A Ciência do Bom Viver (condensado)

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Capítulo 11 — Os desempregados e os destituídos de lar

Há homens e mulheres de grande coração, os quais meditam ansiosamente na situação dos pobres, e nos meios pelos quais possam ser aliviados. Um problema para o qual muitos estão buscando uma solução é como os desempregados e os que não têm lar podem ser ajudados em obter as bênçãos comuns da providência de Deus e viver a vida que Ele intentava que o homem vivesse. Mas não há muitos, mesmo entre educadores e estadistas, que compreendam as causas que se acham no fundo do atual estado da sociedade. Os que seguram as rédeas do governo são incapazes de resolver o problema da corrupção moral, da pobreza, da miséria e do crime crescente. Estão lutando em vão para colocar as operações comerciais em base mais segura. CBVc 68.1

Se os homens dessem mais atenção aos ensinos da Palavra de Deus, encontrariam uma solução a esses problemas que os desconcertam. Muito se poderia aprender do Antigo Testamento quanto à questão do trabalho e do alívio aos pobres. CBVc 68.2

Nos bairros pobres — Há nas grandes cidades multidões que recebem menos cuidado e consideração do que os que são concedidos a mudos animais. Pensai nas famílias amontoadas como rebanhos em miseráveis cortiços, sombrios porões muitos deles, exalando umidade e imundícia. Nesses sórdidos lugares as crianças nascem, crescem e morrem. Nada vêem das belezas naturais que Deus criou para deleitar os sentidos e elevar a alma. Rotas e quase morrendo de fome, vivem elas entre o vício e a depravação, moldadas no caráter pela miséria e o pecado que as rodeia. As crianças só ouvem o nome de Deus de maneira profana. A linguagem suja, as imprecações e os insultos enchem-lhes os ouvidos. As exalações da bebida e do fumo, nocivos maus cheiros e degradação moral pervertem-lhes os sentidos. Assim se preparam multidões para se tornarem criminosos, inimigos da sociedade que os abandonou à miséria e à degradação. CBVc 68.3

Nem todos os pobres dos becos das cidades pertencem a essa classe. Homens e mulheres tementes a Deus têm sido levados aos extremos da pobreza por doença ou infortúnio, muitas vezes causados pelos desonestos planos dos que vivem à custa dos semelhantes. Muitos que são retos e bem-intencionados ficam pobres por falta de preparo profissional. Por ignorância, se acham inaptos para lutar com as dificuldades da vida. Levados a esmo para as cidades, são muitas vezes incapazes de achar emprego. Rodeados de cenas e sons de vício, são sujeitos a terríveis tentações. Associados e muitas vezes classificados com os viciados e os degradados, é somente por uma luta sobre-humana, um poder acima do finito, que podem ser preservados de cair no mesmo abismo. Muitos se apegam firmemente a sua integridade, preferindo sofrer a pecar. Esta classe, em especial, requer auxílio, simpatia e ânimo. CBVc 68.4

Se os pobres agora aglomerados nas cidades encontrassem habitações no campo, poderiam não somente ganhar a subsistência, mas encontrar a saúde e a felicidade que hoje desconhecem. Trabalho árduo, comida simples, estrita economia, muitas vezes durezas e privações, eis o que seria sua vida. Mas que bênçãos lhes seria deixar a cidade com suas atrações para o mal, sua agitação e crime, sua miséria e torpeza, para o sossego, a paz e pureza do campo! CBVc 69.1

Para muitos dos que residem nas cidades, sem ter um cantinho de relva verde em que pisar, que olham ano após ano para pátios imundos, becos estreitos, paredes e pavimentos de tijolo e céus nublados de poeira e fumaça — pudessem eles ser levados a alguma região agrícola, circundada de verdes campinas, matas, colinas e riachos, os límpidos céus e o ar fresco e puro dos campos, isso lhes pareceria quase um paraíso. CBVc 69.2

Separados em grande parte do contato do homem e da dependência deles, afastados das máximas e costumes corruptores do mundo e de suas tentações, aproximar-se-iam mais do coração da natureza. A presença de Deus lhes seria mais real. Muitos aprenderiam a lição da confiança nEle. Mediante a natureza, ouviriam Sua voz comunicando-lhes paz e amor ao coração; e espírito e alma e corpo corresponderiam ao restaurador e vivificante poder. CBVc 69.3

Se hão de tornar-se um dia industriosos e independentes, muitos precisam de ter auxílio, encorajamento e instrução. Há multidões de famílias pobres pelas quais não se poderia fazer nenhum melhor trabalho missionário do que ajudá-las a se estabelecerem no campo, e aprenderem a tirar dele um meio de vida. CBVc 69.4

