No Deserto da Tentação

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Capítulo 22 — Temperança cristã

Deus não dá permissão ao homem para violar as leis de seu ser. Mas o homem, cedendo às tentações de Satanás quanto à condescendência com a intemperança, põe suas mais altas faculdades em sujeição aos apetites e paixões animalescas, e quando isto ganha a ascendência, o homem, que foi criado um pouco menor do que os anjos, com faculdades suscetíveis à mais alta cultura, entrega-se ao controle de Satanás. Este ganha facilmente acesso àquele que está preso ao apetite. Através da intemperança, alguns sacrificam a metade e outros, dois terços do seu poder físico, mental e moral, e tornam-se joguetes nas mãos do inimigo. NDT 68.2

Aqueles que querem ter mente clara para discernir os engodos de Satanás devem ter o apetite físico sob o domínio da razão e da consciência. A ação moral e vigorosa dos altos poderes da mente é essencial ao aperfeiçoamento do caráter cristão; e a força ou a fraqueza da mente tem muito a ver com a nossa atitude e utilidade neste mundo, e com a salvação final. É deplorável a ignorância que tem prevalecido concernente à lei de Deus em nossa natureza física. A intemperança de qualquer espécie é uma violação das leis do nosso ser. A imbecilidade está prevalecendo em uma proporção assustadora. O pecado se torna atraente, revestido por uma luz, e Satanás se alegra muito quando pode reter o mundo cristão em seus hábitos diários, sob a tirania do costume, como os pagãos, permitindo ser governado pelo apetite. NDT 69.1

Se homens e mulheres inteligentes tiverem suas faculdades morais entorpecidas pela intemperança de qualquer espécie, estarão, em muitos de seus hábitos, muito pouco acima dos pagãos. Satanás está constantemente atraindo pessoas da luz salvífica para o costume e a moda, sem consideração para com a saúde física, mental e moral. O grande inimigo sabe que se predominarem a paixão e o apetite, a saúde do corpo e a força do intelecto serão sacrificadas no altar da satisfação própria, e o homem acelerará sua ruína. Se um intelecto erudito segurar suas rédeas, controlando as propensões animalescas e conservando-as em sujeição às faculdades morais, Satanás sabe muito bem que é pequena sua possibilidade de vencer a tentação. NDT 69.2

Em nossos dias fala-se da Idade Média e se orgulham do progresso. Com este progresso, porém, impiedade e crime não diminuem. Deploramos a ausência da simplicidade natural e o aumento da tentação artificial. Saúde, força, beleza e longevidade, que eram comuns na chamada “Idade Média” são agora raros. Quase tudo que é desejável sacrifica-se para satisfazer às demandas da vida que segue a moda. NDT 70.1

Grande parte do mundo cristão não tem o direito de se chamar cristãos. Seus hábitos, suas extravagâncias e o cuidado do corpo em geral constituem uma violação das leis da saúde e se opõem ao ensino da Bíblia. Estão se preparando no decurso da vida para o sofrimento físico e a fraqueza mental e moral. NDT 70.2

Através de seus enganos, Satanás, em muitos casos, tem tornado a vida doméstica cheia de complicações, com o intuito de satisfazer às demandas da moda. Fazendo isto, seu propósito é conservar a mente tão ocupada com as coisas da vida que não possa dar um pouco de atenção ao que é de maior interesse. A intemperança no comer e no vestir tem absorvido tanto a mente do mundo cristão que não tem tempo para se tornar inteligente no tocante às leis da vida, obedecendo-lhes. Professar o nome de Cristo pouco significa se a vida não corresponde à vontade de Deus, revelada em Sua Palavra. NDT 70.3

No deserto da tentação Cristo venceu o apetite. O Seu exemplo de abnegação e de domínio próprio quando sofreu a atormentadora ânsia da fome, é uma censura ao mundo cristão, por sua dissipação e glutonaria. Gasta-se atualmente nove vezes mais dinheiro na satisfação do apetite, na condescendência com a insensata e danosa luxúria, do que é dado para o avançamento do evangelho de Cristo. NDT 71.1

