O Grande Conflito (condensado)

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O Grande Conflito (condensado)

Introdução — Erguendo o véu do futuro

Antes que o pecado entrasse no mundo, Adão vivia em plena comunhão com seu Criador. Entretanto, desde que o homem se separou de Deus pela transgressão, a raça humana ficou privada desse alto privilégio. Pelo plano da redenção, contudo, foi aberto um caminho mediante o qual os habitantes da Terra podem ainda ter ligação com o Céu. Deus tem Se comunicado com os homens mediante o Seu Espírito; e a luz divina tem sido comunicada ao mundo pelas revelações feitas a Seus servos escolhidos. “Homens santos falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo”. 2 Pedro 1:21. GCC 8.1

Durante os primeiros 2.500 anos da história da humanidade, não houve revelação escrita. Aqueles que haviam sido ensinados a respeito de Deus, comunicavam seu conhecimento a outros, e este era repassado de pai a filho, através de sucessivas gerações. A preparação da palavra escrita começou nos tempos de Moisés. As revelações inspiradas foram então incorporadas no Livro Inspirado. Tal trabalho prosseguiu durante o longo espaço de 1.600 anos — desde Moisés, o historiador da criação e da lei, até João, a quem coube registrar as mais sublimes verdades do evangelho. GCC 8.2

A Bíblia aponta a Deus como seu autor; no entanto, foi escrita por mãos humanas e, no variado estilo de seus diferentes livros, apresenta as características dos diversos escritores. As verdades reveladas são oferecidas por inspiração de Deus (2 Timóteo 3:16); acham-se contudo, expressas em palavras de homens. O Ser Infinito, por meio de Seu Santo Espírito, derramou luz no entendimento e coração de Seus servos. Deu sonhos e visões, símbolos e figuras; e aqueles a quem a verdade foi assim revelada concretizaram os pensamentos em linguagem humana. GCC 8.3

Escritos em diferentes épocas, por homens que diferiam amplamente em posição e ocupação, tanto quanto em capacitação mental e espiritual, os livros da Bíblia apresentam amplo contraste quanto ao estilo, assim como diversidade no tocante à natureza dos assuntos desvendados. Diferentes formas de expressão foram empregadas por distintos escritores; muitas vezes a mesma verdade é apresentada de modo mais marcante por um escritor do que por outro. À medida que vários escritores apresentam o mesmo tema sob variados aspectos e relações, poderá parecer, ao leitor superficial, descuidado ou preconceituoso, que entre estes autores existem discrepâncias ou contradições; ao mesmo tempo, porém, o estudioso pensante e reverente, com visão interior mais clara, discernirá aí a harmonia subjacente. GCC 8.4

Sendo apresentada por diferentes indivíduos, a verdade aparece em seus variados aspectos. Um escritor é mais fortemente impressionado com determinada fase do assunto; ele capta aqueles pontos que melhor se harmonizam com sua experiência ou com sua capacidade de percepção e apreciação. Outro, por sua vez, entende melhor outra fase. Cada um deles, sob a orientação do Espírito Santo, apresenta aquilo que mais vigorosamente lhe impressionou a mente — diferentes aspectos da verdade a cada um, porém uma perfeita harmonia no conjunto. As verdades assim reveladas se unem a fim de formar um todo perfeito, adaptado para satisfazer as necessidades dos homens em todas as circunstâncias e experiências da vida. GCC 9.1

Deus tem Se agradado em comunicar Sua verdade ao mundo através de agentes humanos, e Ele mesmo, por Seu Santo Espírito, qualificou homens e habilitou-os a empreender esta obra. Ele orientou na seleção daquilo que deveria ser falado e escrito. O tesouro foi confiado a vasos terrestres, mas ainda assim prossegue sendo de origem celestial. O testemunho é apresentado através da imperfeita expressão da linguagem humana, e ainda assim é o testemunho de Deus; o obediente e confiante filho de Deus contempla-o na glória do divino poder, cheio de graça e de verdade. GCC 9.2

