Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo. NEle foi revelado o Advogado junto ao Pai. Por Seu intermédio foi feito o convite: “Vinde, pois, e arrazoemos, diz o Senhor; ainda que os vossos pecados são como a escarlate, eles se tornarão brancos como a neve; ainda que são vermelhos como o carmesim, se tornarão como a lã.” Este convite tem repercutido através dos tempos até os nossos dias. Que o orgulho, a estima ou justiça próprias não impeçam a alguém de confessar seus pecados, para que possa fazer jus à promessa: “O que encobre as suas transgressões, jamais prosperará; mas o que as confessa e deixa, alcançará misericórdia.” Não oculteis nada a Deus e não negligencieis a confissão de vossas faltas aos irmãos quando eles têm alguma ligação com elas. “Confessai, pois, os vossos pecados uns aos outros, e orai uns pelos outros, para serdes curados.” Muitos pecados não são confessados, e ter-se-á de enfrentá-los no dia do ajuste final; é muito melhor reconhecer os pecados agora, confessá-los e abandoná-los, enquanto o Sacrifício expiatório intercede em nosso favor. Não tenhais aversão a aprender a vontade de Deus sobre este assunto. O bem-estar de vossa alma, a unidade de vossos irmãos podem depender da atitude que tomais nestas coisas. “Humilhai-vos, portanto, sob a poderosa mão de Deus, para que Ele, em tempo oportuno, vos exalte, lançando sobre Ele toda a vossa ansiedade, porque Ele tem cuidado de vós.” FEC 239.1

É um fato lamentável que o coração faltoso não esteja disposto a ser criticado ou a sujeitar-se à humilhação pela confissão do pecado. Alguns reconhecem suas faltas, mas imaginando que a confissão lhes diminua a dignidade, desculpam seu erro e eximem-se à disciplina que a confissão proporcionaria à alma. A lembrança de seu manifesto erro perdurará para amargurar seus deleites e perturbar suas atividades; pois desviando-se da senda da confissão, deixam de ser fiéis exemplos para o povo. Eles vêem os erros dos outros; mas como podem ter a coragem de dar o conselho: “Confessai os vossos pecados uns aos outros, e orai uns pelos outros, para serdes curados”, se deixaram de seguir esta instrução em sua própria vida? Quanto aprenderão os pastores ou o povo de uma verdade que põem de lado e olvidam, se possível, porque não é agradável; porque não lisonjeia seu orgulho, mas reprova e aflige? Os pastores e o povo, se de fato estão salvos, precisam estar salvos dia após dia, hora após hora. Devem ter fome e sede da justiça de Cristo, da iluminação do Espírito Santo. Os membros da igreja — os que se acham colocados em posições de confiança — precisam ser batizados com o Espírito de Deus, do contrário não estarão habilitados para as posições que aceitam. FEC 239.2

Um homem pode ter um conhecimento das Escrituras que não o torne sábio para a salvação, mesmo que consiga vencer seus oponentes num debate público. Se não há em sua alma profundo anseio de Deus; se ele não esquadrinha seu próprio coração como se fosse com uma lâmpada acesa, temendo que se oculte ali algum mal; se não se acha possuído do desejo de responder à oração de Cristo, para que Seus discípulos sejam um assim como Ele o é com o Pai, a fim de que o mundo creia que Jesus é o Cristo — lisonjeia-se inutilmente de que é cristão. Seu conhecimento, iniciado por ambição, é levado avante por orgulho; mas a alma acha-se destituída do divino amor, da brandura e mansidão de Cristo. Ele não é sábio à vista de Deus. Pode ter sabedoria para derrotar um oponente; mas não pode ser sábio para a salvação sem a operação do Espírito Santo. E “o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança”. Nem talento, nem eloqüência nem o estudo egoísta das Escrituras produzirá amor a Deus ou conformidade com a imagem de Cristo. Nada, a não ser o poder divino, pode regenerar o coração e o caráter humanos e imbuir a alma com o amor de Cristo, que sempre se manifestará no amor àqueles pelos quais Ele morreu. — The Review and Herald, 28 de Novembro de 1893. FEC 240.1