Estivesse Pedro hoje na Terra, exortaria os professos seguidores de Cristo a abster-se da luxúria carnal que guerreia contra a alma. Paulo convocaria as igrejas em geral para purificar-se “de toda impureza, tanto da carne, como do espírito, aperfeiçoando a nossa santidade no temor de Deus”.27 E Cristo expulsaria do templo aqueles que estão contaminados pelo uso do fumo, poluindo o santuário de Deus com sua respiração tabaquista. Diria a estes adoradores o que disse aos judeus: “A Minha casa será chamada casa de oração para todas as nações; vós, porém, a tendes transformado em covil de salteadores.”28 Diria a tais pessoas que suas ofertas profanas, expelidas de pedaços de fumo, contaminam o templo e aborrecem a Deus. Seu culto não é aceitável porque o corpo, que deveria ser o templo do Espírito Santo, está contaminado. Você também rouba o tesouro de Deus em milhares de dólares, através da condescendência com o apetite desnaturado. Se víssemos a norma da virtude e a exaltada piedade, como cristãos, teríamos um trabalho a desenvolver, por nós individualmente, para controlar o apetite, a condescendência que neutraliza a força da verdade e enfraquece o poder moral para resistir e vencer a tentação. Como seguidores de Cristo devemos agir por princípio no comer e no beber. Se obedecêssemos à injunção do apóstolo: “Quer comais, quer bebais, ou façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus”,29 milhares de dólares que agora são sacrificados no altar maléfico da luxúria, afluiriam para o tesouro do Senhor, multiplicando as publicações em diferentes línguas, para serem espalhadas como folhas do outono. Missões seriam estabelecidas em outras nações e então os seguidores de Cristo, na verdade, seriam a luz do mundo. NDT 71.2

O adversário das almas está trabalhando nestes últimos dias com grande poder, como nunca antes, para conseguir arruinar o homem através da condescendência com o apetite e as paixões. Muitos dos que estão presos sob o poder escravizante do apetite, são professos seguidores de Cristo. Professam adorar a Deus, ao passo que o apetite é o seu deus. Seus desejos desnaturados por estas condescendências, não são controlados pela razão ou juízo. Os que são escravos do fumo, verão a família sofrer as inconveniências da vida e a necessidade de alimento. Contudo, não têm força de vontade para renunciar ao fumo. Os clamores do apetite prevalecem sobre a tendência natural e esta paixão animalesca os domina. A causa do Cristianismo, e mesmo da humanidade, de modo algum seria sustentada se dependesse daqueles que habitualmente usam fumo e bebidas alcoólicas. Se tivessem recursos para usar numa só direção, a tesouraria de Deus não seria reabastecida, mas eles teriam seu fumo e bebidas alcoólicas. A fim de idolatrar o fumo não dirão “não” ao apetite pela causa de Deus. NDT 72.1

É impossível que essas pessoas reconheçam as reivindicações e a santidade da lei de Deus, porque seu cérebro e nervos estão amortecidos pelo uso destes narcóticos. Não podem avaliar a preciosidade da expiação e apreciar a vida imortal. A condescendência com a luxúria carnal guerreia contra a alma. O apóstolo dirige-se aos cristãos numa linguagem bem impressiva: “Rogo-vos, pois, irmãos pelas misericórdias de Deus que apresenteis os vossos corpos por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus.”30 Se o corpo é saturado pela bebida alcoólica e contaminado pelo fumo, não é santo e aceitável a Deus. Satanás sabe que não pode ser, e justamente por isto leva suas tentações no tocante ao apetite, escravizando-nos nesta propensão e levando-nos à ruína. NDT 73.1

Os sacrifícios dos judeus eram todos examinados com bastante cuidado, para ver se não tinham nenhum defeito ou alguma doença ou qualquer impureza, o que era motivo suficiente para serem rejeitados pelo sacerdote. As ofertas deviam ser perfeitas e valiosas. O apóstolo tinha em vista os requisitos de Deus quanto as ofertas dos judeus, quando ele, de maneira muito enérgica, apelava aos irmãos para apresentarem o corpo em sacrifício vivo. Não uma oferta enfermiça ou estragada, mas um sacrifício vivo, santo e aceitável a Deus. NDT 73.2

Quantos chegam à casa de Deus com fraquezas, e quantos vêm contaminados pela condescendência com o próprio apetite! Aqueles que se têm degradado por hábitos errôneos, quando se reúnem para cultuar a Deus, oferecem as emanações do seu corpo doentio, tornando-se fastidiosos aos que os cercam. Como isto deve ser ofensivo diante de um Deus puro e santo! NDT 74.1

Uma grande proporção de todas as enfermidades que afligem a família humana são resultado de seus próprios hábitos errôneos, por causa da ignorância voluntária ou da desconsideração para com a luz que Deus tem dado em relação às leis do seu ser. Não nos é possível glorificar a Deus enquanto vivemos em violação das leis da vida. O coração não pode, possivelmente, manter consagração a Deus enquanto se condescende com o apetite. Um corpo enfermiço e um intelecto em desordem por causa da condescendência contínua com uma danosa concupiscência, torna impossível a santificação do corpo e do espírito. O apóstolo compreendia a importância das condições saudáveis do corpo para o êxito perfeito do caráter cristão. Ele disse: “Mas esmurro o meu corpo, e o reduzo à escravidão, para que, tendo pregado a outros, não venha eu mesmo a ser desqualificado.”31 Menciona a temperança entre os frutos do Espírito. “E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com suas paixões e concupiscências.”32 NDT 74.2