Em Sua Palavra, Deus conferiu aos homens o conhecimento necessário à salvação. As Santas Escrituras devem ser aceitas como autorizada e infalível revelação de Sua vontade. Elas são a norma do caráter, o revelador das doutrinas, a pedra de toque da experiência religiosa. “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra”. 2 Timóteo 3:16, 17. GCC 9.3

Entretanto, o fato de que Deus revelou Sua vontade aos homens por meio de Sua Palavra não tornou desnecessária a contínua presença e direção do Espírito Santo. Ao contrário, o Espírito foi prometido por nosso Salvador para aclarar a Palavra a Seus servos, para iluminar e aplicar os seus ensinos. E visto ter sido o Espírito de Deus que inspirou a Escritura Sagrada, é impossível que o ensino do Espírito seja contrário ao da Palavra. GCC 9.4

O Espírito não foi dado — nem jamais o poderia ser — a fim de sobrepor-se à Escritura; pois esta declara explicitamente ser ela mesma a norma pela qual todo ensino e experiência devem ser aferidos. Diz o apóstolo João: “Amados, não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai os espíritos se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo mundo”. 1 João 4:1. E Isaías declara: “À lei e ao testemunho! Se eles não falarem desta maneira, jamais verão a alva”. Isaías 8:20. GCC 9.5

Grande opróbrio tem sido lançado sobre a obra do Espírito Santo pelos erros de uma classe que, pretendendo possuir iluminação, afirma não mais necessitar da orientação da Palavra de Deus. Estas pessoas são governadas pelas impressões que consideram como sendo a voz de Deus. Mas o espírito que as controla não é o Espírito de Deus. Ao seguir essas impressões, ao mesmo tempo em que negligenciam as Escrituras, serão tão-somente conduzidos a confusão, engano e ruína. Isso serve apenas para o cumprimento dos desígnios do enganador. Uma vez que o ministério do Espírito Santo é de vital importância para a igreja de Cristo, um dos artifícios de Satanás — através dos erros de extremistas e fanáticos — é produzir contenda em relação à obra do Espírito e levar o povo de Deus a negligenciar esta fonte de fortalecimento, a qual foi provida pelo próprio Senhor. GCC 10.1

Em harmonia com a Palavra de Deus, o Espírito deveria continuar Sua obra durante todo o período da dispensação evangélica. Durante os séculos em que as Escrituras do Antigo Testamento, bem como as do Novo, estavam sendo dadas, o Espírito Santo não cessou de comunicar luz a mentes individuais, independentemente das revelações a serem incorporadas no Cânon Sagrado. A Bíblia mesma relata como mediante o Espírito Santo os homens receberam advertências, reprovações, conselhos e instruções, em assuntos de nenhum modo relativos à outorga das Escrituras. São mencionados profetas de várias épocas, de cujos discursos nada há registrado. Semelhantemente, após a conclusão do cânon das Escrituras, o Espírito Santo deveria ainda continuar a Sua obra, esclarecendo, advertindo e confortando os filhos de Deus. GCC 10.2

Jesus prometeu aos discípulos: “O Espírito Santo, a quem o Pai enviará em Meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito.” “Ele vos guiará a toda a verdade [...] e vos anunciará as coisas que hão de vir”. João 14:26; 16:13. As Escrituras ensinam claramente que estas promessas, longe de se limitarem aos dias apostólicos, se estendem à igreja de Cristo em todos os séculos. O Salvador afirma a Seus seguidores: “Eis que estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos”. Mateus 28:20. E Paulo declara que os dons e manifestações do Espírito foram postos na igreja para o “aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo, até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo”. Efésios 4:12, 13. GCC 10.3

Em favor dos crentes de Éfeso o apóstolo orou: “Para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos conceda espírito de sabedoria e de revelação no pleno conhecimento dEle, iluminados os olhos do vosso coração, para saberdes qual é a esperança do Seu chamamento [...] e qual a suprema grandeza do Seu poder para com os que cremos”. Efésios 1:17-19. O ministério do divino Espírito na iluminação do entendimento e abertura da mente às profundezas da Santa Palavra de Deus foi a bênção que Paulo suplicou sobre a igreja de Éfeso. GCC 10.4