A necessidade de tal auxílio e instrução não se limita às cidades. Mesmo no campo, com todas as suas possibilidades quanto a uma vida melhor, multidões de pobres se acham em grande carência. Localidades inteiras estão destituídas de educação em assuntos industriais e higiênicos. Há famílias morando em choças, com mobília e vestuário deficientes, sem utensílios, sem livros, destituídos tanto de confortos como de meios de cultura. Almas embrutecidas, corpos fracos e mal formados, mostram os resultados da má hereditariedade e dos hábitos errôneos. Essas pessoas devem ser educadas principiando com os próprios fundamentos. Têm vivido uma vida frouxa, ociosa, corrupta, e precisam ser exercitadas nos hábitos corretos. CBVc 69.5

Como podem elas ser despertadas para a necessidade de melhoria? Como podem ser encaminhadas para um mais elevado ideal de vida? Como podem ser ajudadas a se erguer? Que se pode fazer onde domina a pobreza, tendo-se com ela de lutar a cada passo? O trabalho é certamente difícil. A necessária reforma jamais se efetuará, a menos que homens e mulheres sejam assistidos por um poder fora deles mesmos. É o desígnio de Deus que o rico e o pobre estejam intimamente ligados pelos laços da simpatia e da assistência mútua. Os que dispõem de meios, talentos e aptidões devem empregá-los para benefício de seus semelhantes. CBVc 70.1

Os agricultores cristãos podem fazer um verdadeiro trabalho missionário em ajudar os pobres a encontrar um lar no campo, e ensinar-lhes a lavrar o solo e torná-lo produtivo. Ensinai-os a servir-se dos instrumentos de agricultura, a cultivar as várias plantações, a formar pomares e cuidar deles. CBVc 70.2

Muitos dos que lavram o solo deixam de colher a devida retribuição por causa de sua negligência. Seus pomares não são devidamente cuidados, as sementes não são semeadas no tempo conveniente, e a obra de revolver a terra é feita de modo superficial. Seu mau êxito, lançam eles à conta da esterilidade do solo. Dá-se muitas vezes um falso testemunho ao condenar uma terra que, devidamente cultivada, havia de produzir fartos lucros. A estreiteza dos planos, o pequeno esforço desenvolvido, o pouco estudo feito quanto aos melhores processos, clamam em alta voz por uma reforma. CBVc 70.3

Ensinem-se os métodos apropriados a todos quantos estejam dispostos a aprender. Se alguns não gostam que lhes faleis de idéias avançadas, dai-lhes silenciosamente as lições. Cultivai do melhor modo vossa própria terra. Dirigi quando vos for possível uma palavra aos vizinhos, e deixai que a colheita fale eloqüentemente em favor dos bons métodos. Demonstrai o que se pode fazer com a terra, quando devidamente cultivada. CBVc 70.4

Deve-se dar atenção ao estabelecimento de várias indústrias, para que famílias pobres possam assim encontrar colocação. Carpinteiros, ferreiros, enfim todos quantos têm conhecimento de algum ramo de trabalho útil, devem sentir a responsabilidade de ensinar e ajudar o ignorante e o desempregado. CBVc 70.5

No serviço aos pobres há, para as mulheres, um vasto campo de utilidade, da mesma maneira que para os homens. A eficiente cozinheira, a dona-de-casa, a costureira, a enfermeira — de todas elas é necessário auxílio. Ensinem-se os membros das famílias pobres a cozinhar, a costurar e remendar sua própria roupa, a tratar dos doentes, a cuidar devidamente da casa. Ensine-se aos meninos e às meninas alguma ocupação útil. CBVc 70.6

Famílias missionárias — Necessitam-se famílias missionárias que se estabeleçam em lugares incultos. Que agricultores, financistas, construtores e os que são hábeis em várias artes e ofícios vão para os campos negligenciados para melhorar a terra, estabelecer indústrias, preparar lares modestos para si mesmos e ajudar a seus vizinhos. CBVc 70.7

Os lugares rústicos da natureza, os sítios selvagens, Deus tem tornado atrativos com a presença de coisas belas entre as não aprazíveis. Tal é a obra que somos chamados a fazer. Os próprios desertos da Terra, cujo aspecto parece destituído de atração, podem-se tornar como o jardim de Deus. “E naquele dia, os surdos ouvirão as palavras do livro,E, dentre a escuridão e dentre as trevas, as verão os olhos dos cegos. E os mansos terão regozijo no Senhor;E os necessitados entre os homens se alegrarão no Santo de Israel”. Isaías 29:18, 19. CBVc 71.1

Dando instruções em atividades práticas, podemos muitas vezes ajudar os pobres da maneira mais eficaz. Em regra, os que não foram exercitados no trabalho não têm hábitos de laboriosidade, perseverança, economia e abnegação. Não sabem se dirigir. Freqüentemente, por falta de cuidado e são discernimento, há desperdícios que lhes manteriam a família com decência e conforto, fossem cuidadosa e economicamente empregados. “Abundância de mantimento há na lavoura do pobre, mas alguns há que se consomem por falta de juízo”. Provérbios 13:23. CBVc 71.2