Homens e mulheres cedem ao apetite, às expensas da saúde e do poder intelectual, de tal maneira que não podem apreciar o plano da salvação. Que apreciação podem ter da tentação de Cristo no deserto e da vitória que Ele ganhou sobre o apetite? É-lhes impossível ter uma visão sublime de Deus, e reconhecer os reclamos de Sua lei. Os professos seguidores de Cristo se esquecem do grande sacrifício feito por Ele em seu favor. A Majestade do Céu, a fim de pôr a salvação ao seu alcance, foi atingida, esmagada e aflita. Ele Se tornou um varão de tristeza e inteirado na aflição. No deserto da tentação Ele resistiu a Satanás, apesar de o tentador estar disfarçado com as vestimentas do Céu. Cristo, ao ser submetido a um grande sofrimento físico, recusou ceder num simples ponto, não obstante o mais jactancioso induzimento já apresentado para suborná-Lo e influenciá-Lo a renunciar à Sua integridade. Toda esta honra, toda esta riqueza e glória, disse o enganador, Te darei se somente reconheceres minhas exigências.33 NDT 75.1

Cristo ficou firme. Que seria, agora, da salvação da raça humana se Cristo fosse fraco em poder moral, como o homem? Não é de admirar que o Céu se enchesse de alegria quando o principal anjo caído deixou o deserto da tentação como um inimigo derrotado! Cristo tem o poder do Pai para dar Sua graça divina e força ao homem, tornando-nos possível a vitória por meio do Seu nome. Há poucos professos seguidores de Cristo que escolhem empenhar-se com Ele na tarefa de resistir às tentações de Satanás como Ele resistiu e venceu. NDT 75.2

Cristãos professos que gostam de divertimentos, prazeres e banquetes, não podem apreciar o conflito de Cristo no deserto. O exemplo do Senhor em vencer a Satanás, fica perdido para eles. Esta vitória infinita, que Cristo alcançou para eles no plano da salvação, é sem sentido. Não têm interesse especial na maravilhosa humilhação de nosso Salvador, e na angústia e sofrimentos que suportou pelo homem pecador enquanto Satanás O pressionava com suas diferentes tentações. A cena da provação de Cristo no deserto era o fundamento do plano da salvação, dando ao homem caído as chaves, por meio das quais, em nome de Cristo, pode vencer. NDT 76.1

Muitos cristãos professos olham para esta parte da vida de Cristo como se fosse uma guerra comum entre dois reis, não tendo nada de especial sobre a própria vida e caráter. Assim a maneira da luta e a maravilhosa vitória ganha, têm muito pouco significado para eles. As faculdades da percepção estão embotadas pelas artimanhas de Satanás, de maneira que não podem discernir que aquele que afligiu a Cristo no deserto e determinou privá-Lo de Sua integridade como o Filho do Infinito, será seu adversário até ao fim dos tempos. Apesar de ter falhado em vencer a Cristo, seu poder sobre o homem não está enfraquecido. Todos estão pessoalmente expostos às tentações que Cristo venceu, mas a força é provida para todos no poderoso nome do grande Conquistador. Todos devem, por si mesmos, vencer individualmente. Muitos caem nas mesmíssimas tentações com as quais Satanás assaltou a Cristo. NDT 76.2

Apesar de ter Cristo ganho uma vitória incalculável em favor do homem, vencendo as tentações de Satanás no deserto, esta vitória não lhe será de nenhum benefício, a menos que ele também ganhe a vitória por sua própria conta. NDT 77.1

O homem tem agora uma vantagem sobre Adão, nesta guerra contra Satanás, porque tem a experiência de Adão na desobediência e sua conseqüente queda para alertá-lo a afastar-se de seu exemplo. O homem também tem o exemplo de Cristo ao vencer o apetite e as diversas tentações de Satanás, derrotando o poderoso inimigo em todos os pontos e saindo vitorioso em cada provação. Se o homem tropeçar e cair sob as tentações de Satanás, não terá escusas porque ele tem a desobediência de Adão para alertá-lo e a vida do Redentor do mundo como um exemplo de obediência e resignação, bem como a promessa de Cristo de que “ao vencedor, dar-lhe-ei sentar-se comigo no Meu trono, assim como também Eu venci, e Me sentei com Meu Pai no Seu trono”.34 NDT 77.2