Depois da maravilhosa manifestação do Espírito Santo no dia de Pentecostes, Pedro exortou o povo a arrepender-se e batizar-se em nome de Cristo, para a remissão de seus pecados; e disse ele: “Recebereis o dom do Espírito Santo. Pois para vós outros é a promessa, para vossos filhos, e para todos os que ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor nosso Deus chamar”. Atos dos Apóstolos 2:38, 39. GCC 11.1

Em imediata relação com as cenas do grande dia de Deus, o Senhor prometeu, pelo profeta Joel, uma manifestação especial de Seu Espírito. Joel 2:28. Esta profecia recebeu cumprimento parcial no derramamento do Espírito, no dia de Pentecostes. Mas atingirá seu pleno cumprimento na manifestação da graça divina que acompanhará a obra final do Evangelho. GCC 11.2

A grande controvérsia entre o bem e o mal crescerá em intensidade no final do tempo. Em todas as eras, a ira de Satanás tem se manifestado contra a igreja de Cristo; e Deus tem derramado Sua graça e Espírito sobre Seu povo, a fim de habilitá-lo a permanecer de pé diante do poder do maligno. Quando os apóstolos de Cristo deveriam apresentar o evangelho ao mundo e registrá-lo para todas as eras futuras, foram especialmente capacitados pela iluminação do Espírito. À medida, entretanto, que a igreja se aproxima de sua final libertação, Satanás deverá operar com grande poder. Ele se apresenta “cheio de grande cólera, sabendo que pouco tempo lhe resta”. Apocalipse 12:12. Ele operará “com todo poder, e sinais e prodígios da mentira”. 2 Tessalonicenses 2:9. Durante 6.000 anos esta poderosa mente, que uma vez foi a de mais elevada posição entre os anjos de Deus, tem sido aplicada inteiramente à obra de engano e ruína. E todas as profundezas da satânica habilidade e sutileza adquiridas, toda a crueldade desenvolvida durante esta luta de tantos séculos, serão lançadas contra o povo de Deus no conflito final. Nesse tempo de perigo os seguidores de Cristo deverão apresentar ao mundo a advertência quanto ao segundo advento do Senhor; e um povo deverá preparar-se a fim de permanecer de pé diante dEle, em Sua vinda, e isto “sem mácula, e irrepreensíveis”. 2 Pedro 3:14. Nesse tempo a dotação especial da divina graça e poder não serão menos necessários à igreja do que nos dias apostólicos. GCC 11.3

Mediante a iluminação do Espírito Santo, as cenas do prolongado conflito entre o bem e o mal foram patenteadas à autora destas páginas. De quando em quando me foi permitido contemplar a operação, nas diversas épocas, do grande conflito entre Cristo, o Príncipe da vida, o Autor de nossa salvação, e Satanás, o príncipe do mal, o autor do pecado, o primeiro transgressor da santa lei de Deus. A inimizade de Satanás para com Cristo manifestou-se contra os Seus seguidores. O mesmo ódio aos princípios da lei de Deus, o mesmo expediente de engano, em virtude do qual se faz o erro parecer verdade, pelo qual a lei divina é substituída pelas leis humanas, e os homens são levados a adorar a criatura em lugar do Criador, podem ser divisados em toda a história do passado. Os esforços de Satanás para representar de maneira falsa o caráter de Deus, para fazer com que os homens nutram um conceito errôneo do Criador, e assim O considerem com temor e ódio em vez de amor; seu empenho para pôr de parte a lei divina, levando o povo a julgar-se livre de suas reivindicações; e sua perseguição aos que ousam resistir a seus enganos, têm prosseguido com persistência em todos os séculos. Podem ser observados na história dos patriarcas, profetas e apóstolos, mártires e reformadores. GCC 11.4