Podemos dar aos pobres, e prejudicá-los, ensinando-os a depender de outros. Tais dádivas animam o egoísmo e a inutilidade. Conduzem muitas vezes à ociosidade, ao desperdício e à intemperança. Homem algum que seja capaz de ganhar sua subsistência tem o direito de depender dos outros. O provérbio “O mundo me deve a manutenção” encerra a essência da mentira, da fraude e do roubo. O mundo não deve a subsistência a nenhum homem capaz de trabalhar e ganhar a vida por si mesmo. CBVc 71.3

A verdadeira caridade ajuda os homens a se ajudarem a si mesmos. Se alguém vem à nossa porta e pede alimento, não o devemos mandar embora com fome; sua pobreza pode ser o resultado de um infortúnio. Mas a verdadeira beneficência significa mais que simples dádivas. Importa num real interesse no bem-estar dos outros. Cumpre-nos buscar compreender as necessidades dos pobres e dos aflitos, e conceder-lhes o auxílio que mais benefício lhes proporcione. Dedicar pensamentos e tempo e esforço pessoal, custa muitíssimo mais que dar meramente dinheiro. Mas é a verdadeira caridade. CBVc 71.4

Os que são ensinados a ganhar o que recebem aprenderão mais prontamente a empregá-lo bem. E, aprendendo a depender de si próprios, estão adquirindo aquilo que não somente os tornará independentes, mas os habilitará a ajudar a outros. Ensinai a importância dos deveres da vida aos que estão desperdiçando suas oportunidades. Mostrai-lhes que a religião da Bíblia nunca torna os homens ociosos. Cristo sempre incentivou ao trabalho. “Por que estais ociosos todo o dia?” (Mateus 20:6), disse aos indolentes. “Convém que Eu faça as obras [...] enquanto é dia; a noite vem, quando ninguém pode trabalhar”. João 9:4. CBVc 71.5

É o privilégio de todos dar ao mundo, em sua vida de família, em seus costumes e práticas e ordem, um testemunho do que o evangelho pode fazer pelos que lhe obedecem. Cristo veio ao mundo para dar-nos um exemplo daquilo que nos podemos tornar. Espera que Seus seguidores sejam modelos de correção em todas as relações da vida. Deseja que o toque divino se manifeste nas coisas exteriores. CBVc 71.6

Nosso lar e os arredores devem ser uma lição prática, ensinando processos de aperfeiçoamento, de maneira que a atividade, o asseio, o bom gosto e o refinamento tomem o lugar da ociosidade, da falta de limpeza, da desordem e do que é grosseiro. Por nossa vida e exemplo, podemos ajudar outros a distinguir o que é repulsivo em seu caráter e ambiente, e com cortesia cristã podemos animar o aperfeiçoamento. Ao manifestarmos interesse neles, encontraremos oportunidade de lhes ensinar a empregar melhor suas energias. CBVc 72.1

Esperança e ânimo — Nada podemos fazer sem ânimo e perseverança. Dirigi palavras de esperança e ânimo aos pobres e abatidos. Se necessário, dai-lhes provas palpáveis de vosso interesse, ajudando-os quando se encontram em apertos. Os que têm tido muitas vantagens devem lembrar-se de que eles ainda erram em muitas coisas, e que lhes é penoso quando seus erros são indicados, sendo-lhes apresentado um belo modelo do que devem ser. Lembrai-vos de que a bondade conseguirá mais que a censura. Ao procurardes ensinar os outros, agi de maneira que eles vejam que lhes desejais uma mais elevada norma, e estais dispostos a dar-lhes auxílio. Se em algumas coisas eles falham, não vos apresseis a condená-los. CBVc 72.2

Simplicidade, abnegação e economia, lições tão essenciais aos pobres, afiguram-se-lhes muitas vezes difíceis e indesejáveis. O exemplo e o espírito do mundo estão continuamente incitando e fomentando o orgulho, o amor da ostentação, condescendência consigo mesmo, prodigalidade e ociosidade. Esses males levam milhares à penúria, e impedem outros milhares de se erguerem da degradação e miséria. Os cristãos devem animar os pobres a resistir a essas influências. CBVc 72.3