No grande conflito final, como em todas as eras anteriores, Satanás empregará os mesmos expedientes, manifestará o mesmo espírito, e trabalhará para o mesmo fim. Aquilo que foi, será, com a exceção de que a luta vindoura se assinalará por uma intensidade terrível, tal como o mundo jamais testemunhou. Os enganos de Satanás serão mais sutis, seus assaltos mais decididos. Se fosse possível, transviaria os escolhidos. Marcos 13:22. GCC 12.1

À medida que o Espírito de Deus me ia revelando à mente as grandes verdades de Sua Palavra, e as cenas do passado e do futuro, era-me ordenado tornar conhecido a outros o que assim fora revelado — delineando a história do conflito nas eras passadas, e especialmente apresentando-a de tal maneira a lançar luz sobre a luta do futuro, em rápida aproximação. Na prossecução deste propósito, esforcei-me por selecionar e agrupar fatos da história da igreja de tal maneira a esboçar o desdobramento das grandes verdades que em diferentes períodos foram dadas ao mundo, as quais excitaram a ira de Satanás e a inimizade de uma igreja que ama o mundo, verdades que têm sido mantidas pelo testemunho dos que “não amaram suas vidas até a morte”. GCC 12.2

Nesses relatos podemos ver uma prefiguração do conflito perante nós. Olhando-os à luz da Palavra de Deus, e pela iluminação de Seu Espírito, podemos ver a descoberto os ardis do maligno e os perigos que deverão evitar os que serão achados “irrepreensíveis” diante do Senhor em Sua vinda. GCC 12.3

Os grandes acontecimentos que assinalaram o progresso da Reforma nas épocas passadas, constituem assunto da História, bastante conhecidos e universalmente reconhecidos pelo mundo protestante; são fatos que ninguém pode negar. Apresentei de maneira breve esta história, de acordo com a perspectiva deste livro e com a brevidade que deveria necessariamente ser observada, havendo os fatos sido condensados no menor espaço compatível com sua devida compreensão. Em alguns casos em que um historiador agrupou os fatos de tal modo a proporcionar, em resumo, uma visão abrangente do assunto, ou resumiu convenientemente os pormenores, suas palavras foram citadas textualmente; em alguns outros casos, porém, não se nomeou o autor, visto como as transcrições não são feitas com o propósito de citar aquele escritor como autoridade, mas porque sua declaração provê uma apresentação do assunto, pronta e positiva. Narrando a experiência e perspectivas dos que levam avante a obra da Reforma em nosso próprio tempo, fez-se uso semelhante de suas obras publicadas. GCC 12.4

O objetivo deste livro não consiste tanto em apresentar novas verdades concernentes às lutas dos tempos anteriores, como em ressaltar fatos e princípios que têm sua relação com os acontecimentos vindouros. Contudo, encarados como uma parte do conflito entre as forças da luz e das trevas, vê-se que todos esses relatos do passado têm nova significação; e por meio deles projeta-se uma luz no futuro, iluminando a senda daqueles que, semelhantes aos reformadores dos séculos passados, serão chamados, mesmo com perigo de todos os bens terrestres, a testificar “da Palavra de Deus, e do testemunho de Jesus Cristo”. GCC 13.1

Desdobrar as cenas do grande conflito entre a verdade e o erro; revelar os ardis de Satanás e os meios pelos quais lhe podemos opor eficaz resistência; apresentar uma solução satisfatória do grande problema do mal, derramando luz sobre a origem e a disposição final do pecado, de tal maneira a manifestar-se plenamente a justiça e benevolência de Deus em todo o Seu trato com Suas criaturas; e mostrar a natureza santa, imutável de Sua lei — eis o objetivo deste livro. Que mediante sua influência muitos possam libertar-se do poder das trevas, e tornar-se participantes “da herança dos santos na luz”, para louvor dAquele que nos amou e Se deu a Si mesmo por nós, é a fervorosa oração da autora. GCC 13.2

E.G.W.