As melhores coisas da vida — Homens e mulheres mal têm começado a compreender o verdadeiro objetivo da vida. São atraídos pelo brilho e a ostentação. São ambiciosos de preeminência mundana. A esta se sacrificam os verdadeiros objetivos da vida. As melhores coisas da existência — a simplicidade, a honestidade, a veracidade, a pureza e a integridade — não se podem vender nem comprar. Elas são tão gratuitas para o ignorante como para o educado, para o humilde trabalhador como para o honrado estadista. Para todos proveu Deus prazeres que podem ser fruídos pelo rico e pelo pobre semelhantemente — o prazer que se encontra no cultivo da pureza de pensamento e no desinteresse da ação, o prazer que provém de dirigir palavras de simpatia e praticar atos de bondade. Dos que tais serviços realizam, irradia a luz de Cristo para aclarar vidas obscurecidas por muitas sombras. CBVc 72.4

Ao mesmo tempo que ajudais o pobre nas coisas temporais, mantende sempre em vista suas necessidades espirituais. Que vossa própria vida testifique do poder mantenedor de Cristo. Que vosso caráter revele a elevada norma que todos podem atingir. Ensinai o evangelho em simples lições concretas. Que tudo com que tendes de lidar seja uma lição na formação do caráter. CBVc 73.1

Na humilde rotina do trabalho, os mais fracos, os mais obscuros, podem ser coobreiros de Deus, e ter o conforto de Sua presença e Sua mantenedora graça. Não lhes cabe afadigar-se com ansiosas preocupações e desnecessários cuidados. Trabalhem eles dia a dia, cumprindo fielmente a tarefa que a providência de Deus lhes designa, e Ele os terá sob Seu cuidado. Diz o Senhor: “Não estejais inquietos por coisa alguma; antes, as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus, pela oração e súplicas, com ação de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos sentimentos em Cristo Jesus”. Filipenses 4:6, 7. CBVc 73.2

O cuidado do Senhor envolve todas as Suas criaturas. Ele as ama a todas, e não faz diferença, a não ser que tem a mais terna piedade para com os que são chamados a suportar os mais pesados fardos da vida. Os filhos de Deus devem enfrentar provas e dificuldades. Mas devem aceitar sua situação com um espírito animoso, lembrando-se de que por tudo que o mundo lhes negligencia dar, o próprio Deus os indenizará com os melhores favores. CBVc 73.3

É quando chegamos a circunstâncias difíceis que Ele revela Seu poder e sabedoria em resposta à humilde oração. NEle confiai como um Deus que ouve e responde à oração. Ele Se vos revelará como Alguém capaz de socorrer em todas as emergências. Aquele que criou o homem, que lhe deu suas maravilhosas faculdades físicas, mentais e espirituais, não recusará aquilo que é necessário para manter a vida por Ele dada. Aquele que nos deu Sua Palavra — as folhas da árvore da vida — não reterá de nós o conhecimento da maneira de prover alimento a Seus necessitados filhos. CBVc 73.4

Como pode a sabedoria ser obtida por aquele que maneja o arado e tange os bois? Buscando-a como à prata, e procurando-a como a tesouros ocultos. “O seu Deus o ensina e o instrui acerca do que há de fazer”. Isaías 28:26. “Até isto procede do Senhor dos Exércitos, porque é maravilhoso em conselho e grande em obra”. Isaías 28:29. CBVc 73.5

Aquele que ensinou a Adão e Eva no Éden a guardar o jardim deseja instruir os homens hoje. Há sabedoria para o que conduz o arado e lança a semente. Deus abrirá caminhos de progresso diante dos que nEle confiam e Lhe obedecem. Marchem eles avante animosamente, confiando nEle quanto à satisfação de suas necessidades, segundo as riquezas de Sua bondade. CBVc 73.6

Aquele que alimentou a multidão com cinco pães e dois peixinhos é capaz de nos dar hoje o fruto de nossos labores. Aquele que disse aos pescadores da Galiléia: “Lançai as vossas redes para pescar” (Lucas 5:4), e que, ao obedecerem, encheu-lhes as redes até se romperem, deseja que Seu povo veja nisto uma prova do que fará por eles hoje em dia. O Deus que no deserto deu aos filhos de Israel o maná do Céu vive e reina ainda. Ele guiará Seu povo, e lhe dará habilidade e entendimento na obra que são chamados a realizar. Dará sabedoria aos que se esforçam para cumprir conscienciosa e inteligentemente o seu dever. Aquele que possui o mundo é rico em recursos, e há de abençoar a todo aquele que está buscando abençoar a outros. CBVc 73.7

Necessitamos olhar com fé ao alto. Não devemos ficar desanimados por causa de aparentes fracassos, nem desfalecidos com a tardança. Cumpre-nos trabalhar com ânimo, esperança e gratidão, crendo que a terra contém em seu seio ricos tesouros para o fiel obreiro recolher, depósitos mais preciosos que a prata ou o ouro. As montanhas e colinas estão mudando; a terra está ficando velha como um vestido; mas a bênção de Deus, que estende para Seu povo uma mesa no deserto, jamais cessará. CBVc 74.1